O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quarta-feira, 9 de julho de 2008

um poema de António Manuel Couto Viana





António Manuel Couto Viana é natural de Viana do Castelo, onde nasceu em 1923. É poeta, dramaturgo, ensaísta, memorialista, gastrólogo e autor de livros para crianças. A sua estreia literária fez-se em 1948 com o livro de poemas O Avestruz Lírico. Dirigiu com David Mourão-Ferreira e Luís de Macedo as folhas de poesia Távola Redonda. Publicou, até hoje, mais de uma centena de obras, sobretudo de poesia.
Desde cedo interessou-se pelo teatro, tendo colaborado como actor, cenógrafo, encenador e empresário em várias companhias, uma das quais o Teatro do Gerifalto. Para além da poesia e do teatro dedicou-se também à literatura infantil, através de ensaios, escrita e tradução de livros, e dirigiu, entre outras edições infanto-juvenis, a publicação Camarada (1949-1951).
Em 2004, a Imprensa Nacional - Casa da Moeda editou-lhe a obra quase completa 60 Anos de Poesia, em dois volumes, de cerca de quinhentas páginas cada um. No mesmo ano, saía O Velho de Novo, com a chancela da editora portuense Caixotim. Recentemente, A. M. Couto Viana editou o livro de poemas Digo e Repito (Averno, 2008) e Restos de Quase Nada e Outras Poesias (Averno, 2008), donde se tira este poema:

Lá para o fim

Já não frequento o café
Nem de subúrbio, nem de cidade:
A minha vida, agora, é
Uma bengala e a saudade.

Perdi interesse pela evasão.
O rodear-me de nova gente.
Ganhei o gosto por outro pão
Mais indicado para o meu dente.

Nenhuma escrita já é memória.
Já não me perco por qualquer lado.
Deixei o nome na sua glória.
Deixei o corpo no seu pecado.

Fluía o verso. Mas, hoje, estanca
Ante uma alma de austero porte.
Foi rosa rubra. É rosa branca.
Que imaculada lhe seja a morte.

http://www.editora-averno.blogspot.com/
http://www.harmoniadomundo.net/Poesia/Couto_Viana.htm

3 comentários:

Tamborim disse...

Achei lindo, puro declinar, ocaso. Cansaço. Lembra-me o espelho em A Fada Oriana: só queria uma parede branca.

Anónimo disse...

Gastrólogo ou gastrónomo ?

Duarte D. Braga disse...

gastrónomo não inclui o gastrólogo, mas o gastrólogo inclui o gastrónomo... (?)