Um espaço para expressar, conhecer e reflectir as mais altas, fundas e amplas experiências e possibilidades humanas, onde os limites se convertem em limiares. Sofrimento, mal e morte, iniciação, poesia e revolução, sexo, erotismo e amor, transe, êxtase e loucura, espiritualidade, mística e transcendência. Tudo o que altera, transmuta e liberta. Tudo o que desencobre um Esplendor nas cinzas opacas da vida falsa.
quinta-feira, 31 de julho de 2008
O Presidente acabou de falar ao país
Não. Apenas uma questão burocrática, por mais importante que a seu nível seja, num discurso soletrado como um autómato e com a postura rígida de quem se comporta como se o fosse. Apenas o mesmo de sempre.
Tranquilizemo-nos. Portugal não acabou, o Quinto Império não foi instaurado e tudo está como antes. Podemos dormir descansados. O Presidente não teve uma crise de identidade e o povo pode continuar infeliz à vontade.
Uma paciência selvagem trouxe-me até aqui (Adrienne Rich)
Para quando a paz e o agir não agindo a que exorto!? Para quando ter juízo!? Para quando não perguntar mais para quando!?
Estarei felizmente quase sempre desligado da net durante o mês de Agosto e desejo-vos serenas inquietações, sábia loucura e doce e terno e amoroso e feliz Despertar!
Abraços
Paulo
Divagações
fio que se desenrola sem se conhecer princípio
meandros enrolam os dias e os confundem nas trevas.
Entre tempos retorna-se a esta praia ocidental
escuta-se o rumor das ondas em espuma desfeita abruptamente
como se do fundo dos tempos nos tentasse relembrar.
Teme-se, foge-se sempre de algo
passam rostos que não reconhecemos, vidas que esquecemos,
passamos por nós sem repararmos
Caminhamos como se algo faltasse, nas profundezas do ser
quanto tempo demorará a reencontrar?
Estranho sentimento de passar, de existir, efémera maré...
Contemplação.
Universo observa-nos anima de todos os seres,
espera por nós viajantes no sempre em busca de algo.
Só esta praia ocidental devolve a presença de tudo
fugazes sulcos no encrespado das águas derramadas no éter.
Ó civilização, cobiça, aqui não encontram lugar!
Tudo se consome em névoa onde já não se decifra a tinta.
Deste Cabo onde se avista o nada
nas falésias despenham-se trevas e refaz-se em apoteose a luz
E os sonhos serão ilusão?
Com os sonhos aprende-se a conhecer a alma e a reinventar o mundo
sem querer ou não querer, acesso ao poder do mais profundo
sem obstáculos, energia emergente de todas as fugas.
É além que tudo se mostra por dentro das máscaras
e o que se revela por amor nada anseia receber.
Amor fiel a si próprio sem renúncia à fonte geradora,
dócil vontade escapando à tirania que nos disciplina
para obedecer e cada vez mais reprimir o pulsar criador.
Carregamos fardos de tristeza,
olhemos a fera aprisionada
ora ruge incontrolável ora padece submissa sob o chicote
domador, de nós marionetas, iremos consentir?
Se escolhermos aniquilar os impulsos,
cruéis seremos e amordaçados,
sem a força dos sentidos débil é a razão.
As árvores oscilam ao sabor do vento
a seiva torna-as flexíveis e os ramos não quebram,
Amor é seiva da árvore que somos
quem o sente é forte, quem o seca morre.
Os homens separaram o corpo da alma, destruíram o Amor
e o mundo mergulhou na confusão
não o caos primordial, mas o caos surgido de conceitos
e preconceitos reprimindo o sensível, padronizando atitudes,
engrenagem social que afastou o humano da Natureza
separando-o de si-mesmo distorceu a percepção.
Talvez um “Guardador de rebanhos” cruze o nosso caminho
como aquele que despertou em Alberto Caeiro:
“Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar...”
Urge libertar o Amor aprisionado
da condição de objecto que se dá ou recebe.
Basta apenas amar sem posse e sem limites,
e não “perdidamente” como quis Florbela, antes
reencontradamente sem ilusão nem desilusão
haja quem se entregue liberto ao Amor
amando a liberdade do ser amado.
Ódio é prepotência que escraviza,
Amor pleno libertará a humanidade da escravidão.
De Agostinho o lema:
“A paixão que temos de pensar é o amor activo, o amor criador”.
O Silêncio da Montanha do Poeta
Que saudade cresce no lugar do céu e se abre em luz candente
No teu peito de arqueiro do céu? Esculpes na pedra o ouro, e na mente
És a paisagem crescente da montanha tocada de silêncio.
Que chuva de setas prateadas atira o arqueiro da festa do céu
Para a boca do poeta?! O arco do poeta é feito de água de lua
E a sua seta é um desejo vertical de espaço e da lonjura;
A sua imagem é um perfil de píncaros na solidão da montanha.
Para encontrar o poeta, é preciso subir à montanha verde,
Para acertar na cor o pintor renasce poeta; para pintar o céu
O poeta faz-se arqueiro do sonho, senhor da distância, mendigo do ar;
Eco de ser, voz do silêncio que lhe acerta no peito de pássaro
Recortado a negro na vastidão imensa da alma iluminada.
A onda e o mar, a mente e o corpo, viver é sur-far
Do mar se forma a onda, da mãe se forma o filho, do corpo se forma a mente, de que serve querer o Homem controlar o próprio corpo que o forma? De que vale a onda querer controlar o mar? O Homem que se pensa como onda perde-se do mar que é, reduzindo-se a uma ideia sem corpo, a uma onda sem mar.
O Homem esquece-se que não é só quando nasce que é formado pelo corpo da mãe, que continua vivo por estar sempre a ser formado pelo mar do seu corpo.
