segunda-feira, 31 de maio de 2010
Já me cansa o mar,
sempre aquele mesmo vai e vem das ondas,
a paisagem fixa do poente quase a desmaiar,
o pontinho negro lá ao fundo de uma embarcação
a confundir-nos com um pássaro que regressa,
o vendedor de gelados a puxar pelas veias do pescoço para gritar,
a bandeira verde,
amarela e vermelha, sem gente para tomar conta,
porque ser e nada é a mesma cousa
os godos qua atiramos à agua e voltam,
a areia fina e molhada que escreve os nomes,
a areia grossa que não deixa escrever os nomes,
os amantes nas dunas em espectáculos ao ar livre,
os homens de camisa aos quadrados à pescador
mas que não são pescadores,
a espuma do mar que nunca chega a dizer para que serve.
Também me cansa a terra,
os automóveis alterados, já sem cor primária,
as ruas largas onde cabem cinquenta mil pessoas sem
nenhum grau de parentesco entre nenhuma delas, as lojas
com manequins modernamente equipados a fazer
de chamariz, as fontes ali esquecidas, substituídas
pelas águas em garrafas de plástico, os semáforos
intermitentes a esquecer memórias, os sinais de proibição a decidir
para que lado tenho de ir, os cães à espera de um dono, os chulos
a falar de literatura, as casas valentemente arquitectadas a
esganarem-se umas às outras,
os jardins onde os homens libertam cheiros dos sovacos.
Também me cansa o ar,
o sol a mostrar quem manda, as estrelas de aluminio,
o azul que cá para mim nem sabe ser claro nem escuro,
as nuvens carregadas de revolta e há quem diga que é de chuva,
o deus lá mais em cima, muito lá em cima,
a imprimir livros de banda desenhada, a festejar os seus milhões de anos,
os anjos mudos, o vento mortinho por se revelar, os relâmpagos a fazer dos homens tão pequeninos.
Cansa tudo isto, sempre esta dor revestida de veludo,
as manhãs,
as tardes e as noites a disputarem o dia, os relógios de pulso
a quererem ser donos do tempo, a dona Maria à janela
a perguntar se esta semana escrevi para o jornal,
e sobre quê,
as crianças que chutam a bola sem direcção, as árvores tristes
por não conseguirem vergar a espinha,
os gatos de língua presa no novelo, as mãos sem pulso
o senhor Dantas a dizer que se não fosse o destino
daria um bom guarda-redes, o cardeal que quando se lembra
põe-se a cantar à varanda. O amor escondido no colo de um filho da mãe.
Cansa-me perguntar onde dormem os pássaros,
elaborar sonetos para atingir o amor, acender um cigarro já aceso,
lembrar a vida, esquecer a morte,
lembrar a morte, esquecer a vida, passar a ferro os poemas amarrotados,
enlouquecer por uma ninharia, cansa dizer caramba,
mais aquela dor exótica do romancista, meditar sobre a palavra palavra,
perdoar a masculinidade da solidão, entrar em guerra para sair em paz.
Cansa-me pensar que amanhã voltarei a pensar em tudo isto,
no mar,
na terra,
no céu da minha boca, na minha idade à beira rio,
no sol que me aleijou, na carga que tive de deitar borda fora do silêncio.
Por bem existe um poema de tempo interminável,
versos de muletas à espera de ficarem curados,
sonhos na manga que um deus não soube bem costurar,
pedaços de nada e fartura, rimas por rimar, a loucura sem tratante,
cores,
música,
vinhas simbólicas que o poeta transformará em pétalas,
água, mistério, ruínas,
comboios por cima das cabeças,
ilusões retalhadas a canivete,
lume, pedra,
sombra na sombra,
flor, grito, coração recheado com baunilha,
gaveta, e tudo o que a verdade mentir,
tudo isto é preciso para a vida inteira,
para a morte incompleta,
a saber que o Ser é muitas coisas,
tantas outras que até o gato comeu, já que, depois da festa,
só a poesia salva!
sempre aquele mesmo vai e vem das ondas,
a paisagem fixa do poente quase a desmaiar,
o pontinho negro lá ao fundo de uma embarcação
a confundir-nos com um pássaro que regressa,
o vendedor de gelados a puxar pelas veias do pescoço para gritar,
a bandeira verde,
amarela e vermelha, sem gente para tomar conta,
porque ser e nada é a mesma cousa
os godos qua atiramos à agua e voltam,
a areia fina e molhada que escreve os nomes,
a areia grossa que não deixa escrever os nomes,
os amantes nas dunas em espectáculos ao ar livre,
os homens de camisa aos quadrados à pescador
mas que não são pescadores,
a espuma do mar que nunca chega a dizer para que serve.
Também me cansa a terra,
os automóveis alterados, já sem cor primária,
as ruas largas onde cabem cinquenta mil pessoas sem
nenhum grau de parentesco entre nenhuma delas, as lojas
com manequins modernamente equipados a fazer
de chamariz, as fontes ali esquecidas, substituídas
pelas águas em garrafas de plástico, os semáforos
intermitentes a esquecer memórias, os sinais de proibição a decidir
para que lado tenho de ir, os cães à espera de um dono, os chulos
a falar de literatura, as casas valentemente arquitectadas a
esganarem-se umas às outras,
os jardins onde os homens libertam cheiros dos sovacos.
Também me cansa o ar,
o sol a mostrar quem manda, as estrelas de aluminio,
o azul que cá para mim nem sabe ser claro nem escuro,
as nuvens carregadas de revolta e há quem diga que é de chuva,
o deus lá mais em cima, muito lá em cima,
a imprimir livros de banda desenhada, a festejar os seus milhões de anos,
os anjos mudos, o vento mortinho por se revelar, os relâmpagos a fazer dos homens tão pequeninos.
Cansa tudo isto, sempre esta dor revestida de veludo,
as manhãs,
as tardes e as noites a disputarem o dia, os relógios de pulso
a quererem ser donos do tempo, a dona Maria à janela
a perguntar se esta semana escrevi para o jornal,
e sobre quê,
as crianças que chutam a bola sem direcção, as árvores tristes
por não conseguirem vergar a espinha,
os gatos de língua presa no novelo, as mãos sem pulso
o senhor Dantas a dizer que se não fosse o destino
daria um bom guarda-redes, o cardeal que quando se lembra
põe-se a cantar à varanda. O amor escondido no colo de um filho da mãe.
Cansa-me perguntar onde dormem os pássaros,
elaborar sonetos para atingir o amor, acender um cigarro já aceso,
lembrar a vida, esquecer a morte,
lembrar a morte, esquecer a vida, passar a ferro os poemas amarrotados,
enlouquecer por uma ninharia, cansa dizer caramba,
mais aquela dor exótica do romancista, meditar sobre a palavra palavra,
perdoar a masculinidade da solidão, entrar em guerra para sair em paz.
