sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008
Carta de despedida a Paulo Feitais e aos que restam
Paulo.
Obrigada pelas flores. Eu que sou especialista em botânica deveria saber o nome destas tão belas flores, mas na realidade, o meu conhecimento é livresco, eu só conheço palavras e livros, nada mais.
Gostava que ficasses. Deixa-me, a mim, partir. Como disse noutra carta de amor, tenho medo de serpentes, e acabei por permanecer mais tempo por aqui porque tinha saudades do outro Paulo, conheci uma Margarida a despontar, cheia de vida, até uma Alice veio ter comigo ao meu jardim. Depois veio outra menina que afugentou as bruxas más da ortografia, mas elas nunca me deixam enganar ninguém. Claro que houve imensas cores - desde um luar azul à obscuridade total que me faziam aqui alongar a minha estada, mas, como sabes, a vocação das joaninhas reside no voar.
Fica aqui, Paulo, junto da tua Língua, que a minha língua não toca mais na tua. Nunca pensei que ela te assanhasse assim com uma voltagem tão elevada, mas as minhas línguas (de águas) e a tua Língua não se querem confundir. Se calhar porque precisam de espaço e tempo. Tempo, tenho-o de sobra, mas espaço - não cabemos naquilo que tu chamas Pátria, da qual te é impossível exilar. E eu sou uma exilada a tempo inteiro, profissional e amadora, acentuada gravemente pela ortografia e gramática.
Sabes, descobri a poesia com Antero. Na pura inocência, à procura de Queiroz (como se Eça de Queiroz se desvendasse numa enciclopédia), quando encontrei outro Q de quá-quá. E durante a minha adolescência descobria extasiada os seus poemas. Quando há 14 anos atrás nascia Março, lia compulsivamente "15 anos" como se Antero o tivesse escrito apenas para mim. Amei-o como amei tão poucos poetas- ou mais, ele foi o primeiro, que me ensinou a amar com a Alba. E para mim tornou-se claro: a poesia era de combate: poeta, ergue-te, perante a Ideia.
Sei que estas palavras também as viveste, do teu lado da tua Língua, nas terras fetais, ou abrasileiradamente cansadas
Eu ainda estou a tentar ser tipógrafa, para me encontrar com Michelet e lhe mostrar os poemas de um desconhecido Bettencort. Possivelmente nunca passarei desse Bettencourt, tipógrafo, emigrado, exilado à procura do sonho.
Deixa-me partir que já vou tarde. Este reino da Serpente é mais do teu mundo do que do meu. Eu tenho o descuidado o meu jardim, enebriada (ou inebriada, já não sei) convosco.
Ficou aqui o meu rasto e o meu mês de Fevereiro. Mais uma aniversário, mais um ninho a desertar. Deixa ir-me para tu /te/ vires e /te/ voltares.
Surgir! ser astro e flôr! onda e granito!
Luz e sombra! attracção e pensamento!
Um mesmo nome em tudo está escrito-....................................
Eis quanto me ensinou a voz do vento.
Antero
da tua
Joana
Obrigada pelas flores. Eu que sou especialista em botânica deveria saber o nome destas tão belas flores, mas na realidade, o meu conhecimento é livresco, eu só conheço palavras e livros, nada mais.
Gostava que ficasses. Deixa-me, a mim, partir. Como disse noutra carta de amor, tenho medo de serpentes, e acabei por permanecer mais tempo por aqui porque tinha saudades do outro Paulo, conheci uma Margarida a despontar, cheia de vida, até uma Alice veio ter comigo ao meu jardim. Depois veio outra menina que afugentou as bruxas más da ortografia, mas elas nunca me deixam enganar ninguém. Claro que houve imensas cores - desde um luar azul à obscuridade total que me faziam aqui alongar a minha estada, mas, como sabes, a vocação das joaninhas reside no voar.
Fica aqui, Paulo, junto da tua Língua, que a minha língua não toca mais na tua. Nunca pensei que ela te assanhasse assim com uma voltagem tão elevada, mas as minhas línguas (de águas) e a tua Língua não se querem confundir. Se calhar porque precisam de espaço e tempo. Tempo, tenho-o de sobra, mas espaço - não cabemos naquilo que tu chamas Pátria, da qual te é impossível exilar. E eu sou uma exilada a tempo inteiro, profissional e amadora, acentuada gravemente pela ortografia e gramática.