Agora percebo o meu desprezo quanto à actividade humana, não são mais do que ondas do mar, que ainda por cima se enganam a si mesmas como sendo algo mais do que o magno mar que as originou. O se-r-eno mar é o meu ser real, o horizonte que o une ao céu o meu único destino, ali onde o sol nasce rei, a ilha do sul onde veramente a cruz da vida floresce.
quarta-feira, 30 de julho de 2008
eu tenho um deus
Toda a gente
Desde sempre
Teve um Deus
Um Deus que tem uma casa própria onde morar
Mesquita Igreja Sinagoga
Um Templo
Eu tenho um deus menor
Que não se importa mesmo nada que o escreva com minúsculas
Sem casa, sem um tecto
Um sem-abrigo
Um cívico contudo
Que não passa por mim sem me cumprimentar
É baixote e magro
Com as calças remendadas nos joelhos
Barba por fazer
Não a longa e bem cuidada barba dos Deuses únicos
Dos que crêem
O meu deus não é nada mediático
Ninguém o pinta nas paredes ou em telas
Não vem nos calendários
Dos Conventos de religiosas
Dos Lares da terceira idade
Ou de qualquer sapateiro de Bairro
Sacrificado no interior de uma porta de madeira
Não me exige sacrifícios
Nem incensos
Nem a crueldade de caminhar descalço sobre espinhos
Nem colectas espúrias
Para fins quantas vezes duvidosos
É um deus camarada a que nada peço
Apenas agradeço
De manhã quando acordo porque acordo
À noite quando me deito
E adormeço
Vejo-o com frequência ao longo do meu dia
Ao trabalhar na horta
Ao passear no campo
Quando os pássaros indiferentes
Em vez de se assustarem
Cantam
Quando podo as roseiras
Ou planto os meus bolbos de tulipas
Ao mondar as ervas dos canteiros
Quando acendo o lume
E as chamas sobem tranquilas
Não me exige muito
Como eu lhe não exijo nada
Assim nos entendemos
-sem subordinações
Como bons camaradas
eu gosto do meu deus
-com quem faço
intermináveis caminhadas
Da utilidade do abandono que se deve realizar interior e exteriormente
As pessoas não necessitavam de reflectir tanto sobre o que deveriam fazer; elas deveriam, pelo contrário, reflectir sobre aquilo que elas são. Ora, se as pessoas e os seus modos fossem bons, então as suas obras poderiam refulgir limpidamente. Se tu fores justo, então as tuas obras também serão justas. Não se pode pensar a santidade com fundamento numa acção; deve-se, pelo contrário, fundamentar a santidade em um ser, pois as obras não nos santificam, senão que nós devemos santificar as obras. Por muito santas que as obras possam ser, elas não nos santificarão de modo algum, porquanto elas sejam obras, mas: tanto quanto nós formos santos e possuirmos ser, assim santificaremos todas as nossas obras, sejam elas comer, dormir, despertar ou seja o que for. Aqueles cujo ser não é grande, façam que obras fizerem, daí nada sairá. Reconhece, por conseguinte, que se deve empregar toda a determinação em ser bom, - e não tanto naquilo que se faz ou no modo de as coisas serem, senão em qual há-de ser o fundamento das obras" - Mestre Eckhart, Conversações Espirituais, 4, in Mestre Eckhart, O Abismo Eterno, antologia de tratados e sermões escolhidos por Paulo Borges e Jorge Telles de Menezes, prefácios de Paulo Borges e Jorge Telles de Menezes, tradução do alemão de Jorge Telles de Menezes, Lisboa, Mundos Paralelos, 2008 (no prelo).
As ideias i-nova-dora-s nascem de modo inconsciente
Heróis do Mar
Pensar sobre a realidade, querendo sobrepor-se aos acontecimentos que nela ocorrem, é querer que o ar formado crie a água que o antecedeu, que a filha-ideia gerada crie a mãe-sangue, forçando o ciclo para que este retroceda, o que nunca pode acontecer, apenas podendo se criar outros ciclos.
A sociedade racional estabelece ideias sobre a realidade que toma como sendo guias para vivê-la, invertendo-se, pois é o cérebro que assimila as ideias digeridas pelo corpo.
A humanidade é guiada por homens que fingem que as suas ideias são assimiladas para lá do sangue do seu corpo: pelo sangue da realidade. Assim, o que fazem é programar a conversão dos alimentos pelo corpo da realidade, digerindo ideias de modo paranormal, querendo concretizá-las finalmente a partir do corpo da realidade. Ainda dizem que não há Heróis!...
terça-feira, 29 de julho de 2008
sempre que vais à casa de banho pensas que estás grávida?
O meu professor de shiatsu diz que
as rebentações nas ondas das praias vão
embater cada vez sem mais resignação
contra camarins do favoritismo, contra os
modus-operandi estravagantes de arcebispos,
contra as trivialidades snobs dos deputados,
contra o agasalhado château dum leopardo
filistino en-vogue – paralítico napoleão rebaixando
reuniões sobre fisco infalível ou dumping social –
e contra as cúmplices matracas dos crachás.
Após as provações de permissividade inibidora
virá a papeira avant-garde desmantelar a perícia
das boulevards deflectoras da cidadania global,
com encorajamento de poliomielite dar-se-á a
subtóxica polinização ad aeternum dos opus dei
desbocados pelos ditames à palheta de sua cómoda
desvirtuada, atestando com grogue de formol a
anímica hor’agá, à escala, dos pilotos estroinas que
processam os componentes e calibram os reagentes
da carola de caruma e ComItivA de CompanhIA que
desapropria da ilibação tais enxovais com desacatos.
Virá uma contrasalva do Paleolítico Superior servir de
hélice propulsora para salvaguardar o Holismo Gaiense!
As treliças do alfarrobista são corroídas pelas zeigeist
entrópicas, cujo perfil vigora como ipomeia violacea
de restrição, que autofagiam as comissuras labiais dos
morpheus escapulindo-se da água-benta aspergida,
sem absentismo, deste eugénico gulag blutschande.
É mata perpétua abjurada como trégua, ex-pectante
fusível estampilhado pela mundivisão dos estratos,
âmbito de asneiras grassando munições em lavagem,
delgado tarrafal, gaspacho à beira do badagaio, elixir
de oxidase de monoamina, itinerante toro pré-helénico
de foro ontológico cujo rejuvenescimento é entravado
pela disritmia diapezam, warcraft e dungeons&dragons.
