O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


segunda-feira, 30 de agosto de 2010

matinário

EXPLICAÇÃO DO BLOG


blog é uma coisa que existe

e ao mesmo tempo não existe


mas que hoje

quase toda a gente tem


como nos anos 20

os homens bigode

e as mulheres chapéu


ou melhor

:

vice-versa


blog é uma coisa

para a gente escrever


como um caderno

-só que sem linhas

nem folhas

nem capa

portanto sem papel


um caderno sem papel


não tem princípio

nem tem fim


escrevemos nele como se escrevêssemos no ar


quando apagamos aquilo que escrevemos

as palavras ficam a pairar

como nuvens ou raios de sol

-consoante a natureza das ideias

contidas nas palavras

que acabámos de apagar


a ciência garante

que a poluição deste exercício

é muito superior ao CO2

da combustão

de todos os motores do mundo


não admira

:

ainda ontem

um conhecido advogado

escrevia no seu Blog

:

a minha constituinte é incapaz

de pegar um euro

que não seja legalmente seu


apagar - enviar para o éter

semelhante afirmação

é produzir

mais metano ou dióxido de carbono

do que uma manada de vacas a pastar

ou uma velha bomba russa

a bombar água

de uma mina de carvão


o Blog é um caderno

sem princípio nem fim - já o sabemos -

que não se compra

nas livrarias

nem nas capelistas de esquina


não tem linhas

nem folhas

-parece que de borla, repetimos-

uma dádiva dos céus

como agora os figos

ou para o mês que vem as uvas


nada mais errado

:

este caderno

sem a capa com um círculo azul

em que navega

uma caravela dos descobrimentos portugueses

este caderno - dizia -

tem um preço


nem baixo

por sinal


pago ao longo dos dias

das semanas

dos meses

dos anos

escreva-se ou não

no que deviam ser as linhas

-que não tem


só duas ou três livrarias

em cada país

vendem esta espécie de cadernos


em Portugal

uma das principais

vendeu agora uma das lojas no Brasil

quase pelo valor

da dívida externa do país


é isto um Blog

e eu tenho um

bem como agora sete gatos

e um mercêdes benz

do tempo ainda

da Alemanha dividia


tenho um Blog e escrevo nele

como se lápis e papel

fossem reais

e eu escrevesse ali

o melhor e o pior

da minha vida


4 comentários:

Anaedera disse...

Olá,
sete gatos?
ou sete vidas?!
Bj

platero disse...

ora viva, senhora

sete gatos X sete vidas
se assim fora
49 teria

nada mau
s

Isabel Santiago disse...

Este texto matou muitas saudades. Tem tanta verdade que me enternece, me comove, me aquece como a proximidade de um gato. Um sorriso de muitas saudades.

platero disse...

beijinho, Isabel

bom saber que aquilo que fazemos
(uma açorda ou um poema)pode acordar sentimentos em alguém