Cansa-me pensar que amanhã voltarei a pensar em tudo isto,
no mar,
na terra,
no céu da minha boca, na minha idade à beira rio,
no sol que me aleijou, na carga que tive de deitar borda fora do silêncio.
Por bem existe um poema de tempo interminável,
versos de muletas à espera de ficarem curados,
sonhos na manga que um deus não soube bem costurar,
pedaços de nada e fartura, rimas por rimar, a loucura sem tratante,
cores,
música,
vinhas simbólicas que o poeta transformará em pétalas,
água, mistério, ruínas,
comboios por cima das cabeças,
ilusões retalhadas a canivete,
lume, pedra,
sombra na sombra,
flor, grito, coração recheado com baunilha,
gaveta, e tudo o que a verdade mentir,
tudo isto é preciso para a vida inteira,
para a morte incompleta,
a saber que o Ser é muitas coisas,
tantas outras que até o gato comeu, já que, depois da festa,
só a poesia salva!
“A luz que vem das pedras, do íntimo da pedra,
tu a colhes, mulher, a distribuis
tão generosa e à janela do mundo.
O sal do mar percorre a tua língua,
não são de mais em ti as coisas mais.
Melhor que tudo, o voo dos insectos,
o ritmo nocturno do girar dos bichos,
a chave do momento em que começa o canto
da ave ou da cigarra.
A mão que tal comanda no mesmo gesto fere
a corda do que em ti faz acordar,
os olhos densos de cada dia um só.
Quem está salvando nesta respiração
boca a boca real com o universo? “
Pedro Tamen, A Luz que Vem das Pedras
O que é para mim a Poesia
Vi um anjo na pedra e lutei com ela até o libertar.
Michelangelo
I know nothing in the world
that has as much power as a word.
Sometimes I write one, and I
look at it, until it begins to shine.
Emily Dickinson
Estes dois, o poeta da pedra e a poetisa da palavra, conseguem expressar o mais profundo significado que a poesia tem para mim. Imaginemos que as palavras são como pedrinhas. O não-poeta, o que se julga poeta, mas não o é, pega nas pedrinhas e junta-as, chamando a esse conjunto um poema. O poeta não. O poeta respeita as palavras, respeita as pedrinhas, como Michelangelo respeitava as pedras. Cada palavra tem em si um anjo aprisionado. Não basta juntar palavras bonitas e amontoá-las. O poeta sabe o lugar de cada uma em relação a todas as outras. Todas as palavras têm um anjo e são igualmente importantes, mas o anjo só é libertado pela sinergia entre elas, pela colocação de cada uma delas no lugar certo. Então, o poeta, junta as palavras, como pedras e sabe quais as palavras que ligam umas com as outras, quais as que pertencem a outro poema e guarda essas. Depois pega nas que sobraram e coloca-as no lugar certo umas em relação às outras e elas começam a emitir um ligeiro brilho. Mas não é o brilho da poesia. É o brilho do despertar da poesia. Há que guardar mais algumas palavras ou procurar uma que está escondida. E depois ainda há que baralhá-las de novo e respeitar a distância ou o amor entre elas. E polir o espaço entre elas e algumas palavras são como estrelas no céu, mas outras como laços de seda ou veludo da cor da noite, outras ainda como caules ou rios, umas pulsam, outras descansam. E começam a brilhar com a luz da poesia e o poeta apaixona-se por elas e é com esse amor que lhes dá o polimento final que liberta o anjo nelas. E só então temos um poema. E o conhecimento do poeta para fazer isto vem da sabedoria e verdade iniciais. De nenhum outro lugar. E é por esta razão que todo o poema, todo o poema verdadeiro, se inicia com um despertar. Não das palavras, mas do poeta.
sexta-feira, 28 de maio de 2010
CO(O)RTES
li uma vez - ia jurar que sim-
que na próspera Alemanha
na ubérrima Berlim
os gastos em água
e energia eléctrica de uma Fonte
monumental
eram suportados por mecenas
- Opel? Mercedes? Aspirina Bayer?
aqui
neste atlântico tapete ocidental
quem se preocupa
com semelhantes despesas marginais?
em pleno Verão
não poderia o país
ter menos meia-hora de iluminação pública à noite
e outra meia-hora ao amanhecer?
quantos milhões de euros
se economizavam assim diariamente?
prejudicava-se a empresa - a EDP - é certo
e os accionistas
baixava a cotação na Bolsa
e as compensações dos seus administradores
mas qual o sacrifício
para 10 milhões de portugueses?
não será estratégia
da velha licença de isqueiros
para proteger " A FOSFOREIRA" ?
quinta-feira, 27 de maio de 2010
campos de trigo
"Os campos de trigo continuam azuis a florescer pássaros
e acalentar o pão que aquece a alma
de quem ama e de quem não ama.
Os campos de trigo seguem embalando a lua
com uma sonata ao futuro sem fome.
Os campos de trigo esqueceram Van Gogh,
pois não há mais dor no homem.
É tudo realidade consentida.
Ninguém mais ergue sua obra para que o mundo
floresça em primaveras
que o artista não pode viver.
Nem mil girassóis de Van Gogh
vão calar a dor que assola
Nínive, Candahar, Bagdad,
o sertão, o chão desumano da Pátria,
Nigéria, Haiti, Etiópia…
Os campos de trigo não necessitam mais espantalhos.
O homem não necessita mais proteger o coração
para que o amor não o devore.
Pois o amor foi sepultado na última primavera.
Espantalho colorido
alardeando um campo-minado-coração,
varrido pelas máquinas da indiferença que regem
o sarcástico-mundo-cão.
Os campos de trigo, indiferentes,
seguem solares,
seguem em chama,
espalhando grãos,
dançando ao vento das almas ignaras."
