O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quinta-feira, 27 de maio de 2010

campos de trigo





"Os campos de trigo continuam azuis a florescer pássaros
e acalentar o pão que aquece a alma
de quem ama e de quem não ama.

Os campos de trigo seguem embalando a lua
com uma sonata ao futuro sem fome.

Os campos de trigo esqueceram Van Gogh,
pois não há mais dor no homem.

É tudo realidade consentida.

Ninguém mais ergue sua obra para que o mundo
floresça em primaveras
que o artista não pode viver.

Nem mil girassóis de Van Gogh
vão calar a dor que assola
Nínive, Candahar, Bagdad,
o sertão, o chão desumano da Pátria,
Nigéria, Haiti, Etiópia…

Os campos de trigo não necessitam mais espantalhos.

O homem não necessita mais proteger o coração
para que o amor não o devore.

Pois o amor foi sepultado na última primavera.

Espantalho colorido
alardeando um campo-minado-coração,
varrido pelas máquinas da indiferença que regem
o sarcástico-mundo-cão.

Os campos de trigo, indiferentes,
seguem solares,
seguem em chama,
espalhando grãos,
dançando ao vento das almas ignaras."

Bárbara Lia

7 comentários:

platero disse...

parabens pela escolha

Bom campo de escrita

rmf disse...

Partilho da mesma opinião.

As escolhas de Anaedera são, acaso se me permitam termos que as 'adjectivem', lindas.

O meu agradecimento pela tranquila e sapiente leitura que aqui reparte.

Um abraço fraterno a Platero e Anaedera, o gato.

(sorriso) :)

Anaedera disse...

Obrigada,
nem sempre me é fácil conseguir exprimir-vos o que gostaria, virtualmente.
Fico feliz que me compreendam.
(o gato?!)

rmf disse...

Mil perdões!

A gata!

:)

Nuno Maltez disse...

Muito bonito.

Anaedera disse...

Ha! era eu...
Pois eu sou mesmo humana e a outra "habitante" de Anaedera, também.
O gato da foto é o Dino, foi um dos melhores amigos, em comum.
E daí a homenagem.

rmf disse...

É belo o diálogo que se estabelece entre os seres de Anaedera.

Aqui, pela voz de quem aí habita, são-nos entregues em mãos as declarações da incriada Natureza, para juntos lermos das espigas a oscilação doirada pelo vento em voz de Sol.

Tudo isto porque voltei a ler o que Bárbara leu. No durante, roda tranquila a serenidade.

Abraço Anaedera,
continuação! :)