O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


sexta-feira, 2 de abril de 2010

funeral de sem-abrigo

morreu pela Páscoa
num vão de escada da cidade

o funeral esteve a cargo
da Santa Casa da Misericórdia

acompanharam-no
dois velhos companheiros
e o Fiel
que não mais comeu
desde a morte do amigo

ah, e um melro - que devia ter ninho num cipreste
no cemitério
e um grilo, sem- abrigo,
um grilo
que saiu da toca
para receber cantando
um novo amigo

sem-abrigo foi transportado
de carro
ao que será
sua primeira
e última morada

Bom será
ter-se morada

sem-abrigo é que
nesta Páscoa
não deu
por nada

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