O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quarta-feira, 25 de março de 2009

O que é cada um de nós?

"O que é cada um de nós, na sua essência absoluta, senão uma perfeição adiada para Deus?"

- Fernando Pessoa, Carta de 5 de Janeiro de 1914 a Teixeira de Pascoaes, in Correspondência. 1905-1922, Lisboa, Assírio & Alvim, 1999, p.107.

Não concordo, embora seja belo. Na verdade, num certo sentido, só publico aquilo com que não concordo. A perfeição nunca é adiada nem adiável. E muito menos para alguém. Muito menos para "Deus". A perfeição é.

22 comentários:

Anónimo disse...

Caro Paulo,

Já tinha reparado que o fazia. E creio que talvez uma das razões, o “certo sentido” desse facto é o de olhar de fora de si para ver com o olhar mais “limpo”, imparcial, e conferir connosco a outra parte de “um certo sentido” que com elas concorda. Já aqui se apresenta o problema do “absoluto” e da “essência” que não somos nem não somos: a Esperança, e uma certa visão da Saudade. A perfeição só existe em Saudade, não no homem, nem em Deus. Em cero sentido, Deus não existe para o Saudoso nem para Si mesmo.
Por outro lado tudo o que é na totalidade do conhecer, é no absoluto. Tudo o que é absoluto “pensa”. Seremos então pensados por essa Saudade, por esse Deus? Por esse Nada?
A carta é dirigida a Teixeira de Pascoaes. Pessoa também ele discordava com a sua mesma afirmação, que não sendo verdade, também não era não verdade. Posto que a essência do absoluto, não é perfeição nem não perfeição e muito menos é “gente” a que se chame “homem”, perfeição ou imperfeição. Pois se a essência não é uma existência... mas tão só a saudade daquela.
Isso sabia Pascoaes e Pessoa, que o disse na carta a alguém que, em certo sentido, em tudo via diferentemente o mesmo, em Saudade.
Concordo que a perfeição não seja adiável. Em primeiro lugar, porque não existe, ela é essência absoluta(?), depois porque não há tempo, e depois, ainda, porque não há nem perfeição, só pensamento disso.
A perfeição se a houvesse não tinha para quem nem para quê. A perfeição é. (Mas o que é a perfeição?)

E para “Deus” não seria, pois que seria absurdo adiar algo para alguma coisa que não existe. Só em Saudade...

Também gosto de, ao responder, ao pensar, dizer coisas com as quais não concordo, em certo sentido. Para “melhor” as ver em mim, ou para me estranhar... A filosofia deixa-me sempre indefesa e a “escorregar”... Poetas e filósofos, então...

Um sorriso, Paulo,

Anónimo disse...

É tão estranho o que aqui se lê... É por isso que não largo este blog.

Anónimo disse...

Recordo-me de um ensinamento dado por um mestre espiritual, dizendo que a natureza primordial (a perfeição) é como uma barra de ouro suja de carvão. Se removermos a sujidade conseguiremos contemplar o ouro, o qual esteve e estará sempre (ou seja, é). Por isso, «a perfeição nunca é adiada para alguém» pois ela é, apesar de muitas vezes estar oculta.

Anónimo disse...

Finalmente alguém diz algo acertado. A perfeição nada tem a ver com saudades. A saudade é que é, na melhor das hipóteses, da perfeição oculta, apenas pressentida. Enquanto houver carvão a encobrir o ouro que lá sempre está.

Anónimo disse...

O carvão que encobre o ouro são todos estes conceitos e imagens poético-filosóficos que só expressam e aumentam a confusão que há nas mentes.

Anónimo disse...

Tu és pó, e ao póe voltarás... a mulher tem dores de parto e é dominada pelo homem e o homem trabalha a terra para sobreviver... eis o sentido do Génesis 3.

Anónimo disse...

"Pensar é esquecer"... não será isso meditar? Num tempo e espaço em que tenhamos tempo e espaço...

Anónimo disse...

