quarta-feira, 22 de outubro de 2008
Um Portugal
"(...) o que de mais fundamental a Europa poderá ter dado ao mundo: com Ulisses, a ideia de que o mito é mais importante do que a realidade, de que o poder vir a ser é o substrato do que é (...).
Pessoa dá o que foi (...) a convicção de que só em Deus, como último porto, encontrariam o porto de repouso; (...) a glória de ter mostrado que o mar é sempre o mesmo e que a sua posse nada significa de vital; (...) o mérito de ter sido o corpo da vontade de Deus, de ter sido o Tempo da Eternidade a revelar; (...) o ter ensinado que toda a descoberta se faz apenas quando se tem a coragem de passar além dos domínios da alegria e da dor (...).
Portugal, completando a sua obra, dará ao mundo o seu íntimo Império feito de anseios, de lonjuras, de reinos ilocalizáveis em tempo ou espaço, o seu reino de alma humana continuamente sendo e continuamente ansiosa de mais ser, tendo-se inteiramente desprendido das ilusões de uma afirmação puramente pessoal e de uma pessoal felicidade; o mar bate nas costas do Império, mas, se o escutarmos, pára; decerto, porém, um dia, desistindo de nos opormos ao mundo, não mais o quereremos escutar; então, através de todo o nevoeiro, pelo próprio nevoeiro, terá surgido a Hora; o Encoberto, em milagre supremo, se descobrirá."
Agostinho da Silva, "Um Fernando Pessoa"
(Geoglifo)
Pessoa dá o que foi (...) a convicção de que só em Deus, como último porto, encontrariam o porto de repouso; (...) a glória de ter mostrado que o mar é sempre o mesmo e que a sua posse nada significa de vital; (...) o mérito de ter sido o corpo da vontade de Deus, de ter sido o Tempo da Eternidade a revelar; (...) o ter ensinado que toda a descoberta se faz apenas quando se tem a coragem de passar além dos domínios da alegria e da dor (...).
Portugal, completando a sua obra, dará ao mundo o seu íntimo Império feito de anseios, de lonjuras, de reinos ilocalizáveis em tempo ou espaço, o seu reino de alma humana continuamente sendo e continuamente ansiosa de mais ser, tendo-se inteiramente desprendido das ilusões de uma afirmação puramente pessoal e de uma pessoal felicidade; o mar bate nas costas do Império, mas, se o escutarmos, pára; decerto, porém, um dia, desistindo de nos opormos ao mundo, não mais o quereremos escutar; então, através de todo o nevoeiro, pelo próprio nevoeiro, terá surgido a Hora; o Encoberto, em milagre supremo, se descobrirá."
Agostinho da Silva, "Um Fernando Pessoa"
(Geoglifo)
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12 comentários:
Agostinho por vezes falava sobre geometria... esta imagem fez-me lembrar o que ele uma vez (ou mais) disse: que traçando figuras dentro de um círculo, haveria de se chegar a uma que se igualasse ao próprio círculo...
Creio que Portugal jamais poderá realizar isto, pelo simples facto de não ser uma consciência individual!... Como persiste, nos nossos melhores espíritos, esta ilusão de considerar uma nação como se fosse um sujeito capaz de uma experiência espiritual e mística!... Embora Agostinho vivesse quanto possível na presença da Hora, o risco deste aspecto da sua mensagem, a meu ver muito ingénuo, é ficarmos todos à espera que aconteça no plano colectivo o que só pode surgir na nossa tomada de consciência individual...
Individual e colectivo são as duas faces da mesma moeda...
Certamente ingénuo. Triunfantemente ingénuo. :)
Portugal não é uma consciência apenas individual: é uma consciência individualmente universal. Uma tomada de consciência individual influi na colectiva... e vice-versa.
E... claro que consegue. O meu coração bate ainda apenas por e PARA-ISSO.
Concordo com tudo o resto, menos que Portugal seja uma consciência... Dizê-lo é um resto de mística tribal, deslocada do seu contexto natural.
Quando olhamos para a mente, onde é que há lá algo a que se possa chamar Portugal... ou outra coisa, incluindo "mente"!? Sem se conhecer a mente, isto que faz o coração bater, só se pode andar à deriva de todo o tipo de opiniões emocionais e sem fundamento...
"mística tribal, deslocada do seu contexto natural."
Como pode a mística tribal estar fora de um contexto natural?
O contexto natural a que nos vemos pertencer é que pode já (e/ou ainda) não o ser...
"à deriva de todo o tipo de opiniões emocionais e sem fundamento..."
Não vejo maior fundamento do que as "opiniões" emocionais... - mas isto sou eu e o meu coração, claro.
Portugal, uma consciência? Talvez seja uma verdadeira consciência, por se saber - ou ter essa potencialidade- a existir para lá da mera consciência de si.
Se colocamos em causa os termos não falamos nada... pois então colocar-se-iam todos os termos em causa... pois tudo -é- mente.
(ou, convém, por enquanto, convencionar alguns termos de acordo com os significados que nos importam comunicar - e Portugal pode ser um deles)
Portugal não é uma tribo e, mesmo que o fosse, desde há muito que a espiritualidade humana abriu horizontes para além dessa prisão.
Quanto a pretender fundamentar uma visão das coisas em "opiniões emocionais" é o mesmo que querer construir uma casa sobre areia movediça. E-moções são movimentos instáveis. Ocupam apenas a superfície do oceano da mente: não afectam o seu fundo, se bem que o obscureçam.
Pois... tribo pode significar muita coisa, para mim não terá esse carácter de prisão que lhe atribui.
Seria certamente interessante construir sobre algo que não fosse móvel, a questão é que por enquanto vivemos sobre a Terra... e mesmo o Sol dizem que se move...
Bom, vou dar uma aula de meditação ou treino da mente: aprofundar a consciência do espaço que há para além dos pensamentos, emoções e palavras, de modo a usá-los com rigor, apenas quando for caso disso. Remexer continuamente neles é como desenhar no espaço: que fica disto tudo senão cansaço e frustração?
Boa tarde.
Ora pois é... :)
Bom descanso.
Querem nacionalizar a experiênia da verdade!?
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