O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quinta-feira, 10 de julho de 2008

Das Saudades que Havia

Uma ânsia de mim candente me não livre
Do outrora que a cada instante ganha o tempo
Um porão cheio de nada a tudo sobrevive
Mesmo às chamas com que arde o mesmo vento.

Não sei por que razão, ou sem razão alguma, me vem a chama
Arder em brasa à beira de um céu vago e vazio
A hora hesita, gira em espiral a luz branca e insana
Cai do tinteiro de ontem, em lágrima, a sombra dum navio.

Quem vem lá? Que estranha e negra a noite se vislumbra
Da névoa que durou por sobre a amurada?
Não é a flor do vento, nem lua, nem penumbra
É uma sombra mansa, um feitiço de lua, uma clareira amada.

É a alma do mundo a chamar em surdina o pensamento
De uma onda maior que ainda não chegou e tarda
A luz em que saudosa vagueia a sombra do momento
Que quando a vejo, já de mim saudosa, sinto a saudade apartada.

9 comentários:

Unknown disse...

Grande poema. ;)

Ana Margarida Esteves disse...

Um abraço cheia de saudade de todos vocês, desejosa de votlar a ter internet em casa para poder voltar a participar em pleno neste blogue e no da Nova Águia.

Paulo Borges disse...

Belo poema ! Se for inédito, seria possível publicá-lo no nº2 da Nova Águia ?

Paulo Borges disse...

Que é a saudade senão a alma do mundo ? Reduzimo-la pensando-a apenas à escala humana. Porventura habita e rompe mesmo as entranhas do absoluto, como aquela Sehnsucht de que fala Schelling...

platero disse...

sabes o que eu costumo dizer às pessoas da tua poesia.

eis prova.

beijo

Anónimo disse...

Paulo,

O poema é "fresquinho", é de ontem, no mesmo momento enviado para o ventre da serpente.
São vocês que me inspiram e fico contente que tenham gostado.
Claro que o poema é vosso e se nele acharem algum mérito, pode ser publicado. Há a questão do autor... Pode ficar com o nome com que aqui me assino?

Um abraço

Ana,
Já sentimos falta dos teus textos, princesa, tantas saudades...

Anita,

Não é muito grande... alguns versos é que têm muitas sílabas...

Platero,

Tu bem sabes a importância que dou às críticas... Importante é a tua amizade.

Outro beijo

Florbela disse...

não será a saudade que nos faz eterna e constantemente continuar a procurar? belo poema!

Ana Moreira disse...

Na mais profunda reverência, aqui vos deixo uma rosa de alva lua cheia.
Enches os corações esfomeados de harmonia!

Anónimo disse...

Saudade...
Agora entendo que sou "coração esfomeado".
Mas porquê?...