O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


sábado, 26 de setembro de 2009

crónica de escárnio - obviamente escarnecedora


Em período de reflexão, à boca das urnas já se lhe cheira o hálito pestilento. É o que dá empanturrar as urnas de voto com tanta junk food, o corpo político já nem se alimenta de comida requentada, mas de lavagem para os porcos, o que interessa é cevar o animal para que os indigentes da vida pública tenham o que enfardar.
Já se preparam os traseiros para a dança das cadeiras, há olhos gulosos à espera dum lugarzinho à mesa farta do orçamento, nem que seja num departamento obscuro dum ministério sem prestígio – imaginemos um aspirante a qualquer coisa colocado na chefia dum departamento do ministério da cultura, ou da agricultura, tudo acabado em ‘ura’, como aguentará ele, ou ela, a usura do cargo? Mesmo para se ser testa de ferro tem que se ter testa.
É a política porcalhota, a política da falta de palavra, do compadrio disfarçado com azedumes virginais contra a conspiração dos media, a política do xico-espertismo, da cunha, da procura de habilitações de papel para fazer ver na feira das vaidades, a política do faz-de-conta para se endireitarem as contas eleitorais.
Fica desta misérrima campanha eleitoral a transformação da arena política (cuidado, eu sou contra as touradas) no palco duma (má, péssima, paupérrima) revista à portuguesa, onde a charada e a chalaça subiram muitos degraus em relação à luta por ideias, por ideais, ou, simplesmente, pelo poder. O poder perdeu a energia pulsional capaz de alimentar a libido dos agentes políticos. Trata-se duma trupe de castrati à procura de maestro que a conduza à ribalta. Já se sabe que o inquilino de Belém, tão apavorado com escutas, é, paradoxalmente, duro de ouvido. Diz-se que certa personagem desta comédia de ladrar aos céus, desde que recebeu uma versão dos Lusíadas em cd/rom deixou de ter que se preocupar com a questão cabalística do número de cantos, com a redondez do formato, os cantos foram para escanteio, como dizem os nossos irmãos brasileiros.
Isto é o que, de verdadeiramente sério, fica desta campanha: o poder mediático resulta ainda mais exacerbado, com a abdicação dos líderes (ou títeres?) partidários a prestarem vassalagem à inteligência dos gatos fedorentos. O Gato Fedorento é mais importante que o telejornal da Manuela Moura Guedes, pelo menos mete mais medo e está mais seguro – tem a seu favor a força das audiências (é de notar que o discurso político não deve ter audiência, mas auditório, e a opinião pública passa, neste contexto, a público deboche) e o complexo do rei vai nu – a figura pública que mostrar desagrado, ou falta de humor, passa por estulta e poderá ver-se despida da farpela mediática, uma capa translúcida, sem peso nem consistência, feita dum tecido tão diáfano que nem na mais remota Samarcanda se pode encontrar. Bem, passemos adiante que só de imaginar as pendurezas de certas personagens postas ao léu…
Mas este poder mediático não está já na mão dos jornalistas. A classe dos jornalistas está a transformar-se noutra coisa. Deve o leitor lembrar-se que o aparecimento dos hipermercados deu cabo da profissão de caixeiro-viajante. Quem é que salva a nobre profissão dos almocreves? Ó Almocreve resistente, esta política da meninez que se recusa a crescer por não saber por que extremidade botar rebento, espera por ti.
Ora, ontem as sondagens (de que não se pode falar hoje) davam a vitória à tropa fandanga que desgovernou o país nesta legislatura que, como tudo o que é verdadeiramente podre, tarda em acabar. É verdade que a ‘alternativa’ é uma liderança submetida a um rápido processo de desmumificação, por mais que os estucadores de serviço se tenham esforçado, há marcas de rigidez cadavérica que são indisfarçáveis. O que nos resta? É óbvio que no dia de reflexão não vou fazer nenhum apelo ao voto. Pessoalmente, mais uma vez, gostei de Jerónimo de Sousa, não consta que tenha PPR e não anda a armar aos cucos. Sonho com uma sociedade em que a verdadeira habilitação do ser humano seja a sua boa vontade e o seu desejo de contribuir para a eliminação do sofrimento. E a sua vontade de aprender, porque quem não deseja aprender, quem não tem a humildade de se sentir aprendiz, é seta que falho o alvo (desculpem-me a metáfora bélica), pode ser muito capaz, mas tornou-se, verdadeiramente, incapaz de si, incapaz de ser humano.
É o reino anómico dos espantalhos. Não é esse o meu sonho para o futuro dos meus: sonho com a dose certa de nada que lhes permita ser tudo. Temos é que limpar a tralha.
Quanto ao ministério da educação, sejam quais forem os próximos inquilinos, aquilo vai demorar a desinfestar. Mas a dose certa de creolina e a desparasitação das manjedouras é capaz de ser suficiente. É preciso que o ar se torne respirável, pelo menos dentro das escolas. Com o advento dos Directores há muitos espinhaços que já estão a consumir doses industriais de Voltaren. E há professores titulares com medo de perder a titularidade. Eu acho que, a seguir-se este rumo, a sede do ministério deve mudar para o Júlio de Matos e os servidores da coisa devem andar com a farda com que se tenta segregar os loucos.
E para contribuir para o enriquecimento curricular dos nossos alunos, deixo aqui uma sugestão, bem ao nível do que se tem feito na educação nestes últimos anos (serão derradeiros?):

10 comentários:

Luiz Pires dos Reys disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Paulo Feitais disse...

Nos meus posts só aceito ataques pessoais à minha pessoa.
Quaisquer outros serão apagados sem contemplações.
Pessoalmente estou farto de porcaria.
É uma coisa minha.
:)

João de Castro Nunes disse...

Se, para comentar, não quer utilizar o seu, sr. Paulo Feitais, tem o meu post à sua disposição. JCN

João de Castro Nunes disse...

Tardiamente... removida, sr. Paulo Feitais! Tardiamente! JCN

Luiz Pires dos Reys disse...

Para que se saiba: fui eu que apaguei o meu próprio comentário.
Obrigado, Paulo Feitais.
E bom dia.

João de Castro Nunes disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
João de Castro Nunes disse...

Sr. Paulo Feitais: começo a ver uma luz... ao fundo do túnel! Afinal, quem foi o autor do... "apagão"?!... JCN

Luiz Pires dos Reys disse...

A quem queira saber: sei sentir quando esteja a mais ou, ao menos, quando não esteja a menos.

Coisa que a nem todos é dado saber saber (sic).

Bom dia, Paulo Feitais.

Paulo Feitais disse...

Bom dia, caro Damien!
E peço desculpa: andei um tempo danado a devassar as opções do blogger e não consegui descobrir como se activa o mosquiteiro.
E é um privilégio tê-lo por aqui.
E um excelente dia de eleições! O sol está sorridente e isso é bom!
Abraço!

:)

João de Castro Nunes disse...

Ora aí está uma bela saída! Só que continuo sem saber... quem foi o autor do "apagão"! Democraticamente... tenho direito a sabê-lo. Questáo de... pundonor. De parte a parte. JCN