Bárbara Lia
quarta-feira, 26 de maio de 2010
tanta gente a dizer-me
tanta gente a dizer-me: você devia ter um cão
-fazia-lhe companhia
sempre guardava o Monte
porque não mete aqui um casal de cabritos
-até há subsídios
além do mais tinha sempre leite natural
sabe que mais - eu acho que você está muito mal sózinho
uma doença súbita, trombose, um AVC
peça uma ligação directa à GNR
tanta gente a lamentar que eu tenha menos de mil euros de pensão
- isso é de soldado da Polícia, amanuense, portageiro
mulher-a-dias
mas você não se reformou como engenheiro?
olha, porque é que não tens aqui galinhas?
patos - com esta água toda, sem trabalho nenhum podias criar gansos
não terás batatas a mais e falta de cebolas? se fosse eu
tanta gente a dizer-me: que pena, porque não dás explicações
as traduções estão agora a ser bem pagas
faz-me pena, sabes
tanta gente a dizer-me
Dia 28, Agostinho da Silva e Fernando Pessoa em Paris
No dia 28, às 14.30, estarei no Centro Cultural Calouste Gulbenkian, 51, Avenue d'Iéna, em Paris, para apresentar o livro "Agostinho da Silva. Penseur, écrivain, éducateur", organizado por mim, José Costa Esteves e Idelette Muzart-Fonseca dos Santos. Contém a primeira antologia de textos de Agostinho traduzidos para francês. Às 16.30 falarei sobre Portugal, Brasil, o Atlântico e a Europa em Fernando Pessoa.
terça-feira, 25 de maio de 2010
Não se compreende os lugares afastados da casa. o sítio onde deixámos os chinelos e o miolo do pão. as silvas que nascem e cobrem janelas. sem poesia. dedos que riscam janelas de ténue olhar. despeja gavetas como se ninhos violasse. existir não é verbo reciclável - basta perguntar a uma pedra. fechou-se bem fechada a espaços náuticos incompreendidos. sacos de plásticos em vez da roupa de domingo. anda pela casa amarela. tocando-se nua. à mulher bateu-lhe sol no ventre. muito sol. colocou-se em posição fetal e pariu um filho silencioso. o sol virou costas ao baptismo e partiu
CRISE
-deficit/superavit
-liquidez
-insolvência
-inflação/deflação
-efeito multiplicador
-Keynes
-bancarrota
-OGE
-economia planificada
-crash
-liberalismo económico
-3ª.via
-Freedman
-Salazar
-juros
-crédito
sabes de tudo isto
eu sei
mas alguma vez te preocupaste
em saber a cor possível
dos sonhos
dos Flamingos?
segunda-feira, 24 de maio de 2010
jardim
domingo, 23 de maio de 2010
Poema destinado a haver domingo
Bastam-me as cinco pontas de uma estrela
E a cor dum navio em movimento
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.
Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio de cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.
Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.
Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o tecto da casa que me cobre
Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.
E a cor dum navio em movimento
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.
Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio de cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.
Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.
Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o tecto da casa que me cobre
Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.
Natália Correia. Poesia Completa. Publicações Dom Quixote. 1999
Ao Platero, sem ciladas, sem armadilhas
Um abraço fraterno, poeta!
sábado, 22 de maio de 2010
estória curta
a velhota tinha comprado
o seu gato de estimação na Loja de Animais
mal chegou a casa
ansiosa por ver o seu gatinho
retirou o papel estampado
que envolvia a gaiola do bichinho
tão lindo
pardo
com uns olhos brilhantes
mas as orelhas anormalmente grandes
"vou soltá-lo" - pensou
e abriu a porta da gaiola
e o seu gatinho
o mariola
disparou rua-fora
em correria louca
perseguido de perto
por todos os cães do quarteirão
ah! - exclamou a velhota
sem saber de facto
que na Loja de Animais
lhe tinham impingido
LEBRE por GATO
sexta-feira, 21 de maio de 2010
Especial Kate Bush
http://www.youtube.com/watch?v=ot3cVY1JESQ
http://www.youtube.com/watch?v=WChywYrwHBY&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=WChywYrwHBY&feature=related
quinta-feira, 20 de maio de 2010
Aprender a fazer contas
"O amor acrescenta-nos com o que amamos. O ódio diminui-nos. Se amares o universo, serás do tamanho dele. Mas quanto mais odiares, mais ficas apenas do teu. Porque odeias tanto? Compra uma tabuada. E aprende a fazer contas"
- Vergílio Ferreira, Pensar, Venda Nova, Bertrand, 1993, p.243.
- Vergílio Ferreira, Pensar, Venda Nova, Bertrand, 1993, p.243.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
ULTIMATUM
“Vós todos que tendes uma escola, que andaes sob a canga de uma orientação, que pertenceis a qualquer cousa que acabe em ISMO, que sois quaesquer entes que acabem em ISTAS! Para que o limite se para ser limitado basta existir?”
- Álvaro de Campos, Ultimatum, 1917.
- Álvaro de Campos, Ultimatum, 1917.
-a caminho da cidade-
“… Vem comigo! Vou mostrar-te
o caminho que leva à Cidade do Sonho...
De tão alta que está, vê-se de toda a parte,
Mas o íngreme trajecto é florido e risonho.
Vai por entre rosais, sinuoso e macio,
Como o caminho chão duma aldeia ao luar,
Todo branco a luzir numa noite de Estio,
Sob o intenso clamor dos ralos a cantar.
…
Vistos dessa eminência, o mundo e as suas
sombras,
Tingem-se no esplendor dum perpétuo arrebol,
O mais estéril chão atapeta-se de alfombras,
Não há nuvens no céu, nunca se põe o Sol.
Nela mora encantada a Ventura perfeita
Que no mundo jamais nos é dado sentir...
E a um beijo só colhido em seus lábios de Eleita,
A própria Dor começa a cantar e a sorrir!
Que importa o despertar? Esse instante divino,
como recordação indelével persiste,
E neste amargo exílio, através do destino,
Ventura sem pesar só na memória existe...”
António Feijó, A Cidade do Sonho
terça-feira, 18 de maio de 2010
Questões
Tudo o que a humanidade tem feito, ao longo de milénios de civilização, foi para ser feliz ou para deixar de ser infeliz. Porque o não conseguiu? E porque continua a fazer o mesmo, se assim o não consegue? O que é que isso nos diz sobre quem somos e o que fazemos?
segunda-feira, 17 de maio de 2010
domingo, 16 de maio de 2010
a minha vida
é um baralho de cartas
viciadas
mesmo quando jogo sózinho
contra mim
sinto-me mais seguro
a fazer batota
breve infinito urbano
Uma Visão Armilar do Mundo - Hoje, Domingo, 18.30, na Feira do Livro de Lisboa
Lá estarei hoje na Feira do Livro, a fingir que sou escritor e dou autógrafos... Um diálogo com Camões, Vieira, Pascoaes, Pessoa e Agostinho da Silva sobre o potencial universalista da cultura portuguesa, simbolizado na esfera armilar: a perfeição, plenitude e totalidade na interconexão de todos os seres e coisas, tradições e culturas, artes e saberes. Uma visão integral do mundo, sem cisões, exclusões ou parcialidades, que promova uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, abraçando a natureza, o homem e todos os seres sencientes. O novo paradigma.
Pavilhões da Babel (A01 - A04), 18.30, na parte de baixo da Feira)
sábado, 15 de maio de 2010
Miradouro
Se o pecado existisse eu teria pecado cegamente em busca do amor em cada pedaço de mim. Ah, se o castigo inventado fosse a eterna busca, eu teria vivido debaixo da pena máxima de encontrar em cada segundo, o amor que se adivinha e parte...
