O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


segunda-feira, 12 de abril de 2010

Penso-te como o homem de asas a calcular o chão,
o pescador a recolher memórias das brumas,
na equitação das aves sobre o tempo doutro tempo

Penso-te com as duas mãos a começar o amor,
na respiração dos vulcões que sonham os dias pela calada,
nos pedaços de trigo que levo à boca

Penso-te em abril junho e dezembro,
na casa com a lua cheia por cima,
ao nascer da ninhada de gatos

Penso-te de pulso firme à tatuador
neste primeiro andar do beliche
neste pouco que sou
mas que não faz mal
porque penso-te como pensa o cego
a ler o rosto de uma mulher cega

1 comentário:

Anaedera disse...

inspirador!

tempo após tempo,
sendo cada vez menos,
até se apagar a própria memória,

no amor, que sempre começa
porque nunca acaba,
como o trigo que se regenera,
pelos tempos.

E o alto faz-se baixo
nas profundezas atingidas pela lava,
que tal como as mãos do cego que sente,
vai marcando a terra.