Quando a incisão coronária tolher a hipersemia
fac-simile do sôr-reverendo será rapsódia de ciano,
seu clíster onanístico será enema de morning glory e o
Outro Transcendente, esfarelado pelos torções, poderá
novamente ser quinino de ergotina, a bobina rústica
será destravada, do Minóico Tardio recomeçará um
narcótico Revivalismo Arcaico, o convénio de adidos
passará por umbral admonitório e fará melopeia com
Tanatos, eclodido num cacifo chamuscado de Gizé ou
Queóps e o Relâmpago de Indra efectuará os Mistérios
Elêusicos, isto disse-me a minha professora de reiki mix.
in quimicoterapia
2004
A Língua Portuguesa é o ar que deseja ser novamente mar
O Poeta de Chagall
Vê coisas em todo o lado
E às vezes parece bêbado
Mas está sentado no céu sem se desiquibrar
Só porque encontra a cada passo
Uma palavra para os olhos
O poeta parece perdido, mas apenas
segue o seu olhar
Enquanto a sementeira dos céus
semeia astros na sua boca.
O ser humano caminha ainda para ser humano
A educação que é dada ao ser humano ensina-lhe que respeitar os pensamentos estabelecidos pela sociedade é a conduta adequada e digna de quem é boa pessoa. Por isso, despreza as ideias que intimamente poderiam ser criadas, em prol da cega aceitação do que se encontra em vigor, não procurando escutar as próprias ideias, deixando de se cumprir como pleno ser humano: tal como Portugal relativamente ao mundo.
O Homem, ao relacionar-se, confunde afectos com ideias, assim, a oposição que acontece ao nível intelectual é levada para o nível sentimental, não se estabelecendo relações verdadeiras pela ausência de total liberdade de cada um ser o que é. Tudo devido ao Homem pensar-se como sendo as próprias ideias, não se dando conta que vive num corpo real e não numa ideia imaginada, que ele é o ser que pensa e não o que pensa o ser. Todos os conflitos humanos são resultado do ser humano ter deixado de viver no corpo e passado a viver na mente, de se ter tornado uma ideia de ser humano.
segunda-feira, 28 de julho de 2008
domingo, 27 de julho de 2008
Porque posso não ter tempo para mais
Durante um debate na Universidade de Nova York, o Sr. Ministro da Educação Cristovam Buarque foi questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazónia. Pergunta esta muito pertinente visto que o tema se encontra em debate no campo político Norte-Americano. A questão foi levantada por um estudante que prontamente pediu a resposta ao senhor Ministro na perspectiva de um Humanista e não de um Brasileiro.
Esta foi a resposta do Sr. Cristovam Buarque:
*” De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazónia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse património, ele é nosso.
Como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazónia, posso ima-ginar a sua internacionalização, como também a de tudo o mais que tem importância para a humanidade. Se a Amazónia, sob uma ética humanista, deve ser internacionalizada, interna-cionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro... O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazónia para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extracção de petróleo e subir ou não seu preço. Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazónia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono ou de um país. Queimar a Amazónia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais.
Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.”
**”Antes mesmo da Amazónia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo génio humano. Não se pode deixar esse patri-mónio cultural, como o património natural Amazónico, seja manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito tempo, um milionário japonês, decidiu
enterrar com ele, um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado. Durante este encontro, as Nações Unidas estão realizando o Fórum do Milénio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constran-gimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu acho que Nova York, como sede das Nações Uni-das, deve ser internacionalizada. Pelo menos Manhattan deveria pertencer a toda a humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria
pertencer ao mundo inteiro. Se os EUA querem internacionalizar a Amazónia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos também todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil. Nos seus debates, os actuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a ideia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança do Mundo tenha possibilidade de COMER e de ir à escola.
Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como património que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazónia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um património da
Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar, que morram quando deveriam viver. Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazónia seja nossa. Só nossa!”
Existem fortes indícios que levam a crer que este discurso terá sido, prontamente, censurado (como é usual no país mais democrático do Mundo). Aliás, no país onde a informação é “livre-mente” censurada.
Uma carta e dois poemas encontrados nos Jardins de Cupido
“As orquídeas de Outono e o levístico
Despontam em tufos ao pé da sala.
As suas folhas verdes e caules brancos
Lançam-me os seus perfumes em ondas.
Todo o homem, seguramente, tem o seu grande amor:
Por que está a deusa triste e só?
A orquídea de Outono, que esplendor!
Verde é a folha, violeta o caule.
A sala fervilha de belos rapazes
Mas de súbito para mim ela dirige o seu olhar:
Chegou sem uma palavra, partiu sem um adeus:
Um tornado é a sua montada, uma nuvem o seu pendão.
Que desgosto se compara ao de uma partida
Que felicidade à de um primeiro amor?
Vestida de lótus, cinta de basilisco
Ela chega de repente e num instante se vai.
À noite mora no firmamento.
Que esperais, Deusa, na berma de uma nuvem?
Pudesse eu convosco banhar-me no Lago Celeste
Secar numa encosta ao sol os vossos cabelos!
Espero a minha bem-amada mas ela não vem!
Ao vento desolado, canto em alta voz.
Sob um dossel de penas de pavão, com um estandarte de penas de pica-peixe
Ela sobe aos Nove-Céus, toma em mão os cometas.
Erguendo a sua longa espada para socorrer novos e velhos
Só a deusa será, para todos, justa.”
Qu Yuan (Séc. IV-III a. C.)
Cânticos Taoistas
“Maldito seja o saber e o estudo –
Meu espírito vagabundo do silêncio!
Maldito seja o saber e o estudo –
Meu espírito vagabundo do silêncio.
Se o procurarmos sempre
Nunca mais o acharemos.
Um regato para lançar a minha linha
E desfruto de todo um reino.
Cabelos despenteados, arrebato o meu cântico
Que os homens retomam nos quatro cantos do mundo.
