domingo, 6 de junho de 2010
Eu queria morrer para perceber todos os caminhos,
fazer contas à dor como faz o taberneiro
e subtrair solidão às horas que passam por dentro do Rossio
Contar aos meus irmãos que a morte canta como gente grande,
e tem árvores para subir, e um penedo barrigudo,
cavalos para evitar monólogos,
e refrescos para os dias mais quentes do ano
Quem diz que morrer é um caso de vertigem?
Que ao olhar lá de cima o coração inventa desculpas
Quem disse que para lá chegar é preciso ir num atrelado,
Ter uma tristeza a não passar fome,
Ou autorização para assistir a comédias dramáticas?
Será a morte uma casa aberta por cima, sem pássaros na gaiola?
Uma mulher que não dá à luz, mas que nos adopta lumemente?
Será a morte uma fogueira ou um poema em que nele se afoga?
Quero saber se por lá a moda também existe,
Se o vento constipa os sonhos à varanda
Ai se pudesse desamarrar-me da vida por umas horas,
Montar um barco a pedais e ir,
Ao encontro do desencontro, achar o que nunca se perdeu
Ser livre como um pássaro nas Américas
Levado pelas mãos de cinquenta mil homens
Olhar o mundo sem ser olhado
Nadar em espelhos, voar sobre rios
E cair no vazio tão cheio de homens nascidos como flores,
vindos da terra perfumada,
de cabeça fria, a morder todos os insectos.
Entrar nessa gigante solidão de mãos cheias,
De nariz empinado, alimentado para sete dias
Como um peregrino a apagar distâncias a suor, cânticos, lamentos,
Levando aos ombros a montanha possível
As pedras para espremer em vinho
E um poema a servir de pão e abrigo
Queria viver ao contrário daquilo que foi e voltará
Nascer velho e morrer criança
Conhecer a minha mãe solteira
Vê-la grávida de mim
Dizer: olá como estou
Ver a dor que foi entrar na vida com a ajuda de ferros
Chorar por não saber mais do que o mínimo
Pensar que choro e riso sonham para o mesmo lado
Quero da morte o seu sorriso de alicate
O seu cinismo a dizer que ainda vive
A sua paisagem nua e crua
A sua tristeza que para muitos é uma alegria
O seu soro amnésico e cristalino
Quero com a morte aprender como se vive
Respirar com uma flor entre os dentes,
sem sangrar,
feito animal que desconhece que morrer existe
Haver a possibilidade infinita de andar reptilmente sobre o seu pescoço
Escrever-lhe com letras vivas e reluzentes
Redondilhas maiores para cantar até dizer chega
E cair de cansaço sobre a palha do seu umbigo
Não sei se a morte é uma mulher de cabelos pelos ombros
Ou se tem longas tranças para que se possa subir
Sei lá se nela os poetas atiram-se das janelas para viverem
Ou se a queda é para o ar mais denso
Ó morte, onde andas tu? Mostra ao menos o teu colar de ossos
Ou a tua saia que mandaste fazer no cabo do mundo
Ó morte, ri-te! Mostra os teus dentes verdadeiros
Quero ser em ti um turista, pôr-me ao lado das estátuas,
Tirar retratos coloridos, dizer-te:
- Entre os homens o teu nome para sempre viverá!
Pudesse hoje ou amanhã morrer por um bocado
O tempo de chorar todas as pedras preciosas
Mas que não valem nada
Não servem nem rei nem pajem
Haver os dias assim, um silêncio sempre à espreita
Olhar todas as ruas que vão dar à minha casa
sabedor que as maçãs também nascem das laranjeiras
E assim louco e destemido, poder regressar à vida e tornar a morrer
Como uma oxálida nas mãos de umas outras mãos
A nomearem o amor como único fio no tear dos Homens
fazer contas à dor como faz o taberneiro
e subtrair solidão às horas que passam por dentro do Rossio
Contar aos meus irmãos que a morte canta como gente grande,
e tem árvores para subir, e um penedo barrigudo,
cavalos para evitar monólogos,
e refrescos para os dias mais quentes do ano
Quem diz que morrer é um caso de vertigem?
Que ao olhar lá de cima o coração inventa desculpas
Quem disse que para lá chegar é preciso ir num atrelado,
Ter uma tristeza a não passar fome,
Ou autorização para assistir a comédias dramáticas?
Será a morte uma casa aberta por cima, sem pássaros na gaiola?
Uma mulher que não dá à luz, mas que nos adopta lumemente?
Será a morte uma fogueira ou um poema em que nele se afoga?
Quero saber se por lá a moda também existe,
Se o vento constipa os sonhos à varanda
Ai se pudesse desamarrar-me da vida por umas horas,
Montar um barco a pedais e ir,
Ao encontro do desencontro, achar o que nunca se perdeu
Ser livre como um pássaro nas Américas
Levado pelas mãos de cinquenta mil homens
Olhar o mundo sem ser olhado
Nadar em espelhos, voar sobre rios
E cair no vazio tão cheio de homens nascidos como flores,
vindos da terra perfumada,
de cabeça fria, a morder todos os insectos.
Entrar nessa gigante solidão de mãos cheias,
De nariz empinado, alimentado para sete dias
Como um peregrino a apagar distâncias a suor, cânticos, lamentos,
Levando aos ombros a montanha possível
As pedras para espremer em vinho
E um poema a servir de pão e abrigo
Queria viver ao contrário daquilo que foi e voltará
Nascer velho e morrer criança
Conhecer a minha mãe solteira
Vê-la grávida de mim
Dizer: olá como estou
Ver a dor que foi entrar na vida com a ajuda de ferros
Chorar por não saber mais do que o mínimo
Pensar que choro e riso sonham para o mesmo lado
Quero da morte o seu sorriso de alicate
O seu cinismo a dizer que ainda vive
A sua paisagem nua e crua
A sua tristeza que para muitos é uma alegria
O seu soro amnésico e cristalino
Quero com a morte aprender como se vive
Respirar com uma flor entre os dentes,
sem sangrar,
feito animal que desconhece que morrer existe
Haver a possibilidade infinita de andar reptilmente sobre o seu pescoço
Escrever-lhe com letras vivas e reluzentes
Redondilhas maiores para cantar até dizer chega
E cair de cansaço sobre a palha do seu umbigo
Não sei se a morte é uma mulher de cabelos pelos ombros
Ou se tem longas tranças para que se possa subir
Sei lá se nela os poetas atiram-se das janelas para viverem
Ou se a queda é para o ar mais denso
Ó morte, onde andas tu? Mostra ao menos o teu colar de ossos
Ou a tua saia que mandaste fazer no cabo do mundo
Ó morte, ri-te! Mostra os teus dentes verdadeiros
Quero ser em ti um turista, pôr-me ao lado das estátuas,
Tirar retratos coloridos, dizer-te:
- Entre os homens o teu nome para sempre viverá!
Pudesse hoje ou amanhã morrer por um bocado
O tempo de chorar todas as pedras preciosas
Mas que não valem nada
Não servem nem rei nem pajem
Haver os dias assim, um silêncio sempre à espreita
Olhar todas as ruas que vão dar à minha casa
sabedor que as maçãs também nascem das laranjeiras
E assim louco e destemido, poder regressar à vida e tornar a morrer
Como uma oxálida nas mãos de umas outras mãos
A nomearem o amor como único fio no tear dos Homens
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
não sei se a crítica ofende
:
gostei muito
abraço
Bonito.
Muito bom. Desculpas por não ter tempo para dizer mais!...
Enviar um comentário