Nunca prometemos amor eterno, nem quando ele me levou a ver o miradouro atrás do prédio de esquina. Durante o caminho lia a vontade dos outros pintadas a vermelho:
“Amo Inês” ou “quem inventou o amor passou por aqui e se perdeu”
Nos outros dias em que passeei sozinha deixava que meu olhar se perdesse pelo horizonte. O muro que nos protegia da queda certa, desaparecia e eu sonhava que tudo era possível – bastava saber o que se queria. Fossem meus braços asas, fosse meu corpo imagem da minha vontade – matéria que se modela a cada sentir.
Fui a ave caçadora em cada viagem só para matar a fome de ti. Fui o eterno sopro fraco no regresso. Lembrança de ti.
Quando voltava para casa, meu cão fugia pela ladeira fora. Longe foi o tempo em que eu corria e gritava: “VOLTA!”
Noutros dias inventei o amor a três. Ele que ama ela, ela que ama ele, e eu que amo a ideia de amar alguém. Nesse amor trocámos as mãos. Odor intenso do sexo que se adivinhou e não aconteceu. Nesses dias eu sorria e lembrava-me de ti rindo da vida.
O cão volta sempre ao dono, mesmo que o cantinho onde mora seja sombrio. Se ele soubesse como fazer, gritaria:
“SALTA! Inventa o mar, mergulha nele essa fome nunca saciada.
SALTA! Navega até te perderes.
Depois VOLTA!
VOLTA, que a casa agora é branca e o teu sorriso violeta.”
Na minha rua, mesmo na esquina, existe um prédio. Nas traseiras dele um caminho para o miradouro.
Quem está enamorado senta-se num banco de pedra e espera que o sol fique laranja até dizer adeus.
Se hoje não chover subo ao miradouro.
E se eu te disser que o atlântico não é mais que um rio?
se te disser que as algas não são exclusivas do mar?
rir-te-ias com certeza da fauna que me cresce nos dedos.
do rumor da minha carne que sacia os pássaros daquele pinheiral.
não repares no meu estilo torto de andar.
foi provocado por um livro que li à nascença. não sei bem o que dizia.
talvez fosse tarde demais para aprender
se te disser que as algas não são exclusivas do mar?
rir-te-ias com certeza da fauna que me cresce nos dedos.
do rumor da minha carne que sacia os pássaros daquele pinheiral.
não repares no meu estilo torto de andar.
foi provocado por um livro que li à nascença. não sei bem o que dizia.
talvez fosse tarde demais para aprender
quinta-feira, 13 de maio de 2010
"(...) essa desconhecida / E ansiosa e breve coisa que é a vida"
- Jorge Luís Borges, "Texas", O Outro, o Mesmo.
Por que é que a cabeça do cão é maior que a de D. Sebastião?
O D. Sebastião histórico é claramente transfigurado num protagonista da loucura, da boa hybris ou desmesura, de todo o homem ou consciência que deseja a suma e insuperável "grandeza" do Despertar enquanto libertação da falsa realidade de todas as supostas condições e limites da existência no mundo. É a "certeza" dessa possibilidade que natural e necessariamente não cabe em si, pois haver um "si" é ser ou supor-se algo ou alguém no mundo, é ter uma dimensão e medida, é estar situado e logo limitado, submetido e determinado na cadeia e teia de causalidade da ordem universal. São essa loucura e essa "certeza" que afinal lhe testemunham, asseguram ou revelam a pertença ao incondicionado e assim o fazem sair de si e o ilimitam, levando-o a trespassar e transcender a (supostamente) própria condição humana e mortal, operando a transfiguração que lhe confere um outro modo de ser, actual e imortal, quenada tem a ver com o "ser que houve", tornando um cadáver jacente no "areal" de Alcácer-Quibir. O D. Sebastião a que Pessoa dá voz já não é a pessoa do rei histórico, desaparecido em Alcácer-Quibir em termos reais e simbólicos, mas antes a consciência desperta e imortal emergente do soçobro daquele ser humano mortal ou uma figura universal do homem/consciência que renasce da morte e se imortaliza.
Paulo Borges, in Uma Visão Armilar do Mundo
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Cultura ENTRE Culturas e Uma Visão Armilar do Mundo na Casa Bocage, Setúbal, dia 15, 21 h
Car@s amig@s ,
Gostaria de os convidar para participar na Noite dos Museus na Casa Bocage, já no próximo Sábado, 15 de Maio, às 21h00.
Para comemorar a Noite dos Museus, cujo tema deste ano é a «Harmonia Social», organizámos uma programação que dá ênfase à multiculturalidade e ao diálogo entre culturas:
Visitas acompanhadas aos espaços museológicos (Exposição «As Sete Musas de Bocage», Centro de Documentação Bocagiano e Arquivo Fotográfico Américo Ribeiro);
Apresentação da exposição de desenho e escultura «Conexões», por Rui Oliveira Lopes, com a presença do autor, João Lino;
Lançamento em Setúbal do número 1 da revista «cultura ENTRE culturas», pelo seu Director, Paulo Borges;
Canto livre e improvisado de Poesia de Bocage, por Patrícia Domingues;
Apresentação da obra «Uma Visão Armilar do Mundo - A Vocação Universal de Portugal em Luís de Camões, Padre António Vieira, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva», de Paulo Borges, por Bruno Ferro;
Fado à capela, por Pedro Paz;
Confraternização e partilha;
No Dia Internacional dos Museus, 18 de Maio, entre as 14h30 e as 17h30, João Lino estará presente na Casa Bocage, para conversar com os visitantes sobre o seu processo criativo na realização da exposição «Conexões».
Um abraço cordial,
Bruno Ferro
Casa Bocage | Divisão de Museus | CMS
Casa Bocage
Arquivo Fotográfico Américo Ribeiro
Rua Edmond Bartissol, 12
Tel.: 265 229 255
quarta-feira, 12 de maio de 2010
Uma Reflexão Pertinente!
[...] Pessoa pode permanecer ainda refém, como Agostinho da Silva, até certo ponto, de uma derradeira forma de messianismo nacionalista ou patriótico, ao afirmar Portugal como a única nação que tem como missão deixar de o ser para se converter no próprio universal... Este messianismo nacionalista-patriótico latente e reiterado na cultura portuguesa é algo que tem de ser crítica e rigorosamente ponderado, pois dá azo, na melhor hipótese, a toda a espécie de ingénuos erros de óptica e, na pior, que geralmente a acompanha, a todo o tipo de perversos aproveitamentos, manipulações e instrumentalizações político-ideológicas.