Qual é o refrão?
- Meu espírito vagabundo do silêncio!
Um alaúde e um poema chegam para a minha felicidade.
Vaguear pela lonjura é um tesouro
Cheio do Caminho que percorro sozinho
Em direcção ao fim do saber e do eu.
Tranquilo e sem cuidados
Para quê procurar outrem?
Sou um habitante das montanhas mágicas
Que rejubila no pensamento e alimenta o seu espírito.”
Xi Kang (223-263)
Uma certa Princesa da Distância, perdida na bruma da sua janela de outrora, confessa a um guerreiro de outras eras, a um companheiro de fogo com quem bebeu chá no Pavilhão da Chuva:
nada mais somos do que vozes num poema. E, nada mais, é tanto. Nada mais podemos desejar do que esse ritmo de uma voz que lendo alto nos reúne onde apenas nos encontramos.
O poema. Mas só aí. De resto, na paisagem nos encontramos: vendo e pensando. Simbolizando o que já nasceu como sinal da outra parte perdida.
Com a voz cheia de silêncio e canto, compondo hinos, ela nada mais é do que uma vagabunda presença que errando procura o som, os sopros que a dissolvam. Até lá mora na poesia e alimenta-se do mel da tua. Envia-te esta de que falaram e que ela deixou inscrita no coração quando no teu pousou a sua mão.
Enlaça-te nos sopros e nunca a perderás. Não tentes, guerreiro amigo, prendê-la ao que ela não é e ao reino que abandonou.
Ela canta-te e afaga-te com as sombras mágicas das montanhas. Mesmo quando desce ao Mar ela logo sobe. Só na mais alta montanha está escondido o jardim de Diotima. Só na mais alta montanha moram os deuses e Hölderlin. Só lá chegam os eremitas como a Princesa da Distância. Foste tu que lhe deste refúgio nesse nome.
Lá, por ser distância, ela reúne na sua mesa os que com ela falam do amor e com todos cuida dos Jardins de Cupido. Todas as manhãs entreabre a porta e espera os que, sem a terem procurado a encontram, os que dela se tendo desencontrado, a reencontram. Porque ela vive nos Jardins da Memória.
Cantando poesia e lendo-a, mais facilmente farás o caminho de regresso. Mas não te apresses. Ela é quase tão lenta como o que não é do tempo. E gosta muito de ti.
sábado, 26 de julho de 2008
O pensamento Real é materno, o verdadeiro cér-ebro do ser humano é o útero
O útero é o cérebro-mãe através do qual o cérebro-filho nasce e toma existência, toda a criação do cérebro-filho depende da Mãe. O corpo do Homem representa a ligação ao útero materno - à eternidade. Assim, qualquer criação que ignore essa Aliança não chega a existir de modo verdadeiro, real. A humanidade guia-se apenas pelo cérebro-filho, por pensamentos que não chegaram a nascer, abortados*...
|*A Lei do Aborto apenas agora foi aprovada para as mães em Portugal, mas desde sempre os filhos o fazem.|
Poema para Eugénio
Mas morrem mais devagar do que nós.
A voz que foi a deles fica como uma baba, um cuspo,
Ou uma seiva que ainda anda a ser folha
Em qualquer parte,
Para além do bicho e da seda.
A morte dos poetas
É qualquer coisa que continua a ser árvore
Mesmo depois da raiz ou para além dela.
É uma forma que continua a ser corpo
Em qualquer espaço
Onde o vento se mova;
Onde haja musgo ou água
Ou fruto que se trinque
Para além do sabor e da semente,
Para além da boca que a morde
E continua sabor para além dela
Para além da mesma morte
A morte do poeta começa muito antes
Da noite e do dia da nossa mesma morte.
Agora morre o Eugénio
Amanhã haverá menos verde
Na relva que há amanhã.
A morte dos poetas é uma ficção nossa
Como a vida é uma ficção de poetas.
13-06-05
O que sou é a mãe, o que sei é meu filho
Eu sou o que sei, mas o que sei, por si, não me é. Ser é a Mãe, que está sempre presente, saber é o filho, que nasce constantemente, e que logo deixa de ser a Mãe assim que o faz. O ser humano apega-se ao filho como se ele continuasse a ser a Mãe, mas ele separa-se dela logo que aparece. A separação entre eles não indica que o filho não fosse verdadeiro, é apenas uma inevitabilidade, tendo em conta a natureza da sua relação.
O cérebro representa o ser embrião do nosso ser, dele nascem os nossos filhos-conhecimentos, somo-los todos, mas como todos eles estão condicionados ao tempo, nenhum deles preenche o nosso ser inteiro, eterno. O filho que nos poderá preencher todo o ser, terá de nascer da síntese de todos eles, de unir tudo, de nascer do sentimento de fusão do amor infinito, do saber que se sabe sem ser preciso saber, porque deixou de ser apenas um saber temporário do ser, tornou-se no próprio ser, na Mãe. O verdadeiro saber que a Mãe-Ser pode ter de si é dado pelo filho de Corpo Real, nascido do seu Cérebro Real: o Útero.
- Mas como? Como sabes?
- Não sei... mas também não nasci por saber-me. Sou, eu própria, o que digo, o que nasce de minha boca, pelo que também não posso sabê-lo.
Janelas
Cada manhã, o livro acrescenta uma página para voar
E o olhar é uma canção de vento para a pauta do esquecimento
Quando a cidade acorda, os olhos são janelas rasgadas
Letras entornadas na partitura do sonho, e as flores
São jarros de chorar para regar a alegria.
Chegam versos com o vento à cómoda alta do pensamento.
E o céu de Magritte tem nuvens desfeitas nas asas...
Vêm de longe os pássaros, na boca ficam saudades,
O gosto azul do mar, a voz dos búzios, o perfume dos dias
O vidro das imagens reflecte os versos que os pássaros debicam no lago
Água de letras para as flores do jarro.
Sacratíssima
sexta-feira, 25 de julho de 2008
Poetugal
O português é acusado de viver na cauda do mundo-fantasma europeu, sente-se fora de um mundo que não tem fora nem dentro, restando-lhe ficar triste por estar vivo num mundo que -ainda- não nasceu.
