quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
"Todo o 'acto premeditado' ou todo o 'acto leviano' tem a sua guilhotina-própria." (António Maria Lisboa)
Não é impunemente que se escrevem coisas. O homem “pensa” ou “não pensa” – mas diz. […] Daqui nascem todos os enganos. Não o Verdadeiro Poeta que aprende por si o meio de ofender – imprimindo ou não, escrevendo romances, ensaios, panfletos ou não escrevendo nada. Este é um engano da sociedade no seu todo. Para se conseguir a liberdade há que negar os processos equacionais do meio, conquistar uma consciência completa dos seus vícios, taras, preconceitos de lugar. Engano de facto da sociedade que assim deixa fugir o melhor peixe das suas teias.
[…] É fácil ser subversivo – a palavra não custa… é um caso de hábito de audição. […] Subversivo, pois!, mas o que é de real é o engano de que se pode ser algo parecido com subversivo sem levar à consciência o meio onde se é, sem conhecer o que nele acontece e para o qual conhecimento, é necessário estar dentro.
[…] Todo o acto premeditado ou todo o acto leviano tem a sua guilhotina-própria.
António Maria Lisboa,
“Carta Aberta ao Snr Dr. Adolfo Casais Monteiro – Aviso a tempo por causa do tempo", in Poesia de António Maria Lisboa, Assírio e Alvim, Lisboa, 1977, págs 103 e segs.
[É de supor que não haja a isto comentários. É talvez até "melhor" que os nao haja: fica tudo, por si, silenciosamente mais estrondoso. Mas, mesmo que os haja (mesmo o não havê-los é, nesse sentido, havê-los muitos) serão a expressão chapada de quanto aqui, nestas palavras de AML e no resto, não tolera comentário. Porque, como ele mesmo diz noutro lugar: "Conhecem-se apenas estas duas maneiras de solução: ou tirar a dor à vida, ou tirar a vida à dor". É, por isso "aos actos-palavras e não às palavras que supõem actos, que me dirijo" ]
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3 comentários:
comentário breve - não para o poeta mas para quem com tanto entusiasmo o divulga
:
diz-me o lês, dir-te-ei quem és
abraço - Bom NATAL
(Não posso trazer as minhas palavras. Não me consinto trazê-las. Por mais que procure (e procurar é nunca encontrar) elas não saem para o mundo, para que as voe. Estão presas numa “gaiola” vazia. Sou como aquele que se teme a si mesmo, sem rumo para “obedecer” ou “governar”. O que posso fazer, depois da travessia do deserto que em mim mesma atravesso? Seja, como diz magistralmente Nietzsche: “Atrair-me a mim próprio… para mim.”, como o Solitário. Encontro nas de Nietzsche, aqui e agora, um sentido que não é o de um Perdão, mas vem de uma alma ajoelhada, perante a sua mesma armadilha “forçar-me a regressar de longe aos meus penates.” Seja talvez esta a explicação das rosas que florescem e morrem “sem porquê”.)
Declaração de Amor
(e o poeta cai na armadilha)
Ó maravilha! Voará ainda?
Sobe e as suas asas não se mexem?
Quem é então que o leva e faz subir?
Que fim tem ele, caminho ou rédea, agora?
Como a estrela e a eternidade
Vive nas alturas de que se afasta a vida,
Compassivo, mesmo para com a inveja...
E quem o vê subir sobe também alto.
Ó albatroz! Ó minha ave!
Um desejo eterno me empurra para os cimos
Pensei em ti e chorei.
Chorei mais e mais... Sim, eu amo-te!
Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"
(Um Feliz Natal, aos da "Serpente" e a todos os outros. A quem ofendi, a quem dei alegrias e tristezas, a quem gostou de mim, a quem me não amou; aos meus inimigos e aos meus amigos; aos que humilhei e aos que me ridicularizam, aos por mim foram humilhados; aos que me classificam ou desclassificam, aos que gritam e se agitam em vão; aos que nos olham com olhar quieto e manso e nos dão a Paz e aos que se agitam e rasgam dentro de nós o ventre do "animal" que somos e não queremos ser.)
A todos desejo um Novo Natal!
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