Paulo Borges, in Uma Visão Armilar do Mundo
Paulo Borges, in Uma Visão Armilar do Mundo
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Uma Visão Armilar do Mundo
Matthieu Ricard em Lisboa - dia 26 - 21 h - A não perder
Reservas/ Informações: 707 234 234
Locais de venda: Bilheteira da sala, Fnac, Ag. ABREU, Worten,
C. C. Dolce Vita, Megarede, El Corte Inglês(Lisboa e Gaia)
www.ticketline.sapo.pt
Preços de 15€ (Plateia) e 10€ (Estudantes)
Matthieu Ricard é um monge budista francês, fotógrafo e autor. Vive e trabalha no mosteiro Shechen Tennyi Dargyeling no Nepal, Himalaias, há quarenta anos.
Nascido em França em 1946, filho do conhecido filósofo francês Jean-François Revel, cresceu no seio das ideias e personalidades dos círculos intelectuais franceses. Viajou para a Índia em 1967.
Doutorado em genética molecular no Instituto Pasteur de Paris em 1972, decidiu abandonar a sua carreira científica e concentrar-se na prática do budismo tibetano. Estudou com Kangyur Rinpoche e alguns outros grandes mestres dessa tradição e tornou-se estudante próximo e auxiliar de Dilgo Khyentse Rinpoche, até ao seu falecimento em 1991. Desde então, tem dedicado a sua actividade à realização da visão de Dilgo Khyentse Rinpoche.
As fotografias de Matthieu Ricard de mestres espirituais, das paisagens e das pessoas dos Himalaias têm aparecido em inúmeros livros e revistas. Henri Cartier-Bresson disse do seu trabalho, ”a vida espiritual de Matthieu e a sua câmara são um só, donde brotam estas imagens, fugazes e eternas“.
Ele é o autor e fotógrafo de “Tibet, An Inner Journey” e “Monk Dancers of Tibet” e, em colaboração, os fotolivros “Buddhist Himalayas”, “Journey to Enlightenment” e recentemente “Motionless Journey: From a Hermitage in the Himalayas”. Matthieu Ricard é o tradutor de diversos textos budistas, incluindo “The Life of Shabkar”.
O diálogo com seu pai, Jean-François Revel, em “O Monge e o Filósofo”, foi um best-seller na Europa e foi traduzido para 21 idiomas, e “The Quantum and the Lotus” (em co-autoria com Trinh Xuan Thuan) reflectem o seu interesse de longa data pela Ciência e o Budismo.
No seu livro de 2003 “Plaidoyer pour le Bonheur” (publicado em Inglês em 2006, como “Happiness: A Guide to Developing Life’s Most Important Skill”) explora o significado e plenitude da felicidade e foi um grande best-seller em França.
Matthieu Ricard foi apelidado de “a pessoa mais feliz do mundo” pelos media depois de ser voluntário para um estudo realizado na Universidade de Wisconsin-Madison sobre a felicidade, posicionando-se significativamente acima da média obtida após os testes de centenas de outros voluntários.
Membro do conselho do “Mind and Life Institute”, que é dedicado a encontros e pesquisa em colaboração entre cientistas e estudiosos budistas e praticantes de meditação, as suas contribuições foram publicadas em “Destructive Emotions” (editado por Daniel Goleman) e noutros livros de ensaios. Matthieu Ricard está também profundamente envolvido na investigação sobre o efeito do treino da mente sobre o cérebro, nas Universidades de Wisconsin-Madison, Princeton e Berkeley.
Matthieu Ricard foi condecorado com título de Cavaleiro da “Ordre National du Mérite” pelo presidente francês François Mitterrand pelos seus projectos humanitários e pelos seus esforços para preservar o património cultural dos Himalaias.
Nos últimos anos tem dedicado os seus esforços e doa todos os proventos do seu trabalho em favor de trinta projectos humanitários na Ásia, que incluem a manutenção e construção de clínicas, escolas e orfanatos na região: www.karuna-shechen.org
Desde 1989, actua como intérprete de Francês para S. S. o Dalai Lama.
terça-feira, 11 de maio de 2010
BREVE REFLEXÃO SOBRE A VISITA DE SUA SANTIDADE O PAPA A Portugal
há muita gente que vai a Roma
e não consegue ver o PAPA
mas há muito mais ainda
quem veja o Papa
e não consiga
ir a ROMA
Escrevo-te com a ternura de uma criança ao nascer
com a mesma intensidade de um tronco a furar a terra
Escrevo-te porque estou de regresso
deixo para trás os silêncios apunhalados
assim como a escrivaninha que era meu leito preferido
Se diluíres as sete luas a guache e carvão
encontrarás meu cadastro em pequenos versos
sem que no poema se note uma mancha de sangue
Escrevo-te com um olho aberto e outro fechado
na esperança de inventar uma raça à prova de tristeza
trabalhando a terra
de onde emergirá a Primavera
tão lúcido quanto a loucura iluminada
Alcançar assim desse jeito uma braçada de estrelas
a aproximação dos nossos corpos esquecidos
que a seu tempo lhes darei o pão e o ensinamento das palavras
Por saber que Grande poema é a noite e o mar que me detém
escrevo-te
Ainda que o meu sangue esteja cego e gasto.
com a mesma intensidade de um tronco a furar a terra
Escrevo-te porque estou de regresso
deixo para trás os silêncios apunhalados
assim como a escrivaninha que era meu leito preferido
Se diluíres as sete luas a guache e carvão
encontrarás meu cadastro em pequenos versos
sem que no poema se note uma mancha de sangue
Escrevo-te com um olho aberto e outro fechado
na esperança de inventar uma raça à prova de tristeza
trabalhando a terra
de onde emergirá a Primavera
tão lúcido quanto a loucura iluminada
Alcançar assim desse jeito uma braçada de estrelas
a aproximação dos nossos corpos esquecidos
que a seu tempo lhes darei o pão e o ensinamento das palavras
Por saber que Grande poema é a noite e o mar que me detém
escrevo-te
Ainda que o meu sangue esteja cego e gasto.
segunda-feira, 10 de maio de 2010
Amanhã, dia 11, na RTP Notícias, entre as 10.30 e as 12.00
Estarei amanhã em directo, na RTP Notícias, aproximadamente entre as 10.30 e as 12.00, para comentar a chegada do Papa Bento XVI a Portugal, junto com o Padre Vítor Melícias.
