terça-feira, 7 de abril de 2009
Pop!
"'Existe um consenso de realidade, sobre o qual quase toda a raça humana concorda. Pensam que o mundo já cá está, faz muito tempo, que é antigo. Neste mundo, tu nasces como indivíduo. Cresces, aprendes, experiencias a vida e morres. Existe algum desacordo acerca do que acontece após a morte, excepto que, para todos os outros, a vida continua até que eles próprios morram. Concordas?'
'Concordo', digo mais para lhe fazer a vontade do que por estar na posse da lógica do assunto.
'Toda a gente pensa que sabe isto - ou alguma variação local do tema. Mas, de facto, quando tu "nasceste" não sabias isto. Tu aprendeste isto. E toda a gente aprendeu isto, de modo que se tornou uma ideia universalmente partilhada. Mas toda a gente acreditar numa coisa não faz dela uma verdade'.
O Sol desaparece sob a linha do horizonte.
A voz engrossa, o cheiro desaparece. A voz torna-se subvocálica.
'Sem tempo, Eu Sou o não-nascido. Tal como um sonho começa em certo ponto durante o sono, também "em certo momento", aquilo que Eu Sou surge como consciência, aqui, e este mundo começa a existir. Eu abro os meus olhos, experimento a vida neste corpo-mente aparente. Depois de um período de experiência, Eu fecho os meus olhos - o mundo cessa, e não-nascido, para sempre Eu..."
Fecho os olhos. Pop."
- Miguel Gullander, Perdido de Volta, Lisboa, Dom Quixote, 2008, pp. 136-137.
Pop é o som das cabeças dos cadáveres a estoirar, ao fim de seis horas, no campo de cremação indiano onde este diálogo tem lugar.
Eu nunca escreveria "Eu", mas este texto é um bom remédio para toda a ingénua ignorância que nos rege. Com todas as consequências, desde a mediocridade de todas as religiões e tradições à maior mediocridade ainda dos espiritualismos new-age; desde a opressão sócio-político-económica até à opressão, mais grave, da ilusão psicológica de acharmos que somos alguém, com uma origem e um fim.
Pop!
'Concordo', digo mais para lhe fazer a vontade do que por estar na posse da lógica do assunto.
'Toda a gente pensa que sabe isto - ou alguma variação local do tema. Mas, de facto, quando tu "nasceste" não sabias isto. Tu aprendeste isto. E toda a gente aprendeu isto, de modo que se tornou uma ideia universalmente partilhada. Mas toda a gente acreditar numa coisa não faz dela uma verdade'.
O Sol desaparece sob a linha do horizonte.
A voz engrossa, o cheiro desaparece. A voz torna-se subvocálica.
'Sem tempo, Eu Sou o não-nascido. Tal como um sonho começa em certo ponto durante o sono, também "em certo momento", aquilo que Eu Sou surge como consciência, aqui, e este mundo começa a existir. Eu abro os meus olhos, experimento a vida neste corpo-mente aparente. Depois de um período de experiência, Eu fecho os meus olhos - o mundo cessa, e não-nascido, para sempre Eu..."
Fecho os olhos. Pop."
- Miguel Gullander, Perdido de Volta, Lisboa, Dom Quixote, 2008, pp. 136-137.
Pop é o som das cabeças dos cadáveres a estoirar, ao fim de seis horas, no campo de cremação indiano onde este diálogo tem lugar.
Eu nunca escreveria "Eu", mas este texto é um bom remédio para toda a ingénua ignorância que nos rege. Com todas as consequências, desde a mediocridade de todas as religiões e tradições à maior mediocridade ainda dos espiritualismos new-age; desde a opressão sócio-político-económica até à opressão, mais grave, da ilusão psicológica de acharmos que somos alguém, com uma origem e um fim.
Pop!
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30 comentários:
Pop é o som das cabeças dos cadáveres a estoirar, ao fim de seis horas, no campo de cremação indiano onde este diálogo tem lugar.
(ía-me engasgando com o after-eight...estava em leitura diagonal)
engasgar é mais saudável que after-eights
a vertical é mais saudável que a diagonal
Ena Paulo!
Este 'pop' foi forte!
Foi um estoiro valente!
Lendo o texto na íntegra, só me recordo das aulas o Prof Carlos Silva e de como foi "revolucionário" estudarmos um pouco os Upanishads que, segundo me parece, assentam neste fio de pensamento condutor...
Sem dúvida que a cultura é simultaneamente criadora e conicionante a nível axiológico, daí que se refira - "Tu aprendeste isto. E toda a gente aprendeu isto" mas, logo de seguida, recordo-me da posição epistemológica de Hume quando nos alerta para a crença ditada pelo hábito ou costume de que, por ex, o Sol nascerá todos os dias.
É um texto profundo de sentido(s), mas questiona-se então: quem é o incriado? nós, fragmentos de cosmos, tão finitos com o dito pop?
Quem é o incriado!?
Não será quem interroga?
Tat tvam asi
Paulo, coma chocolate para não postar destes pop's...
