O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


segunda-feira, 6 de abril de 2009

Rasgo de Inefável


Queria ter chegado nos momentos para te escutar
Era tarde, talvez...
Algo voou de mim ao encontro
veloz instante que o corpo não pode alcançar
liberta-se e vai contigo
Fica um espaço estranho de ausência

12 comentários:

Paulo Borges disse...

É nesse estranho espaço de ausência que tudo acontece... nós e o mundo, nós-mundo.

Paulo Borges disse...

Corrijo Hölderlin. Não é poética, mas estranhamente, que o homem habita a terra. A estranheza, não só em relação a si e a estar-se no mundo, mas a haver realidade, é a condição de toda a grande poesia, filosofia e arte. A condição de tudo, até da grande política.

Estranhar ser homem, estranhar ser, estranhar.

Estro disse...

Se assim a tudo e a nós estranhássemos, o mundo acabava...

Maurícia disse...

Obrigado, Paulo. Que voo mais alto se levanta, És tu claraMente

Anónimo disse...

O mundo acabava ou começava?

Isabel Santiago disse...

Paulo,

mas poeticamente não é em Holderlin, habitar de forma estranha o mundo? O poético não é o mais estranho dos modos?


Um rasgo de inefável sorriso para a Maurícia, irmã que me recebeu na Páscoa do pensamento.

fas disse...

O mundo está sempre a começar e a acabar. A estranheza passa por aí.Mas este poema é mesmo da Maurícia, tem uma profundidade que só ela conhece assim e que não sei definir. Continua a escrever muito bem, melhor, continua a escrever poesia.

Paulo Borges disse...

Isabel, creio que nem toda a poesia suporta, respeita e transparece a profunda estranheza. Muitas vezes, tal como de forma mais evidente a filosofia e a ciência, é um esconjuro, um exorcismo, dessa radical estranheza em que somos. Os poetas falam demasiado, precipitando-se a dar sentido às coisas que o não têm nem são. Também é sua aquela violentação do espanto que Maria Zambrano atribui à filosofia.

Ao dizer isto, todavia, não proponho o mero silêncio. Busco outra coisa.

Anónimo disse...

Creio que Maria Zambrano tendo feito o seu próprio caminho encontrou um "andar errante, só perdido nos infernos da luz",entre uma "penumbra tocada de alegria".
É, de qualquer modo, a razão poética, o pensar contemplativo que se estranha e entranha e não se deixa definir. Isso é poesia.

Neste poema belo e intenso, de uma melancólica alegria,uma tristeza clara, encontramos ecos deste modo poético: o que estranha a ausência e se atrasa, por assim dizer, na palavra, sugerindo-a bleamente.

Gostei muito do poema.

Anónimo disse...

"plenamente", é isso, não o que lá escrevi. Desculpem.

Isabel Santiago disse...

Paulo,

também não disse toda a poesia. Disse em Holderlin. Mas depois do que li da resposta também me lembrei dos pooemas que escreveu sem outro fito ( de que não sei se estaria consciente, penso que não)que não o de dizer de modo já quase ininteligível e pensei..."será isto que o Paulo chama, como Zambrano, de violentação do espanto?" ou é isto a estranheza de ser aqui, passar por aqui?



E, poderão os poetas a via entre o sentido e o silêncio? Penso que sim. E esses poetas e escritores existem e sentimos a sua diferença porque ao lê-los somos arrastados para a estranheza que (e parece paradoxal, mas é mesmo assim) nos é mais familiar, sem que tal sentimento se desfaça em pó de luz sobre o dito.


Um sorriso

baal disse...

saudades futuro, vaí dar banho ao cão