Libertemo-nos das palavras... e dos pensamentos que espontaneamente acorrem às nossas mentes, para que fiquemos na mais vasta escuridão... haverá por aí luz?...

Anónimo disse...

A perfeição não é, mas talvez seja ou talvez possa ser... quando? Quando estivermos em paz... Existirá maior perfeição?

Anónimo disse...

E quando estamos/estaremos em paz? Quando nada quisermos... quando tudo tivermos... plenos... quando tudo abandonarmos...

Anónimo disse...

Guelfa,

não será a «perfeição» a sabedoria (liberta de véus emoconais e conceptuais) impregnada de compaixão? Não será isso a Saudade? Não sentimos nós saudades dessa Saudade Primordial (essência absoluta) que é, mas que está encoberta por palavras como estas (carvão) que em vão tentam descrevê-la?
Saúde!

Anónimo disse...

a saudade é saudade dos momentos bons, da felicidade passada. ou será isto apenas nostalgia? saudades do paraíso em que nos julgámos? ou meramente o imaginámos e imaginamos? Eu imagino-o e n'Ele creio, leia-se No Paraíso. Um dia hei-de lá estar, nem que depois de morto, nem que apenas nas lágrimas da minha imaginação.

Anónimo disse...

a perfeição é a lágrima, pureza original... ou talvez isto não passem de palavras parvas e inexplicáveis. Bem, espero que cada um encontre o seu próprio Paraíso, pois nesta Terra é o que não há de dores de parto e necessidade de trabalhara terra.

Será que a Bíblia devia começar em Génesis 2 e acabar em Génesis 3? Tudo o mais é lágrima. E lágrima é fé. E a fé não está nas palavras, mas na escuridão dentro de cada um de nós que, imaginativamente, se torna laboriosamente luminosa.

Rococo.

Anónimo disse...

Caro Pedro Rodrigues,

Pois eu acho que a Saudade é essa experiência primordial. Teoricamente seria, como é referido por Paulo Borges, a primazia dada ao indeterminado e do possível sobre o determinado e o real.
É tembém, dentro deata linha de pensamento, a contínua metamorfose da vida, da existência.
Mas alheia a todos os conceitos "incluindo o ser-se-alheia".
Não pode ser adiada. A Saudade é e não é.

Anónimo disse...

o indeterminado é a liberdade, não a saudade... penso eu de que.

Anónimo disse...

sinto saudade do beijo que me já não quer
dos lábios que quero tocar...

saudade de amar

para além disso, apenas do Paraíso

quando sofro, sinto saudade de não sofrer...

saudade? saudade de quê?

do bem, do que é bom, da vulgarizada palavra felicidade

mas "amor" fica melhor e é bem mais profunda, porque difícil de compreender...

Anónimo disse...

saudade é lágrima e angústia
mas é também comoção
e a comoção é a verdadeira lágrima
A Lágrima
de Deus
que por nós se esvaziou, que por nós chorou enquanto se esvaziava...

Pureza

lá voltaremos?

A cada qual O Seu Paraíso.

Anónimo disse...

a perfeição é, a economia é...

Paulo Borges disse...

Cara Saudades e caro Pedro Rodrigues, creio que na experiência primordial ainda não há ou já não há Saudade, pois há Saúde, reconhecendo embora que, na sua ponta mais fina, a Saudade é também isso, matando-se e morrendo. Sinto a mais funda Saudade como saudade de o não ser, transcendência de toda a memória e desejo em puro e instante Despertar.

Saúde!

Anónimo disse...

quem fala de saúde está doente

Anónimo disse...

A Saudade é uma doença de que se gosta, um mal que se deseja.

Anónimo disse...

Anónimo,

Nunca se deseja o mal. A Saudade aspira sempre ao bem e à perfeição divina, não adiada. Eterna.Em Deus, mesmo que seja o Sem Nome, o Sem Deus. É como a sombra que se não deseja, mas antes se sabe a luz do outro lado, a luz que há nela: a sìntese. O desejo de unir céu e terra,longe e perto, espírito e corpo. Religar. A Saudade é religar, unir.