O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


domingo, 25 de janeiro de 2009

Brinde

“(…)
Por isso vos quero também agradecer, deuses celestes, e finalmente
No peito mais aliviado respira de novo a oração do vate.
E tal como quando com ela me encontrava nos cumes soalheiros,
Há um Deus que, interpelando-me do interior do templo, me devolve à vida.
Também quero viver! O verde surge! E como que dedilhado numa lira sagrada
Chega o apelo dos montes argênteos de Apolo!
Vem! Tudo foi como num sonho! As asas ensanguentadas já estão
Saradas e todas as esperanças renascem.
Ainda há muita grandeza por achar e quem assim
Amou é forçoso que entre na órbita dos deuses.
Acompanhai-nos, horas sagradas! E vós, solenes
Jovens! Permanecei, santos presssentimentos, e vós,
Súplicas ardentes! E vós, entusiasmos e todos vós,
Génios bons, a quem é grato estar entre os amantes;
Permanecei junto de nós até pisarmos o mesmo solo
Onde todos os deuses do Alto se preparam para regressar,
Onde estão as águias, as constelações, os mensageiros do Pai
Onde as musas se encontram e donde provêm os heróis e os amantes,
Que aí, ou também aqui, nos encontremos sobre uma ilha orvalhada,
Onde todos os nossos estarão, florescendo juntos em jardins,
Onde os cânticos serão verdadeiros e as Primaveras por mais tempo belas,
E de novo comece um ano para as nossas almas.”

Hölderlin – Pranto de Ménon por Diotima

13 comentários:

Unknown disse...

Bem bonito. :)
Já hoje me tinha vindo a palavra herói e logo a relacionei com eros...

"os heróis e os amantes"
Ou também, os heróis: os amantes.

Um beijo.

Anónimo disse...

Bonito. Será belo? Belo. Será sublime?

Unknown disse...

(O verdadeiro guerreiro? Aquele cuja espada (arma) é o amor.

E como é dia de S. Paulo:

«(...) nem a mulher é separável do homem, nem o homem da mulher, diante do Senhor. Pois, se a mulher foi tirada do homem, o homem nasce da mulher, e tudo provém de Deus.»
S. Paulo (1 Cor 11:11-13)

«(...) Aspirai, porém, aos melhores dons.
Aliás, vou mostrar-vos um caminho que ultrapassa todos os outros.

13 Cântico do amor
Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos,
se não tiver amor, sou como um bronze que soa
ou um címbalo que retine.
Ainda que eu tenha o dom da profecia
e conheça todos os mistérios e toda a ciência,
ainda que eu tenha tão grande fé que transporte montanhas,
se não tiver amor, nada sou.
Ainda que eu distribua todos os meus bens
e entregue o meu corpo para ser queimado,
se não tiver amor, de nada me aproveita.

O amor é paciente,
o amor é prestável,
não é invejoso,
não é arrogante nem orgulhoso,
nada faz de inconveniente,
não procura o seu próprio interesse,
não se irrita nem guarda ressentimento.
Não se alegra com a injustiça,
mas rejubila com a verdade.
Tudo desculpa, tudo crê,
tudo espera, tudo suporta.

O amor jamais passará.
As profecias terão o seu fim,
o dom das línguas terminará
e a ciência vai ser inútil.
Pois o nosso conhecimento é imperfeito
e também imperfeita é a nossa profecia.
Mas, quando vier o que é perfeito,
o que é imperfeito desaparecerá.
Quando eu era criança,
falava como criança,
pensava como criança,
raciocinava como criança.
Mas, quando me tornei homem,
deixei o que era próprio de criança.

Agora, vemos como num espelho,
de maneira confusa;
depois, veremos face a face.
Agora, conheço de modo imperfeito;
depois, conhecerei como sou conhecido.
Agora permanecem estas três coisas:
a fé, a esperança e o amor;
mas a maior de todas é o amor.»
São Paulo (1 Cor 13:1-13)

Anónimo disse...

