O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Aos nervosos

Trinta três ou trinta e quatro são as vértebras do amor

Desde o cóccix
até ao atlas
vértebra incompleta mas mais elevada

percorro
o canal sagrado em todo o comprimento
e sopro pelos teus nervos
das trinta e três ou trinta e quatro vértebras do amor.

Um caminho por entre as apófises transversais
espinhosas
mas articuladas

Em que busco
a medula da tua alma
sem tropeçar e cair
nos buracos vertebrais

procurando
as áreas sensíveis
dos teus nervos
raquidianos,

a sua disposição metamérica
nos entrecruzamentos
dos músculos vizinhos

pelas extremidades
esperando sempre
não te
enervar.




Joana in Tratado da Alma Separada, 2004 (inédito, mas a querer sair da gaveta)

2 comentários:

platero disse...

gostei muito. Não como críitico - como apreciador
gostava de ter sido eu a escrevê-lo.
Invejei-o

Joana Serrado disse...

obrigada Platero. É bom ser invejada na passiva (eu que sinto tanto na activa). Mas há tantas vértebras, tantas espinhas, tantos seres vertebrados e invertebrados- tenho a certeza que o Platero enervará, arrepiará quando quiser