O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


terça-feira, 8 de dezembro de 2009

a vida é imperfectível

Não precisa de céu

Quem caminha no ermo da contemplação

Não precisa de imensidade

Quem vislumbra o que não há em tudo o que se vê

A alba fundura quase repleta de sede fresquíssima

A brotar do fundo escuríssima noite de ser homem e tudo o mais

Na orla do desejo de partir

Os pés alados as mãos afeitas à brisa corcéis de fogo preso

À desventura de haver ainda o que se dê conta da agudeza dos dias

Não precisa de si

O que se solta na perdição na alvura do sem depois

Não precisa de amparo

O refúgio supremo é o abandono

A insistência na largura das manhãs quando o sol não é mais que o sol

Tudo o que é feito de propósito está embrulhado em perfeição

A forma é dilacerante porque é definitiva

A dor de ser é ilusão e vontade duma verdade que deve ser deixada em paz

É luciferina a concretude da matéria

É melhor comer as maçãs com a casca

A prisão eidética que acorrenta coisa nenhuma ao sabor de maçã

E ao gosto de comê-la pode bem ser mastigada

Deglutida digerida

Defecada

Assim com tudo o que se diz substante

Nem com todo o armamentário categorial se deve aprisionar o que não é para ser

Soltos por fora forçados por dentro a ser uma impostura

Louco é só o que não acredita na loucura

Depois de apagada a luz é que os fantasmas de noite se tornam irreais

Transitório é só o que permanece na memória sob o signo do acabamento

15 comentários:

João de Castro Nunes disse...

Que mastigada! Que diria o "zarolho" deste poemaço... JCN

Paulo Feitais disse...

O zarolho estaria ainda a ver se comprava uma maquineta de fazer sonetos a preceito...
:)

João de Castro Nunes disse...

"estaria ainda a ver"... com que "olho"?!... JCN

Paulo Feitais disse...

Com o que lhe permitisse aceder à estética da coisa.
:)

Anónimo disse...

"Não precisa de céu
Quem caminha no ermo da contemplação..."
Não precisa de chão quem confia na lonjura e no abismo incendiado das marés; no fogo alquímico que a tudo devora e de onde tudo jorra sem princípio e sem fim!
Como "uma maquineta de sonetos" sempre a girar (risos para JCN) sem princípio nem fim!

Como uma Serpente alada a arder! Um relâmpago no astro de onde se avista o Homem e o Poema é Luz cega.
Onde a visão se alimenta da sede nascida. "Não precisa de si" quem se lançou no vasto mar onde as asas são labaredas, chama de seu mesmo arder. Amor voraz e olhar de manso, mas veloz unicórnio...
Mesmo com um só olho, o "zarolho" via mais e mais longe desse rio do que nós que nele estamos mergulhados.... quiçá afogados desse memo mergulhar.

Essa escrita encarnada!... Essa cor da imagem me leva em chama à terra de onde nascem os sonetos e o Amor que mora dentro deles!

Um beijo aos dois e... um abraço à Serpente, que acorda do seu torpor!

João de Castro Nunes disse...

Ante a gentil intervenção da apaziguadora "Fada Boa", deponho as armas da poética contenda. Caso contrário, eu lhe diria sem rebuços como aceder à estética do coiso! JCN

Anónimo disse...

Paulo...Feitos Tais, "sem depois", sorvo-os em continuidade do que propôe, cujo estilo sincrético, sintético e poético me alicia e ressoa-me muito bem.

João de Castro Nunes disse...

E porque não... piadético?!... Aliás, sem (m)alicia. JCN

João de Castro Nunes disse...

Nada há de mais piadético
que os poemas do Feitais:
é de a gente pedir mais
e cada vez... mais sintéticos!

JCN

João de Castro Nunes disse...

Com minhas quadras respondo
musicadas a preceito:
não prescindo do meu jeito
que é alérgico ao estrondo!

Cá por mim não gosto mada
de comida mastigada!

JCN

mada disse...

que grande ma...

João de Castro Nunes disse...

Pela grossura da letra, já te apanhei, carago! És a sombra... que me assombra, mas não me deixa assombrado, pois não passas de um... tarado! JCN

mada disse...

Ó senhor, feche o olho e vá dormir! que ratazana... :)

João de Castro Nunes disse...

Pareces mesmo uma mada(lena)... a carpir-se! Tem medo das ratazanas, a coitada! Medo que lhe vão ao olho. Seguramente! JCN

João de Castro Nunes disse...
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