Uma outra noção de educação e cultura
Educado e culto é o ser humano que, em todos os pensamentos, palavras e acções, não vise senão o bem e a felicidade de todos os seres sencientes, sem distinção de etnia, nação, língua, religião, estatuto social, sexo ou espécie. Educado e culto é o ser humano que viva para o bem de todos, não se privilegiando a si nem a parentes, amigos, compatriotas, falantes da mesma língua, membros da mesma religião, partido, empresa, clube ou espécie. Educar-se e cultivar-se é progredir cada vez mais neste sentido. Disto depende o presente e o futuro do mundo: o Despertar de uma consciência solidária universal.
arevistaentre.blogspot.com
arevistaentre.blogspot.com
"Não façais da Casa de meu Pai uma feira."
Estava próxima a Páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. Encontrou no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas nos seus postos. Então, fazendo um chicote de cordas, expulsou-os a todos do templo com as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas pelo chão e derrubou-lhes as mesas; e aos que vendiam pombas, disse-lhes: «Tirai isso daqui. Não façais da Casa de meu Pai uma feira.»
Mt 21, 12-16
Novas apresentações da Cultura ENTRE Culturas e de Uma Visão Armilar do Mundo, 3ª, 11, 18.30
UMA VISÃO ARMILAR DO MUNDO
APRESENTAÇÃO DO LIVRO
de Paulo Borges
11 de Maio (3ª) | 18h30
apresentação da obra por Risoleta Pinto Pedro
leitura de textos por Bruno Ferro e Luíza Dunas
CULTURA ENTRE CULTURAS
que diálogo entre culturas?
APRESENTAÇÃO DA REVISTA
por Paulo Borges
11 de Maio (3ª) | 19h
leitura de textos por Bruno Ferro e Luíza Dunas
Escola Superior de Medicina Tradicional Chinesa*
Palácio da Estefânia
Rua Dona Estefânia, 175
1000-134 Lisboa
(metro Saldanha)
domingo, 9 de maio de 2010
Acerca dos festejos...e das coincidências
O que dizer, quando grande parte do país festeja em histeria os muitos milhões ganhos por pouco mais de meia centena de pessoas... e grande parte deste país arruína, passa fome e esconde a miséria e pobreza de valores... é a apologia da corrupção e do roubo descarado. Fado, Futebol e... Fátima. Coincidências.
sábado, 8 de maio de 2010
Depoimento sobre os 5 anos do pontificado de Bento XVI, publicado hoje na Revista "Única", no "Expresso"
Como presidente da União Budista Portuguesa não me compete fazer juízos sobre o responsável supremo da Igreja Católica. Todavia, enquanto cidadão, direi que uma apreciação dos cinco anos do seu pontificado não pode omitir a Carta Aberta aos Bispos recentemente escrita pelo teólogo Hans Küng, espelho das questões com que se debate hoje a Igreja.
Sendo um dos maiores empenhos da União Budista Portuguesa o diálogo inter-religioso, conforme nos pediu S. S. o Dalai Lama, considero que as confissões e os responsáveis religiosos, em geral, dão ainda passos muito tímidos no sentido de um verdadeiro diálogo, que permita compreender, aceitar e respeitar o outro a partir da sua diferença, sem presumir possuir a verdade. Crentes e descrentes permanecem muito receosos de que o diálogo perturbe a segurança de crenças dogmáticas, não fundadas na experiência (não excluo o budismo e os budistas). Como defendia Agostinho da Silva, necessitamos de um diálogo onde todos participem: religiosos, agnósticos e ateus. Disso depende uma cultura da paz, compreensão e fraternidade e que as religiões sejam o que é suposto serem: diferentes medicamentos para diferentes males mentais e emocionais da humanidade e não modos de os agravar. Para isso têm de saber preservar a sabedoria que nelas é intemporal, adaptando-a todavia à mutação acelerada dos homens e do mundo. O que significa hoje transcenderem o antropocentrismo da nossa civilização, respeitando o equilíbrio ecológico e os direitos de todos os seres sencientes, humanos e não-humanos.
Esperemos que os religiosos se comportem religiosamente, sendo o primeiro exemplo do que propõem aos outros.
Sendo um dos maiores empenhos da União Budista Portuguesa o diálogo inter-religioso, conforme nos pediu S. S. o Dalai Lama, considero que as confissões e os responsáveis religiosos, em geral, dão ainda passos muito tímidos no sentido de um verdadeiro diálogo, que permita compreender, aceitar e respeitar o outro a partir da sua diferença, sem presumir possuir a verdade. Crentes e descrentes permanecem muito receosos de que o diálogo perturbe a segurança de crenças dogmáticas, não fundadas na experiência (não excluo o budismo e os budistas). Como defendia Agostinho da Silva, necessitamos de um diálogo onde todos participem: religiosos, agnósticos e ateus. Disso depende uma cultura da paz, compreensão e fraternidade e que as religiões sejam o que é suposto serem: diferentes medicamentos para diferentes males mentais e emocionais da humanidade e não modos de os agravar. Para isso têm de saber preservar a sabedoria que nelas é intemporal, adaptando-a todavia à mutação acelerada dos homens e do mundo. O que significa hoje transcenderem o antropocentrismo da nossa civilização, respeitando o equilíbrio ecológico e os direitos de todos os seres sencientes, humanos e não-humanos.
Esperemos que os religiosos se comportem religiosamente, sendo o primeiro exemplo do que propõem aos outros.
sexta-feira, 7 de maio de 2010
vossas mercês
sobre vossas mercês: a lutar pela vida dos bois: viu-os a todos. a lutar contra o fascismo no 1 de maio de setúbal (não os conheci), terão medo da polícia; ou não querem ofender os câes deles (vossos)?
saudações revolucionárias.
saudações revolucionárias.
Escolhas
Agostinho considera que todo o teatro grego, tragédia e comédia, provém da consciência deste conflito entre a natureza não-dual do homem e a sua orientação histórica, que marca as possibilidades e direcções opostas que coexistem no íntimo da espécie e de cada indivíduo: por um lado, o crescente desenvolvimento de uma civilização tecnocrática que dessacraliza o mundo, que o considera e aos seres vivos sua propriedade - para "usar, gozar e abusar" -, que instrumentaliza a vida para o único fim do sustento material e, privada do sentido do infinito e da totalidade, da contemplação e da adoração, da comunhão e da gratuidade, se encerra no círculo fechado do produzir para consumir e consumir para produzir; por outro lado, o impulso religioso para regressar à original inocência paradisíaca, ao sentimento da sacralidade do todo e à paz da indistinção entre "eu" e "outro", sujeito e objecto, o que Agostinho considera possível por um aprofundamento da experiência imanente do divino, culminando nessa "experiência mística" que, universal e trans-religiosamente, considera mostrar "que o auge do sentimento religioso consiste numa fusão entre objecto do culto e sujeito do culto, num transformar-se o amador na coisa amada, num aparecimento da unidade perfeita onde a dualidade existia".