Ser o português o culpado de ainda existir num mundo dominado por idei-ot-as? Por certo que sim-to...
aceitação
A noite enrola os cabelos
Sob os dedos do sol.
O pasto dos anos ressequiu
A gota de luz que nos guiava.
Lembro-me dela:
Uma lua solar. Nenhum incógnito:
Por toda a terra as sombras com olhos
Lambiam pregadas essa noite
O eco dos rastos e dos rostos
Consumidos na distância.
Os mortos ressentidos chispavam
No aço fino da voz: tudo foi dado,
O nobre nascimento e o voo sempre inédito
Das cinzas no oceano sem telhados.
Só a quimera é possível... a cura é a loucura
"Mensagem": mente agita a matéria, o que Pessoa nos quer dizer é que mente e matéria são uma só. Viver guiando-nos pela mente isolada não é viver, é imaginar somente. A própria mente agita a matéria, mas não é pensando-a, porque isso é separar-se dela como sujeito independente, a própria mente É já a matéria: de Real há só o sentimento, pois é ele que as une.
O Povo Luso é cantado na "Mensagem", mas o nosso Rei vive adormecido nos poemas de Alberto Caeiro, na nossa Eterna Criança, é Ela que conhece desde sempre o Real sentido do nosso Ser, Português. O que o Rei nos pede é que vivamos a Realidade do Corpo da Alma, sem divisões: fundamo-nos no Mar da União de Tudo, só nEle nos reconheceremos, só Ele é infinito, como o Amor que somos. A saudade da Alma Lusa é a de estar unida à sua Origem: ao Corpo, pois só assim se sente, é, Vive.
O Poeta Alberto Caeiro pensa através do corpo, porque é esse o único modo possível de se pensar realmente! Apenas se propôs a definir o que pensa-sente para que o mundo entendesse que pensar é estar doente, mas que a doença mais grave ainda é o homem pensar-se saudável estando doente.
quinta-feira, 24 de julho de 2008
O Poema chamado Homem
O cérebro representa, simultaneamente, a separação entre os dois lados do coração e o prenúncio da sua união através do corpo de ligação entre cada hemisfério, sendo um orgão interno, liga-se à realidade interiormente. A confusão do homem é proveniente do facto de apenas poder relacionar-se de modo exterior com o mundo, esquecendo-se que o seu estimado cérebro é incapaz de funcionar dessa forma. A ligação ao exterior apenas pode ser feita a partir dos sentidos, eles sim, unem o interior ao exterior do corpo, a mente à realidade, isto é, TODO o pensamento nasce da loucura do sentimento, ou da maior loucura ainda: a de não haver sentimento.
O Homem define o silêncio chamando-lhe voz, concretiza a loucura -ou ausência de razão- chamando-lhe razão, revela o sentimento chamando-lhe pensamento, materializa o sonho chamando-lhe realidade.
O pensamento é um esboço da realidade, nada mais do que poesia: ser poeta é, portanto, o único modo de ser humano. Todo o Homem é poeta, cria palavras e encarna como seu próprio poema: os versos que lhe revelam o significado do que vive.
Nasci da concretização do Amor
e foi esse o único dom
que a vida me deu:
ser poeta à solta!
E como eu
o mundo inteiro,
mesmo que o ignorando...
A Língua Portuguesa é o Mar que une a Terra: a Aliança entre Homem e Deus
Esta Língua o que é afinal? Esta Voz que se confunde connosco, de que matéria é feita? De onde e como nasce? Como podemos crer tanto que exista e que a somos?
A nossa Voz é já a Voz de Deus, pois é ela que nos liga à morte e à vida, ao sonho e à realidade, ao ser e ao estar, à mente e ao corpo, a Deus e ao Homem, ao homem e à mulher. “No princípio era o Verbo”: a Língua, o i-Dio-ma. “A Pátria é a Língua Portuguesa” porque é ela a eterna Aliança da humanidade a Deus.
Cada palavra reproduzida pelo Homem é um reatar da Aliança: rezar, cantar, é a recriação da Origem do próprio Homem, pois é a partir da palavra que o Homem se cria. Cada vez que o Homem fala é, ele mesmo, Deus criador, as palavras são filhos nascidos da mente e do corpo.
Somos todos, portanto, Deuses esquecidos que o são, criamo-nos a partir da nossa Voz, essa, que nos liga tanto a Si quanto ao Si-lêncio, pois ela é tanto um quanto o Outro.
O Homem caminha para a União com a própria natureza de que é feito: o Verbo. Só o Homem que for capaz de ser Deus, isto é, criar-se através da união de e com tudo, de ler a vida, falar e viver aliando os antagónicos do Universo pertencerá à Nova Era, estará voc-acionado.
Não precisamos de erguer nenhuma religião nova, porque ela já existe desde o início: a Língua Portuguesa. Não precisamos de converter ninguém a falá-la, porque já todos a sabemos. Mesmo os que não a saibam têm a Sua Voz. Por isso, o que lhes-nos falta, é reconhecê-La como a Aliança da humanidade à sua própria divindade. Portugal é Deus porque é, desde sempre, Filho da sua Língua-Mãe, como o Homem é Filho do Seu Verbo, é divino.
(Parte do texto que sairá na próxima Nova Águia)
Terra
Da Terra das árvores,
Da Terra das flores,
Da Terra dos homens,
Da Terra dos animais,
Sou da mesma Terra que Tu
Da Terra das pedras altas,
Da Terra das cabeças duras,
Da Terra dos caminhos tortos,
Da Terra das janelas abertas,
Sou da mesma Terra que Tu
Fotos tiras algures pela Serra de Sintra*
Publicadas pela primeira vez no meu bolg pessoal e aqui reeditadas e partilhadas.
Há uma frase célebre que diz: "Nunca faças promessas que não possas cumprir".
Eis-me aqui a quebrar a promessa que fiz na primeira vez que aqui escrevi.
