domingo, 18 de outubro de 2009
hipparion
A espera assume-se como forma de assentar definitivamente todos os objectivos num cadáver, que é futuro. Viver o tempo que resta com a mente focada e alinhada para essa distância, viver de acordo com a projecção sem sabermos o que daí poderá advir, viver para o futuro sem saber como lidar com o presente, viver uma tranquilidade de tempos díspares moldando-os a um só tempo, tudo isto, é esperança. Se a expectativa sobre algo físico ou imaginário é generosamente vivenciada, ultrapassando términos de tudo o que se pensa crível, começa o Homem a visionar, compondo toda a sua vida de acordo com a indicação magnética de que tudo o que daí advém será um fim, ou resultado final tangível. Deste parco realinhamento instado resulta frequentemente um afogo, gracioso desassossego noctâmbulo navegado ao dorso de uma constelação, em breves reingressos à consistência, à vivência e existência de um Eu, à queda de um cavalo.
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Imagem: photoframe
Powaqqatsi - Life in transformation
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5 comentários:
Dizia o meu avô que a queda de um burro era pior do que a queda de um cavalo. Mas muitas vezes cairmos em nós é o diabo!
:)
É o diabo! Como se costuma dizer :)
Abraço Paulo :)
A tua linguagem, Rui ("É o diabo! Como se costuma dizer"), exige-me sempre um esforço extremado, levado ao limite do exaurido, não só porque cada nova palavra tua me é absolutamente inesperada como um susto ou o pânico trágico duma cena, mas também porque cada uma parece querer apontar para algo que não é ela, mas que está de algum modo já nela, para a cada instante querer furtar-se a isso.
Se eu quisesse "resumir" este teu texto espantoso diria que ele fala de como lidar com a vida se ela fosse, como creio te seria desejável e eu concordo, tão inesperada e inaprendível quanto a queda de um cavalo.
Cada queda de cavalo é, a um tempo, queda dele e queda em nós.
Cair em nós é algo de não tão amiúde ocorrência como talvez queiramos supor ou dar por aceite. Isso seria reconhecer que estamos menos vigilantes do que gostaríamos de acreditar, sobretudo porque nos desmonta desse "parco realinhamento instado" de que tão bem falas.
Preferimos sempre "viver uma tranquilidade de tempos díspares moldando-os a um só tempo" - n’ "a expectativa [, de] algo físico ou imaginário [… ,] generosamente vivenciada, ultrapassando términos de tudo o que se pensa crível".
Preferimos isso ao "desassossego noctâmbulo navegado ao dorso de uma constelação" que nos reduz ao simples "assentar definitivamente todos os objectivos num cadáver".
Tudo isso, dando-nos a esperança - que é "esse viver para o futuro sem saber como lidar com o presente" -, remete-nos para o insituável susto da "queda de um cavalo", "breve reingresso à consistência", para "viver o tempo que resta com a mente focada e alinhada para essa distância", "compondo toda a [...] vida de acordo com a indicação magnética de que tudo o que daí advém será um fim", quando talvez não seja.
Ufff!(risos)
Abraço.
Viver uma mudança esperada, planeada e provocada por nossa vontade, tem destas coisas :) Boas... digo eu...
Porque antecipadamente pensamos na mudança e no resultado dela nesses dias da frente, ao mesmo tempo que temos saudade daquilo que ainda não deixámos para trás.
A esse tempo intermédio o que chamamos?
Mas o que fica cá dentro, no fundo é uma sensação muito boa. Porque na maioria dos casos a mudança pela qual esperamos e que desejamos, acontece numa altura de ruptura de nós mesmo, de perda de uma certa identidade que sentimos necessidade de voltar a encontrar e de juntar àquilo que julgamos que somos ou que julgamos querer ser.
Beijos e desejo de boas Rosas-dos-Ventos*
(eu sei que me percebeste ;))
"Desenganemo-nos da esperança, porque trai, do amor, porque cansa, da vida,
porque farta e não sacia, e até da morte, porque traz mais do que se quer e menos
do que se espera."
Na floresta alheado e desassossegadamente agradecendo, um abraço, dos vossos braços.
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