- Paulo Borges, in Uma Visão Armilar do Mundo
- Paulo Borges, in Uma Visão Armilar do Mundo
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quinta-feira, 6 de maio de 2010
Viva a Vida plena!
Vimos como a religião grega era essencialmente uma religião de Alegria; os deuses amavam as festas e elas eram para o cidadão as solenidades de que toda a tristeza estava ausente; danças e cantos, grandes cortejos cheios de beleza, tempos claros e de vivo colorido, estátuas de rítmico corpo - tudo dizia o amor, a alegria de viver.
Mas viver de que modo? Apenas a vida comum, com os seus prazeres e suas dores, apenas a vida que dura umas dezenas de anos, a vida limitada e individual? De modo algum: o que dava ao grego esse sentimento extraodinário de Alegria era a compreensão de que a verdadeira vida é a Vida de toda a Natureza e de todos os indivíduos unidos nela e com ela; a Vida plena em que os homens e estrelas, planetas e deuses, terras e céus, palpitam no mesmo ritmo de Beleza e de Amor; Vida universal estendida a todas as coisas, à água das fontes que as Ninfas animam, aos fortes carvalhos que habitam as Dríades, às rochas escalvadas, domínio das Oréades; a Vida que embriagava Pã e os Sátiros e fazia que nas suas flautas reproduzissem o canto dos pinheirais - não por imitação, mas por uma íntima e profunda identidade de natureza. Era a consciência de se sentir irmão da terra e das ondas que dava ao grego a alegria jovem que sempre estava na sua alma.
- Agostinho da Silva, in A Religião Grega
Mas viver de que modo? Apenas a vida comum, com os seus prazeres e suas dores, apenas a vida que dura umas dezenas de anos, a vida limitada e individual? De modo algum: o que dava ao grego esse sentimento extraodinário de Alegria era a compreensão de que a verdadeira vida é a Vida de toda a Natureza e de todos os indivíduos unidos nela e com ela; a Vida plena em que os homens e estrelas, planetas e deuses, terras e céus, palpitam no mesmo ritmo de Beleza e de Amor; Vida universal estendida a todas as coisas, à água das fontes que as Ninfas animam, aos fortes carvalhos que habitam as Dríades, às rochas escalvadas, domínio das Oréades; a Vida que embriagava Pã e os Sátiros e fazia que nas suas flautas reproduzissem o canto dos pinheirais - não por imitação, mas por uma íntima e profunda identidade de natureza. Era a consciência de se sentir irmão da terra e das ondas que dava ao grego a alegria jovem que sempre estava na sua alma.
- Agostinho da Silva, in A Religião Grega
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O que é ser eu?
"O abismo é o muro que tenho / Ser eu não tem um tamanho" - Fernando Pessoa
"Conhece alguém as fronteiras à sua alma / Para poder dizer: eu sou eu?" - Fernando Pessoa
"Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar" - Bernardo Soares
"Conhece alguém as fronteiras à sua alma / Para poder dizer: eu sou eu?" - Fernando Pessoa
"Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar" - Bernardo Soares
Novas apresentações da Cultura ENTRE Culturas e de Uma Visão Armilar do Mundo
UMA VISÃO ARMILAR DO MUNDO
APRESENTAÇÃO DO LIVRO
de Paulo Borges
11 de Maio (3ª) | 18h30
apresentação da obra por Risoleta Pinto Pedro
leitura de textos por Bruno Ferro e Luíza Dunas
CULTURA ENTRE CULTURAS
que diálogo entre culturas?
APRESENTAÇÃO DA REVISTA
por Paulo Borges
11 de Maio (3ª) | 19h
leitura de textos por Bruno Ferro e Luíza Dunas
Escola Superior de Medicina Tradicional Chinesa*
Palácio da Estefânia
Rua Dona Estefânia, 175
1000-134 Lisboa
(metro Saldanha)
quarta-feira, 5 de maio de 2010
comentário a notícia sobre DÍVIDA DOS GREGOS
gregos estão os gregos
se calhar qualquer dia são os
próprios gregos
que dizem
:
vemo-nos portugueses
para pagar
as dívidas
Hoje, em Braga - Renascimento, Ressurreição ou nem uma coisa nem outra?
XXII Jornadas Teológicas
Faculdade de Teologia – Braga
[Entrada Livre]
Tema
«Ressurreição e Reincarnação-Renascimento»
Programa
Dia 5 de Maio (Quarta-feira)
21h00
–Mesa Redonda:
«E depois da morte? Diálogo entre Budismo e Cristianismo»
Prof. Doutor Paulo Alexandre Esteves Borges – Professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Presidente da União Budista Portuguesa.
Título: "Nem nascimento, nem morte, nem renascimento: vacuidade e bardo (entre-dois) na experiência budista"
Prof. Dr. Carlos Henrique do Carmo Silva – Professor de Filosofia da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa.
Título: «Anástasis – Ressurrectio, nem reincarnação mítica, nem renascimento espiritual»
Moderador: Prof. Doutor João Duque – Director-Adjunto da Faculdade de Teologia – Braga, da Universidade Católica Portuguesa
Dia 6 de Maio (Quinta-feira)
21h00
– Momento musical
– Coro Académico do Centro Regional de Braga da UCP
– Conferência –
«Abordagem contemporânea da Ressurreição em registo teológico»
Prof. Doutor Andrès Torres Queiruga – Professor da Universidade de Santiago de Compostela
Faculdade de Teologia – Braga
[Entrada Livre]
Tema
«Ressurreição e Reincarnação-Renascimento»
Programa
Dia 5 de Maio (Quarta-feira)
21h00
–Mesa Redonda:
«E depois da morte? Diálogo entre Budismo e Cristianismo»
Prof. Doutor Paulo Alexandre Esteves Borges – Professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Presidente da União Budista Portuguesa.
Título: "Nem nascimento, nem morte, nem renascimento: vacuidade e bardo (entre-dois) na experiência budista"
Prof. Dr. Carlos Henrique do Carmo Silva – Professor de Filosofia da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa.
Título: «Anástasis – Ressurrectio, nem reincarnação mítica, nem renascimento espiritual»
Moderador: Prof. Doutor João Duque – Director-Adjunto da Faculdade de Teologia – Braga, da Universidade Católica Portuguesa
Dia 6 de Maio (Quinta-feira)
21h00
– Momento musical
– Coro Académico do Centro Regional de Braga da UCP
– Conferência –
«Abordagem contemporânea da Ressurreição em registo teológico»
Prof. Doutor Andrès Torres Queiruga – Professor da Universidade de Santiago de Compostela
terça-feira, 4 de maio de 2010
"Rio-me"
[...] rio-me do estoico que usa um manto despedaçado e uma grande barba mal cuidada e vai à nona hora espreitar as damas amáveis do Foro; rio-me do pregador que não tolera a riqueza e vive num palácio, que desdenha a política e mergulha nas intrigas de Nero, que louva a paz dos campos e prefere o tumulto de Roma. E, ao contrário, darei lugar, entre os bustos domésticos, àquele Epicuro que defendeu o prazer (se defendeu o prazer), que amou a vida e desprezou os deuses, mas tão santamente procedeu e tão nobremente morreu nos seus jardins de Atenas; [...]