Prometi não voltar a repetir conteúdos...
Se não me puderem perdoar... espero, pelo menos, que gostem das fotos e da sequência que escolhi para a edição.
Enjoy :)
quarta-feira, 23 de julho de 2008
terça-feira, 22 de julho de 2008
SADISMO
Conheço-te, palerma:
Chamas-te anopheles
És indiscutivelmente feminina
Estás grávida
Se é que alguma vez se pode chamar grávida
A uma fêmea insecto
Alada
Com o aparelho reprodutor repleto
De ovos fecundados
Entendes o que eu digo
Vejo-te enchendo o ventre de sangue meu vermelho
- capilé estival
Que trasfegas das minhas pobres
Veias áridas
Para o teu bojo
Inchado como um odre
Podia até esmagar-te facilmente
Tão entretida estás em esvaziar-me
Não
Prefiro ver-te levantar em voo feliz
Sabendo que não tarda vais cair
Cheia de mim:
Irremediavelmente podre
Política, Ascese e Santidade
- Agostinho da Silva, "Política e Santidade", in As Aproximações (1960), in Textos e Ensaios Filosóficos. II, Lisboa, Âncora Editora, 1999, p.24.
Apenas acrescentaria que "ascese", neste contexto, quer dizer exercício constante da mente para superar os seus limites cognitivos e afectivos (tal como um atleta se treina para ultrapassar os seus limites físicos), que "oração" pode ser para alguns "meditação", que "homens" se pode dilatar a "todos os seres" e que "Deus" se pode traduzir por Infinito ou Natureza primordial. Sem esta ascese e este amor, creio que a política é o pior dos riscos, para si e para os outros. Mas, como diz Agostinho neste texto, é por isso mesmo que os ascetas, que buscam a santidade da não-dualidade, a ela se devem dedicar: não na esfera do confronto de grupos e partidos, mas no domínio mais amplo da sua transcensão e integração no serviço do Bem comum.
saudade tenho é da Mãe Natureza cuja canção de embalar o nosso DNA nunca esquecerá
publicado no número 19 de 2005 da Revista Utopia cuja numero 25 sai nesta 4ªfeira
“Nunca se trabalhou tanto como hoje. Por todo o mundo, dia a dia, hora a hora, minuto a minuto, milhões de individuos gastam todo o seu tempo a trabalhar ou a procurar trabalho. Mas a maioria dos individuos não são senhores do tempo e daquilo em que se ocupam; as necessidades a que estão condenados são criadas e fomentadas exclusivamente pelos lucros que as mercadorias oferecem àqueles que são donos do trabalho.
A sociedade da ordem e da norma está na iminência de realizar outro milagre: que o cidadão esteja simultaneamente no cume do entusiasmo e no cume da passividade!
Enquanto a actividade humana, escravizada ao trabalho, fôr um instrumento de tortura, ele há-de realizar-se segundo as regras da compulsão, da desigualdade e da hierarquia. E os governos, seja qual fôr o sua forma, reproduzirão o modelo autoritário e simbolizarão as relações de subordinação.
Para os moralistas, especialistas e donos do trabalho, este significa honra e alegria porque significa bons lucros; para os outros, é um exercício monótono, repulsivo e que nunca será bem pago. Não é o sal da vida, nem “uma acção inteligente do homem sobre a matéria que distinguiria o ser humano dos animais”. O trabalho revela-se uma manipulação robótica, uniforme, elementar, sem génio, sem vida; uma relação que provoca sofrimento, suplício e miséria!
Os trabalhadores que trabalham de modo consciente para perpetuar o mundo tal como ele é. Convencidos que o mundo não pode ser outra coisa senão luta e fadiga, não têm tempo para mais nada senão trabalhar, o que os leva a imporem as mesmas condições aos outros. Vivem em permanente competição e concorrência.
Para os trabalhadores que conseguiram coincidir a sua paixão com o seu trabalho o tempo não conta porque encontram prazer na fadiga, enquadrando-se com a maioria quando a situação o exige ou a moral o impõe.
Os trabalhadores contrariados, os mais numerosos, que acompanham sem interesse nem paixão uma tarefa repetitiva, aborrecida e desesperante, muitas vezes totalmente inutil e nociva, pertencem à categoria dos excluídos, individuos sem qualificações, desempregados ou precários.
Não é possível que a atitude de respeito pelo trabalho difundida no séc. XIX, continue a existir, uma vez que a relação com o trabalho foi radicalmente alterada, já não se trata de subsistência directa, as pessoas foram transformadas em seres dominados pelas suas próprias obrigações e tentações.
Os sindicatos que se dizem defender os direitos dos trabalhadores são parte integrante do processo de reprodução do capitalismo e dos sistema hierárquico, mesmo afirmando oposição como o cidadão comum de ideias “progressistas”, põem de lado a crítica radical pela necessidade de produzir. Estão limitados à luta pelo aumento de salários que se esvai mal aumenta o custo de vida. Convertidos em intermediários, os sindicatos passam o tempo em negociação de multiplos acordos com o Estado.
O trabalho, terreno falseado e pantanoso da actividade humana, é um fomentador de patologias.
Os bens comuns como a terra, a água, o ar, convertem-se em mercadorias onde impera a lei da escassez. Escandalosa monetarização da vida presente.
Nesta sociedade que tudo consome e tudo destrói o salário é droga dura por excelência!"
http://en.wikipedia.org/wiki/John_Zerzan
domingo, 20 de julho de 2008
Amor
Tapa-me os ouvidos: continuarei a ouvir-te,
mesmo sem pés chegarei a ti,
mesmo sem boca poderei invocar-te.
Decepa-me os braços: poderei abraçar-te
com o coração como se fosse a mão.
Arranca-me o coração: palpitarás no meu cérebro.
E se me incendiares o cérebro,
levar-te-ei ainda no meu sangue.
Rainer Maria Rilke
Isto é qualquer coisa de fabuloso!
Junto a este poema duas fotografias com duas linhas de palavras.
Numa espécie de sonho... ponho ao mesmo nível de sentir e de agir o micro e o macro.