É que pop só me faz lembrar "música pop" ou "super pop" (lava-loiça)
Tat tvam asi:
http://serpenteemplumada.blogspot.com/2008/01/tat-tvam-asi-tu-s-isso-chandogya.html
तत् त्वम् असि, ( Tat Tvam Asi, "Tu és Isso" ) - Chandogya Upanishad , 6.8.7
“Na indizível dificuldade de sermos a luz que somos e de vê-la sendo, na experiência de que falo, sentir-nos-emos uma presença intemporal, eterna, de nós a nós – sentirás como abruptamente, atonitamente, terrivelmente, é como se visses alguém vivendo em ti, uma pessoa que lá estava e não estava, uma realidade estranha e fulgurante, um alguém que não és tu e te habita e vive atrás de tudo quanto o manifesta, oculto atrás dos teus gestos, dos teus pensamentos, disfarçado nisso que tu és e tu e os outros reconhecem”
– Vergílio Ferreira, Invocação ao Meu Corpo, p.67.
somos incriaos pela nossa unicidade ou especificidade ontológica, é isso?
Este Pop! evocou-me o sentimento de Samvega de Siddharta. Para enfrentar este Pop! é necessário encontrar o sentimento de Pasada.
Incriado é tudo aquilo que não existe. Ou talvez tudo o que existe no estado de vacuidade. Antes do Tempo, antes de Deus. Para alguns, no entanto, o Incriado é o próprio Deus.
Incriado é tudo o que não tem criador ou também pode ser interpretado como tudo o que liberta do criador ou da ilusão de um criador.
Segundo este texto do Paulo: http://www.pauloborges.net/ALEM-DEUS_%20Fernando%20Pessoa.doc, atrevo-me a dizer que o Incriado é o Todo no seu estado de "repouso".
Esse livro deve ser muito interessante...
para aqui estou,vergilio ferreira
faz, a revolução fragmentus és tão bonita e tão chatinha
hehe queres um chocolate, baal? para mim, é divino ;)
Olá é sempre um prazer visitar-te.Aproveito para te desejar uma Feliz Páscoa.
bjs naty e carlos
???...eles nada leram...pensaram num pop qualquer, vieram ao cheiro do chocolate e lá desejaram uma boa Páscoa. tb desejamos com tudo o que isso encerra de mais contraditório.
Paulo, temos de postar sobre a Páscoa, ressuscitar neste sentido cristão não tem afinidade com a importância do renascer para o budismo, por ex?
“I have been here, I have been there
I have been everyfucking where,
O teu filho tem sede – eu dou-lhe gasolina.
A tua mãe tem malária – eu dou-lhe crack.
O teu irmão tem dores – eu dou-lhe uma bala.
Para as dúvidas – o dogma e a ideologia.
Para as saudades – tecnologia.
Para a curiosidade – currículos.
Para que aprendas que chegou o teu tempo de decorares os teus direitos: o direito de aprender a comprar, aprender a consumir, aprender a pilhar – e aprender a matar.
I have been here I have been there
I have been everyfucking where"
A vocação deste blog é a da via da Mão esquerda, mas a maioria dos participantes segue a da Mão direita, se é que segue alguma... Assim não dá.
Ninguém te leva a sério, Miguel. mas eu serei sempre a tua escrava...
Pois eu te levo muito a sério, Miguel, embora a mim ninguém me leve … Pois não sou escrava de mais ninguém a não ser de mim mesma … Escravidão essa que eu também luto para desfazer…
A via da mão esquerda assusta. A Liberdade e a Responsabilidade assustam. Poucos têm a estrutura para se porem em causa, a si mesmos e a tudo o que os rodeia. E a resposta desses que não o conseguem a quem tem a coragem de mergulhar, e mergulhar fundo, é o autoritarismo, a ironia barata, o pedantismo pipi…
Eu sou a voz de Ouroboros, Fado de Lado Nenhum, voz que atravessa fronteiras e possui a garganta de todos os que não admitem amarras. Voz da sinceridade brutal, pornográfica, que consigo tudo arrasa na esperança de encontrar ouro sob o esterco que estrutura a nossa vidinha mediocre.
Because …
It was God’s will
To make me live in such anxiety
Mine is all the world’s mourning
Neverending ‘n deep is my longing
Oh, no, it was God’s will
What a strange way of livin’
owns this heart of mine…
He lives the life of the ever lost,
Who has given him such spell?
Oh no, what a strange way of livin’…
Hear t that knows no bounds, oh nononono,
Heart that I do not command,
Lonely and lost among the crowd,
Stubbornly, endlessly bleeding,
Oh, heart that I do not command …
I won’t follow your steps no more,
Stop, oh please, stop beating!
If you don’t know where you’re goin’,
Why do you keep stubbornly runnin’,
Oh, nononono, I won’t follow your steps no more!
Because …
It was God’s will
To make me live in such anxiety
Mine is all the world’s mourning
Neverending ‘n deep is my longing
Oh, no, it was God’s will
What a strange way of livin’
owns this heart of mine…
He lives the life of the ever lost,
Who has given him such spell?
Oh no, what a strange way of livin’…
Sounds familar?
Uroboros é treta. A "Estranha forma de vida" em inglês também.
A sério? Porquê?
Tomara a muitos grupos anglo-saxónicos terem letras destas...
Pensando melhor, Olho Cego, muito obrigada pelo à-parte, que mostra que cumpres melhor a tua função que muitos olhinhos de visão 20/20 que pululam por aí.
Não é só o que eu escrevo que é uma treta. Eu própria sou uma treta.
fado de l n consegues ser pior do que eu.
baal,
Dói-me a barriga, de rit... Isso não se faz.
Decididamente, declaro-me sua fã.
Acho que não há maior fã do que eu, não conseguem!
queria dizer "rir", mas se quiseres, "rit..."
obrigado, mas só és minha fã porque não me conheces.
...nem quero conhecer... pois não quero deixar de me rir...
E eu também estava só a brincar. Mas, sinceramente, acho-te imensa graça.
Desvendado o mistério... perda do encanto...
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