- Agostinho da Silva, in Glossas
- Agostinho da Silva, in Glossas
segunda-feira, 3 de maio de 2010
origem
Colóquio Internacional "Do diabólico ao simbólico: a filosofia de Vilém Flusser" - 3 e 4 de Maio
Colóquio Internacional "Do Diabólico ao Simbólico: A Filosofia de Vilém Flusser"
Anfiteatro IV, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Organização: Paulo Borges / Dirk Hennrich; Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa
Segunda-Feira, 3 de Maio
14:30 ABERTURA
15:00 - 15:30 Gustavo Bernardo Krause. - “MEU BEM, VOCÊ NÃO ENTENDEU NADA.” A DÚVIDA DE VILÉM FLUSSER.
15:30 – 16:00 Joaquim Domingues. - O MUNDO NOVO DA LÍNGUA - HOMENAGEM A VILÉM FLUSSER
16: 00 – 16:30 Jorge Leandro Rosa. - A RELAÇÃO COM O INARTICULÁVEL. LINGUAGEM, COMUNICAÇÃO E ONTOLOGIA EM VILÉM FLUSSER.
16:30 – 17:00 – Debate
17:00 – 17: 15 - Intervalo
17:15 – 17:45 José Bragança de Miranda. - A NOÇÃO DE APARATO EM VILÉM FLUSSER
17:45 – 18:15 Jorge Rivera. - SUPERFÍCIES, LINHAS, NÓS: AS OPERAÇÕES DA IMAGINAÇÃO E O PENSAMENTO DE VILÉM FLUSSER.
18:15 – 18:45 Louis Bec. - LE VAMPYROTEUTHIS INFERNALIS: UNE PREUVE D’AMITIÉ (PROJECTION, IMAGES ET VIDÉOS)
18:45 – 19:15 – Debate e encerramento.
Terça-Feira, 4 de Maio
Abertura
11:00 – 11:30 Rui Lopo. - A FILOSOFIA DA LINGUAGEM DE VILÉM FLUSSER
11:30 - 12:00 Dirk-Michael Hennrich. - A “COISA”, EM VILÉM FLUSSER E EUDORO DE SOUZA
12:00 - 12:30 Rodrigo Cunha - O DESIGN SEGUNDO VILÉM FLUSSER.
12:30 - 13:00 Rainer Guldin. - ACHERONTA MOVEBO: DO MEFISTOTÉLICO NA OBRA DE VILÉM FLUSSER
13:00 - 13:30 – Debate e Intervalo para almoço
15:00 – 15:30 – Jacinto Godinho. - O ESPECTADOR DE FLUSSER
15:30 – 16:00 - Paulo Borges. - O DIABÓLICO EM VILÉM FLUSSER
16:00 – 16:30 António Braz Teixeira. - O SAGRADO E A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA EM VILÉM FLUSSER
16:30 – 17:00 - Debate
17:00 – 17:15 – Intervalo
17:15 – 17:45 - Apresentação da revista Cultura ENTRE Culturas, com um inédito de Vilém Flusser. Encerramento.
18:30 Louis Bec – ARTAXONOMIQUE ET HYPOZOOLOGIE (na Livraria do Instituto Franco-Português)
domingo, 2 de maio de 2010
"o seu bem será o bem alheio"
A primeira condição para libertar os outros é libertar-se a si próprio; quem apareça manchado de superstição ou de fanatismo ou incapaz de de separar e distinguir ou dominado pelos sentimentos e impulsos, não o tomarei eu como guia do povo; antes de tudo uma clara inteligência, eternamente crítica, senhora do mundo e destruidora das esfinges; banirá do seu campo a histeria e a retórica; e substituirá a musa trágica por Platão e os geómetras.
Hei-de vê-lo depois despido de egoísmos, atento somente aos motivos gerais; o seu bem será o bem alheio; terá como inferior o que se deleita na alegria pessoal e não põe sobre tudo o serviço dos outros; à sua felicidade nada falta senão a felicidade de todos; esquecido de si, batalhará, enquanto lhe restar um alento, para destruir a ignorância e a miséria que impedem seus irmãos de percorrer a ampla estrada em que ele marcha.
- Agostinho da Silva, in Considerações
Hei-de vê-lo depois despido de egoísmos, atento somente aos motivos gerais; o seu bem será o bem alheio; terá como inferior o que se deleita na alegria pessoal e não põe sobre tudo o serviço dos outros; à sua felicidade nada falta senão a felicidade de todos; esquecido de si, batalhará, enquanto lhe restar um alento, para destruir a ignorância e a miséria que impedem seus irmãos de percorrer a ampla estrada em que ele marcha.
- Agostinho da Silva, in Considerações
sábado, 1 de maio de 2010
A vida é uma narrativa onde a única regra cumprida é que ela acaba. Não importa se a vírgula está desajustada, sequer interessa se o conteúdo é pobre. A vida acaba mesmo que o texto seja criança ou velho. A vida acaba em cada oração impressa. A vida acaba no fim do soneto. A vida acaba em cada rima perdida.
A vida reaparece no teu traço eterno antes que eu te leia o poema.
Doce sem medo a vida diz que é hora de atravessar o espaço, de finalizar o texto, de rimar com fim.
FIM
Deixo o passado adivinhar o gesto enquanto perco a memória do que fui quando parti de ti.
ah ! A vida agora sem verso acaba no FIM.
olha o desenho! lembras de ti outrora, presa no A4? Sem mãos à espera do milagre da ressurreição.
olha o desenho! lembras da dor que te invadiu o compasso e sequer um círculo soubeste cumprir?
esquece enquanto recordas.
a vida acabou.
já foste embora.
ADEUS
A vida reaparece no teu traço eterno antes que eu te leia o poema.
Doce sem medo a vida diz que é hora de atravessar o espaço, de finalizar o texto, de rimar com fim.
FIM
Deixo o passado adivinhar o gesto enquanto perco a memória do que fui quando parti de ti.
ah ! A vida agora sem verso acaba no FIM.
olha o desenho! lembras de ti outrora, presa no A4? Sem mãos à espera do milagre da ressurreição.
olha o desenho! lembras da dor que te invadiu o compasso e sequer um círculo soubeste cumprir?
esquece enquanto recordas.
a vida acabou.
já foste embora.
ADEUS
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