O micro, aqui representado pela dualidade. O macro, pela multiplicidade...
O Amor pelo outro e o Amor pelos outros, o incondicional.
O eu e o todo. Ou o todo e a parte.
O princípio e o fim, e o caminho que vai do princípio ao fim.
Enjoy
:)
São precisos sempre dois.
Um para dar
Outro para receber.
Mas podemos ser sempre mais.
Mais a dar.
Mais a receber.
Fui Eu Que Vi
Fui eu que vi a gaivota que partiu, levando no bico o tempo que passa.
A gaivota voava e ninguém a alcançava.
Fui eu que vi a pomba branca a voar.
Trazia nas asas a esperança infinita
de um mortal que grita e se agita.
Nas suas asas brancas, a esperança caminhava e ninguém a apanhava.
Vi também o adormecer da borboleta colorida,
com asas de seda e de cetim,
da cor da alma que duvida,
da cor da dor e da alegria que há em mim.
Adormeceu, como que a sorrir, de tão pouco sonhar e nunca ganhar.
Fui eu que vi partir a escuridão,
contida numa nuvem de verão,
que deixou reinar a claridade circular.
Partiu e, com ela, fugiu a angústia e a raridade de ser e de não ser.
Vi sorrir a água e cantar a mágoa
do ar que respiro da paz de viver.
(Fui eu que vi)
Sereia*
Era dia 27 de Abril de 1997... quando escrevi este texto.
Não sei o que me deu para revelar aqui e hoje, uma parte da minha adolescência.
Sim, é um texto de adolescente que, obviamente, nunca foi publicado sob qualquer forma existente de publicar o que quer que seja.
Sempre gostei de poesia e achava que podia combinar palavras à minha maneira e chamar-lhes poemas...
Hoje estou 'práqui' virada :)
Melhores dias virão :)
Mais umas sábias palavras de Nikos Kazantzakis (Report to Greco)
As I looked at the simple Akákios, who was perspiring from too much food, the fire´s great warmth, and the memory of the frightening ascetic, I kept thinking what a rosy-cheeked Antonius he must have been painting all day, and I was possessed by a diabolical urge to say to him, Go and get to work, poor fellow, because right now you possess nothing. But I did not speak. A crust of lard, habi, and cowardice envelops the soul; no matter what it craves from the depths of its prisom, the lard, habit, and cowardice carry out something entirely different. I did not speak - from cowardice. (...)
I am less affraid of the major vices than of the minor virtues, because these are lovely faces and deceive us all too easily. For my part, I want to give the worst explanation: I say I did it from cowardice, because I want to shame my soul and keep it from doing the same thing again. (...)"
Giovanni Falcone e Paolo Borsellino
Desculpem o arcaísmo mas não sei mostrar links directos para o You Tube.
Fez este mês 16 anos desde o assassinato de Paolo Borsellino que, com Giovanni Falcone (assassinado, este, quase dois meses antes), como sabemos, constituiu uma dupla de desemplumados pensadores e fazedores contra uma importante forma de Mal. E de Mal também se tem falado muito neste blog nos últimos dias.
Julgo que merecem plenamente constar aqui, como referência e inspiração multímoda e estímulo actuante.
http://www.youtube.com/watch?v=8DBwd_1nRpQ
sábado, 19 de julho de 2008
The Greatest Silence: Rape in the Congo "o conflito com mais mortos desde a 2ª Guerra Mundial"
"O documentário com mais sucesso até agora continua a ser a Marcha dos Pinguins porque as pessoas gostam de coisas fofinhas e peludinhas, não gostam de coisas fofinhas e peludinhas
mortas."
sexta-feira, 18 de julho de 2008
Não sei bem o que significa
Julgo que é desenho
Mas não só desenho
“tout court” como diriam os franceses
Porque então seria desenho e nada mais
Desenhar uma árvore
Uma casa
Com chaminé e fumo e o sol
Como um ovo estrelado
Que qualquer criança desenharia nas primeiras classes
Será desenho ou será design?
Chama-se designer a quem faz design
Entre Salvador Dali
Picasso Rotko
Leonardo da Vinci
Onde os pintores e os designers?
Algum será uma ou outra coisa por excelência?
Julgo que design
É o desenho para ser usado:
O “a poesia é para se comer” de Natália Correia
Ou um retrato das searas de trigo
De José Manuel Rodrigues
O maior designer de sempre
Terá sido
O desenhador do universo
Que desenhou o Sol e o calor
E a fotossíntese
E as cores do arco-íris
E a Lua e Marte
- tão longe mas tão perto
E a Via Láctea
Como um enorme espanador perpétuo
E Andrómeda – você precisa de conhecer Andrómeda –
Um caracol de Pastelaria
Feito de milhões de estrelas
O maior designer de sempre
Terá sido
O desenhador do Universo
Que fez tudo tão infinitamente grande
Mas tão breve
Que bastam a contê-lo
Nove simples sílabas de um verso
O Estado da Nação
Hoje era o último dia de trabalhos antes das férias parlamentares, com uma agenda cheia de debates e votações sobre projectos de lei e petições. Às 10 horas, quando abriram os trabalhos, as bancadas teriam no máximo um terço dos deputados. À medida que os vários oradores, do governo e dos partidos, tomavam a palavra, aquilo a que se assistia era o seguinte: dos escassos presentes, ninguém parecia estar a ouvir absolutamente nada; uns levavam o portátil e mandavam mails, outros falavam ao telefone, uns conversavam em pequenos grupos, alguns de costas viradas para o orador, outros liam tranquilamente os jornais: diários, desportivos, etc. Apenas interrompiam estas actividades para aplaudirem maquinalmente o orador do seu partido, voltando depois ao mesmo.
