sexta-feira, 25 de abril de 2008
A Nave dos Loucos
A José Alberto Gil, com muita Saudade
Ignorando de onde, com quem e para onde
uma nau cruza o oceano ignoto
Por pendão um remoinho de línguas de fogo
nas velas um incêndio jamais extinto
A bordo vai Todo o Mundo e Ninguém
animais, deuses e homens de sexo indefinido
Sem tempo consomem os dias
em missas, danças e riso
coisas santas porque inúteis
discursos sábios sem juízo
As populações da costa temem-na,
mas diz-se que a terra canta quando passa
e as colheitas logo superabundam
Também as mulheres se tornam mais fecundas
e concebem filhos que não choram:
os que súbito não desaparecerem
morrerão infantes ou envelhecerão poetas
Se uma trompa entre brumas a anuncia
e em chamas no horizonte a avistam,
os homens entregam às vagas peças de ouro
pão, frutos e flores
as mais velhas garrafas de vinho
Nas igrejas os sinos repicam
os padres proferem sermões inspirados
mas há sempre algo de estranho:
um vitral que em silêncio explode
amantes beijando-se quando a Hóstia é consagrada
imagens tombando na direcção anunciada
Por isso todos se benzem
e intimamente a esconjuram,
a longínqua nau que jamais de terra se aproxima
e insondável segue a sua infinda Viagem,
sem leme nem bússola nem capitão
sem mapa, rota ou razão
Murmuram os loucos e os vagamundos
ouvidos extasiados na sibilina voz do Vento
que a bordo é sempre Domingo de Pentecostes
e numa eterna Folia bailam os inocentes do Senhor,
os eleitos do Profundo:
Todo o Mundo e Ninguém
Ignorando de onde, com quem e para onde
uma nau cruza o oceano ignoto
Por pendão um remoinho de línguas de fogo
nas velas um incêndio jamais extinto
A bordo vai Todo o Mundo e Ninguém
animais, deuses e homens de sexo indefinido
Sem tempo consomem os dias
em missas, danças e riso
coisas santas porque inúteis
discursos sábios sem juízo
As populações da costa temem-na,
mas diz-se que a terra canta quando passa
e as colheitas logo superabundam
Também as mulheres se tornam mais fecundas
e concebem filhos que não choram:
os que súbito não desaparecerem
morrerão infantes ou envelhecerão poetas
Se uma trompa entre brumas a anuncia
e em chamas no horizonte a avistam,
os homens entregam às vagas peças de ouro
pão, frutos e flores
as mais velhas garrafas de vinho
Nas igrejas os sinos repicam
os padres proferem sermões inspirados
mas há sempre algo de estranho:
um vitral que em silêncio explode
amantes beijando-se quando a Hóstia é consagrada
imagens tombando na direcção anunciada
Por isso todos se benzem
e intimamente a esconjuram,
a longínqua nau que jamais de terra se aproxima
e insondável segue a sua infinda Viagem,
sem leme nem bússola nem capitão
sem mapa, rota ou razão
Murmuram os loucos e os vagamundos
ouvidos extasiados na sibilina voz do Vento
que a bordo é sempre Domingo de Pentecostes
e numa eterna Folia bailam os inocentes do Senhor,
os eleitos do Profundo:
Todo o Mundo e Ninguém
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19 comentários:
Haverá alguma relação entre esta Nave dos Loucos e esta Serpente Emplumada ?
Será uma Nave uma Serpente ? Serão plumas os loucos ?
Se ser "pluma" é ser louco. Quero ser pluma, já! Estou farta de coisas "sérias"! Se fazes estas perguntas, tens certamente a tua resposta. Posso saber qual é?
A minha resposta são perguntas: porque estás farta de coisas sérias, porque queres ser louca ? O que procuras ? Repara, não te pergunto quem és, que pouco importa, mas sim o que procuras. Porque, se realmente o procuras, já o és, mesmo que ainda como tal te não vejas e te não vejam.
Bem, a tua resposta é séria demais! E eu que ando a fugir de coisas sérias!
Definitivamente, não falo contigo hoje! Só amanhã. Esperas?
Não espero por ti porque não espero por mim. Amanhã (hoje) já não sou quem era. E tu, achas que te manténs a mesma ? Pode ser que não... Que deixes de fugir... ou de achar que há coisas sérias...
Não. Claro, que não sou a mesma. Se ando na Serpente mudo de pele!
E será que alguma vez deixamos de fugir? Não será que é porque fugimos que não somos os mesmos? Mas, se calhar, pensamos que fugimos e nem sequer saímos daqui... é por isso que espero por ti outra vez... porque todos deixamos rastos. Como a Serpente.
A única coisa séria é talvez achar que há coisas sérias... Será loucura pensar assim?
Desalmada disse:
tenho velas a arder nas franjas do coração;
Não sou ninguém e adoro todo o mundo e o mundo de ninguém.
Oh da nau, posso entrar?
Eu que sou todo o mundo e ninguém...
Oh da nau, posso entrar?
Eu que sou solidão e desrazão...
Oh da nau dás-me asas?
Eu que sou parva pasmada e já não sei o que é ser alada...
"Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.
Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?
Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte
Oxalá que ela
Nunca me encontre.
Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer."
Fernando Pessoa
Ainda não é o tempo, fiel hussar! Talvez o seja um dia quando um dia o já não for…
Mas, por agora, sendo uma “Kleeda” caída do céu, preciso de realizar algumas operações estratégicas: extensões nas asas; alongamento de pernas e colocação de óculos bem gradeados para que o olhar não se evada sempre que tento acertar em algum objecto ou em alguém.
Depois, este espírito cigano dá cabo de mim! Kleed fazer? Rasteira-me a toda a hora e pontapeia-me para este cavalo selvagem sem freio nos dentes que, sempre que vê o dono, o nega mais de três vezes.
Selas?
E o arranque é tão medonho que faz esvoaçar a “mantra” de retalhos da Virgem Maria deixando o Menino Jesus a chorar ao relento enquanto que, do fundo do horizonte, estala, imponente e furioso, o canto gregoriano de todos os santos nomeados em combate, cuja letra dedicada à malta comporta tal heresia que faz explodir os vitrais do olhar de Deus!
É nesta convulsão de poeira cósmica que caio do cavalo e fico, entre escombros e silvas, a vê-lo desaparecer no coração de uma estrela… Dá-me vontade de tragar livros tumulares sobre o Nada, mesmo sabendo que enterram “cadáveres adiados” de rosas cortadas.
A errância é sempre a indelével conclusão.
Ter-vos-ei saudade de falar sozinha…
Também dos meus ameguinhos do Posto de Abastecimento.
Desculpem o pertoguês.
Bem hajam!
Saravah, Kleemência, isso é que é falar a portuguesa língua, ou liga, psicotropicamente ! Não haja clemência e tudo será salvo !
Amo-te !!!!!!!!
Loucos e Loucas desta Serpente, quero ir para a cama com vocês tod@s ! Deixem-me os contactos que eu tacto !
Grande orgia!
Vamos ver se não adormeces...
Orgia? So se for como a do Kubrik
"Linda e maravilhosa" desta vez só alinho numa megaorgia, mas de Olhos Bem Abertos e não quero o Bill por perto... a password que abre as portas do castelo é a mesma: Fidélio. Com ou sem máscaras e capas de veludo, vinde ...
Estamos a caminho... Recebes-nos, doce Alice ?
Sem máscara... deixando cair leve, doce e graciosamente o vestido de seda... Sim, Turbamulta! Apressai-vos... a Festa vai começar! "É a Hora!"
Sem máscara... deixando cair leve, doce e graciosamente o vestido de seda... Sim, Turbamulta! Apressai-vos... a Festa vai começar! "É a Hora!"
Parabéns pelo magnífico blog!
Desde aqui o Brasil, aproveito para divulgar dois sonetos da grande poetisa gaúcha Alma Welt 1972-2007, que abordam esse tema recorrente da condição humana:
A insensata nau (de Alma Welt)
Disparam-me das torres pensamentos
Contra o mastro desta nave de sonetos.
Meus bispos e a rainha, muito lentos,
E os peões, ou marinheiros, são suspeitos
De sedição ou motim perto das ilhas
Na insensata nau que é o casarão
Entre as vagas verdes das coxilhas,
E o minuano a soprar... mas no verão.
Porém, poder perdido, perco o punho
De ferro com que manobrava a vela
E o leme que era rota e testemunho
Do meu ser racional e orientado
Com que outrora pilotava a caravela
Do meu sonho lúcido e acordado.
(sem data)
e mais este:
O reino da Alma (de Alma Welt)
Entre Rosário e Livramento
O reino desta Alma pampiana
Se estende muito além da Taprobana
Onde o Preste João perdeu o jumento*,
Em meio às Bem-Aventuradas Ilhas
Que no mar da pradaria são coxilhas
A terra de Cocaygne ainda espera
Os aventureiros de outra Era;
E o velho Cronos parado continua
Na planície do Letes, vaga-mente
Em que Ananke ainda conduz sua charrua
Em torno ao casarão meio adernado
Que afunda comigo lentamente
Como insensata nau em meio ao prado...*
15/01/2007
Notas
* Onde o Preste João perdeu o jumento" - Expressão criada por Alma, equivalente a "onde o Judas perdeu as botas", isto é, um pago ermo "no fim do mundo". O Preste João era um poderoso e riquíssimo rei cristão, mítico, que os navegadores da Renascença acreditavam reinar nas Índias Orientais ou na China, terras praticamente desconhecidas dos europeus (a não ser pelo veneziano Marco Polo cujas narrativas corroboravam esses mitos) e almejadas pelos aventureiros ávidos de riquezas.
"... insensata nau em meio ao prado"- Alma compara o casarão à "nau dos insensatos", um grande barco ou navio de madeira, onde na Idade Média eram colocados os loucos para segregá-los do convívio dos "sãos" das aldeias e dos campos, e que ficava descendo o rio à deriva, até afundar pelo caos reinante a bordo, já que o capitão era escolhido entre os loucos, tal como na nossa sociedade (risos). (Lucia Welt)
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