Amo Paulo e esse texto.Deveras sublime.Beijo.

Luiz Pires dos Reys disse...

“Maior que a própria boca”

Holderlin!
Ah, irmão maior que a própria boca!
Palavras de pétala que não murcham jamais,
chamas que nos deixaste, de teu alor mais fresco,
de cantares, de tão incansável,
ao luar, à alba sobrevivo,
Diotima, a de rosto inaudito,
a que primaveras sorri, na distância
de nosso pátrio arquipélago,
ávido sempre de sentir,
em seus raríssimos perfumes, o beijo
eterno e mais ardente, esse,
que, divinos, sempre os visitantes
vêm - puros ao que é mais puro - depor
no peito de seus mais alumbrados cantores.

No ver e no abismo do ver,
além da cumeada dos limites
e do incenso da alma e de todo o incerto agir,
de que em nós haja passos em seu ténue rasto, -
és a orla congraçante de que ali, ai,
no descentrar do tronco somos
folhas quando caiam –
ao aproximar perigante, logrado jamais,
do que pressentimos já
nesse sussurro que nos segreda
à raiz da fronte, em transbordante alegria
no vasto que escuta, à boca da fonte saudosa,
o que em nós habita como o silêncio mais gritante:
a luz que há-de cegar-nos
infindamente...

Donis de Frol Guilhade


(grato pelo trazer do divino pranto, Tamborim...)

Anónimo disse...

Os Deuses grecos são tantos.Quase tantos como as pessoas grecas. Pai, conseguirei percebê-los a todos?

Luiz Pires dos Reys disse...

Tenta, filho, tenta!
Só no tentame poderás sabê-lo.
E, sabe, mais numerosos são os deuses do que os homens.
Só assim eles logram sobreviver à infinda voracidade teofágica dos humanos.

E, não, não careces de entendê-los: que os ames, é quanto te basta.
Dar-te-ão eles então o entendimento que te é devido: não entendê-los é o melhor que os entendemos...

Anónimo disse...

lapdrey,discípulo de Almada,cairá sobre ti a 'fúria da minha vingança'.
ass:Dantas

Anónimo disse...

Enquanto virmos face a face haverá amor... E quando se desvanecerem todas as faces? Ou seja, agora?

Luiz Pires dos Reys disse...

Grato, meu caro Júlio,... perdão, meu Dante,... perdão, meu peDante,... perdão, meu Dantas!
Um abraço de Brutus a Baalantas.

Nota semibreve:
Não sou discípulo de ninguém, sou aprendiz de tudo!

Apareço e desapareço por aqui, tal como apareço e desapareço por ali e por além...


Caro Gárgula,

Creio estar talver a confundir face com rosto..
A memória é sobrevivente bastante adisso tudo: no akasha e e além dele...

Anónimo disse...

o homem,que na vida não tenha sentido em si,ao
menos uma vez, a beleza pura e as forças
do seu ser brincarem umas com as outras como as
cores do arco-iris, que nunca passou pela
experiência de que é somente nas horas de
entusiasmo que tudo concorda interiormente,esse
homem jamais acolherá a dúvida filosófica.
Pois o seu espírito não é feito para nenhuma
desconstruçãoe, muito menos, para a construção.
Acreditaí em mim. Aquele que dúvida
só encontrará contradição e falta em tudo o que
pensa porque conhece a harmonia da beleza
absoluta, que nunca se deixa pensar.
E só
desdenha o pão seco que a razão humana lhe
oferece para opinar, porque desfruta
secretamente, da mesa dos deuses.


Hölderlin, Hiperion

Luiz Pires dos Reys disse...

A Holderlin, não comento: admiro, e amo, nesse espanto de pura beleza de que anbos falamos, caro Anónimo Baal, ou Baal ...

Ou então canto-o, como acima cantei: ou melhor - ecos dele cantam em mim, mísero vaso.

(Grato pelo Hipérion! Abraço!)

Anónimo disse...

lapdrey,

só baal, mas um baal concordante com muitas anónimas opiniões.
abraço