Foi só por volta do meio-dia que o hemiciclo se começou a compor e só então chegaram as figuras mais relevantes e as caras mais conhecidas dos vários partidos, com ar descontraído, palmadinhas nas costas e sorrisos cúmplices para os seus correlegionários. Foi por essa altura que a petição relativa ao Tibete começou a ser discutida. Quando a deputada do PS começou a apresentar o relatório sobre a situação no Tibete, elaborado a partir das reuniões que o grupo parlamentar dos Negócios Estrangeiros manteve connosco, o ruído das conversas era tal que ela teve de parar por duas vezes e o próprio Presidente da Assembleia, Jaime Gama, de pedir silêncio aos "senhores deputados". Sem qualquer efeito. O ambiente era igual ou pior ao de uma turma das mais indisciplinadas do ensino primário ou secundário. Em abono da verdade, ressalve-se que só a bancada do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista mantinha relativamente maior silêncio e compostura.
Seria apenas hoje, por ser o último dia antes das férias? Não. Uma amiga que lá trabalha esclareceu que é sempre assim.
Após a apresentação das várias matérias em debate, nestas circunstâncias de total alheamento e desrespeito mútuo, ia-se seguir a votação. Levantei-me e vim-me embora. Estava elucidado e só pensava que, após dois mandatos de quatro anos nesta vida, saem de lá com belas reformas para sempre.
Estou esclarecido sobre o estado da nação, espelhado no seu Parlamento, que deveria ser-lhe exemplo. Só pergunto, a mim e a vocês, se são estes os nossos representantes, se são estes que queremos como representantes. É isto democracia, partidocracia ou mediocrecracia? E o que fazemos?
Um Modo de Ser, Um Modo de Arder
quinta-feira, 17 de julho de 2008
Estação das queimadas
Pontos Luminosos
Pontos Luminosos
No silêncio basta um sopro e todo o tempo estremece
como se afasta cantando mais para dentro
a própria noite
Guardei para ti relâmpagos inúteis
prata feita de medidas vagas
e inclinada superfície implacável
cordas e alçapões
Do ponto mais alto do céu a 56 milhões de quilómetros
um dia me dirás
«desde a idade do gelo nunca estivemos tão próximos»
José Tolentino Mendonça, A Estrada Branca
Há coisas mesmo bonitas de se lerem.
Por isso, partilho este amor de estrelas e de noite transcrito.
Fragmentos de Novalis
" Quando a chave de toda a criatura
seja mais do que número e figura,
e quando esses que beijam com os lábios,
e os cantores, sejam mais que os sábios,
e quando o mundo inteiro, intenso, vibre
devolvido ao viver da vida livre,
e quando a luz e sombra, sempre unidas,
celebrem núpcias íntimas, luzidas,
quando em lendas e líricas canções
escreverem a história das nações,
então, a palavra misteriosa
destruirá toda a essência mentirosa"
Novalis, Fragmentos de Novalis
(tradução de Mário Cesariny)
Shambhala - Por uma sociedade iluminada
Se estamos dispostos a lançar aí um olhar imparcial, veremos que, apesar de todos os nossos problemas e de toda a nossa confusão, apesar de todos os altos e baixos emocionais e psicológicos, há alguma coisa de intrinsecamente bom na nossa existência de seres humanos. A não ser que experimentemos este fundamento de bondade na nossa própria vida, não podemos pretender melhorar a vida dos outros. Se não somos senão seres miseráveis e infelizes, como poderíamos sequer imaginar uma sociedade iluminada e ainda mais realizá-la ?"
- Chögyam Trungpa, Shambhala - The Sacred Path of the Warrior (Shambhala - A Via Sagrada do Guerreiro)
Ouço pessoas no metro a falar sobre outras pessoas, a dizer que gostam muito delas e vão ter saudades. A dizer bem de outras pessoas, o que é raro. Nomeiam as pessoas pelo nome e são americanas e hippies. Eu não sinto nada disto por pessoas e é de alguma forma triste e seco. A bem dizer também não sinto nada destes sentimentos agarrativos e muito emocionantes por coisas que não pessoas. Ou seja, não sinto nada e já estou como o outro. O que sinto, para dizer que sinto alguma coisa, é medo de não sei o quê, de pessoas e de mais nada porque que é o mundo senão pessoas? Estão por todo o lado.
Se fosse para um sítio sem pessoas o que sentia era nada, ou uma simples pacificação sem nada de emocionante, um sentimento de estabilidade por saber que não ia acontecer nada senão aquilo: nada. Não havia olhares nem olhares meus sobre mim. Eu não sinto nada. O máximo que sinto nos últimos tempos são pacificações pontuais quando me encontro sozinha, nada de outras coisas que façam andar para a frente ou para outro sítio qualquer. A serenidade pontual faz-me ficar onde precisamente estou. Chamemos-lhe apatia. E agora vou trabalhar.
20/5/2007
terça-feira, 15 de julho de 2008
segunda-feira, 14 de julho de 2008
o quadro nunca acabado
Tudo que escrevi até hoje
foram asfixias infatigáveis d’agonia,
intenções inconscientes para um segundo eu ler,
anomalias abjectas a tornar realidade já amanhã
com direito a promessa desconcertante
e cruel auto-desonra em seguida.
Mas, com estes livros que aqui nascem
toda a voracidade à tangente será recusada
e, do útero do caos, emergirá recompensa...
Repudio o óbvio massificado e creio
na individualidade universal capaz de
nunca se cansar de viver lamentos e palpites
que inflamarão o brilho de cada falésia,
como cócegas num cadáver idêntico
que, ao mínimo contacto, acolherá o impalpável
sem receios do nosso interior absurdo.
Os facilitismos da fala são substimados,
cegam a participação à imposição imediata
de cada confissão registada no auto dos olhos
poder assumir e sugerir achaques tão díspares nas
imperceptibilidades onde intenções são sentenciadas
e grupos espessos finalmente deformados...
Tanta sílaba já vi deambular no secretismo
da tentativa suposta relegada para outro erro,
porque fúria é fracasso que colapsará
se te agarrares ao vexame da própria sarna;
desliga a mentira e abraça a integridade
quando sentires a sugestão constante
irradiar-se com calafrios compreensivos,
arremessa-te como aperitivo no
espeto da cobra dorsal do licor ritual.
2004