O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


domingo, 3 de fevereiro de 2008

Des(a)pertar (d)o Fogo


Às vezes preciso partir o telhado de vidro para entrar na casa que é a minha
e acrescentar-me algum incómodo para percepcionar o incómodo que já existia.

Vejo que a Paixão me é necessária - enquanto Fogo, não inflamação -
até a sua ausência tem de ser apaixonante,
se não, não mira, não fala, não se reflecte a vida que me transforma ou alumia.
Sinto um aperto no peito por não encontrar caminho sem ela.

(Os impulsos para me preencher ou jejuar são autênticos e sigo-os amorosa, dedicada, e o que segui-los implica é sempre uma incógnita e uma certeza a magnetizarem-me. E tantos são os desencontros quando vou de encontro ao que me é para ser encontrado; até este aperto que me acode ou eu socorro é um achado que não previa ou imaginaria, e é-me frequente.

É a surpresa do desengano,
como se a aparência feliz do que me atrai me deixasse por fim atormentada e arrasada,

embora não seja em vão,
pois é por me aproximar dela e nela me abraçar que eu vejo a realidade pulsante da inacreditável adormecida que sou,
e cega,
com tanto para ver que ao mínimo vislumbre me sinto acordada.

Cada vez mais o pouco é muito, por vezes, demasiado. Digo pouco, só porque mostra o tanto que eu desconheço. Será mesmo uma viagem infinita a ideia do Infinito, e não é por senti-lo imenso, o que sinto é antes uma intensidade em cada imensamente minúsculo passo que dou que o que me poderia saciar a carência deixa de ser plausível ante a abundância.)

Parece-me que terei de desaprender a memória e a solidão,
aqui neste b(r)anco em que me sento e sinto, como num sim de assim,
como num longe de ao pé de mim.

2 comentários:

Ana Margarida Esteves disse...

Bravo Luisa. Que viva a Sororidade das Mulheres Apaixonadas!

Anónimo disse...

Às vezes preciso partir o telhado de vidro para que o longe fique ao pé de ti