Sabes, descobri a poesia com Antero. Na pura inocência, à procura de Queiroz (como se Eça de Queiroz se desvendasse numa enciclopédia), quando encontrei outro Q de quá-quá. E durante a minha adolescência descobria extasiada os seus poemas. Quando há 14 anos atrás nascia Março, lia compulsivamente "15 anos" como se Antero o tivesse escrito apenas para mim. Amei-o como amei tão poucos poetas- ou mais, ele foi o primeiro, que me ensinou a amar com a Alba. E para mim tornou-se claro: a poesia era de combate: poeta, ergue-te, perante a Ideia.
Sei que estas palavras também as viveste, do teu lado da tua Língua, nas terras fetais, ou abrasileiradamente cansadas
Eu ainda estou a tentar ser tipógrafa, para me encontrar com Michelet e lhe mostrar os poemas de um desconhecido Bettencort. Possivelmente nunca passarei desse Bettencourt, tipógrafo, emigrado, exilado à procura do sonho.
Deixa-me partir que já vou tarde. Este reino da Serpente é mais do teu mundo do que do meu. Eu tenho o descuidado o meu jardim, enebriada (ou inebriada, já não sei) convosco.
Ficou aqui o meu rasto e o meu mês de Fevereiro. Mais uma aniversário, mais um ninho a desertar. Deixa ir-me para tu /te/ vires e /te/ voltares.
Surgir! ser astro e flôr! onda e granito!
Luz e sombra! attracção e pensamento!
Um mesmo nome em tudo está escrito-....................................
Eis quanto me ensinou a voz do vento.
Antero
da tua
Joana
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11 comentários:
Oh Joana, vê lá não vás embora tu também!
Abraço,
A
Olá Joana,
Tenho acompanhado a tua presença no que de indecifrável e no que de realmente transpareces. Gostava de ter comentado, e não o fiz, mas faço-o agora, o teu post da "mística do desacordar": Belíssimo, íssimo… (A Serpente tem um ritmo voraz e a dada altura o que eu gostava de dizer já não é para ser vivido dizendo-o)
Tenho pena que a razão porque vieste seja na realidade a mesma porque te vais. Essas saudades… com que agressividade as vives, e com que ternura te invadem...
Sabias que as joaninhas são sinal de Boas Novas?
fica, Joana
Não sei quando cheguei aqui. Sem rosto, sem memória, sem nome de gente, fui-me aproximando para ouvir as vozes que a serpente transporta e que formam a sua voz única: variada, distinta, nítida, sussurrada, raramente gritada...fui-me sentindo bem. Brinquei um pouco com as máscaras de mim mesmo. Penso não ter sido arrogante, nem rude, nem ter hostlizado ninguém. Muitas vozes falaram em nome do obscuro... escrevendo o que eu não escrevo, dizendo o que eu não disse.
Percebo quem me quer, quem me ignora, quem me fere...quem me acha arrogante, ignorante, até D. Juan...que importância tem isso?
Também formo as minhas opiniões, por vezes calo as minhas concordâncias e discordâncias. O que tem isso?... Em que é que isso me pode afectar? Não tenho com as pessoas daqui memhuma obrigação, movo-me de acordo com a minha consciência, ética e educação. Algumas pessoas ficam felizes com o que escrevo, outras acham que poderei ser "perigoso", ou cínico, ou até mentiroso. Em que é que isso me pode afectar?
Sou do lugar onde estou, de nenhum lugar e de todos. Não sou de "companhia". Muitos têm sido gentis comigo e até elogiosos, em que é que isso pode afectar o que escrevo? Se o escreverei do mesmo modo? aqui ou em qualquer outra parte. Tantas despedidas, tanto voltar e partir, dá-me tristeza.
Apetece ser autoritário e dizer: DAQUI NINGUÉM SAI!! mas claro que não o posso fazer(dir-me-iam que isso é apego...) Ninguém pode, muito menos eu dizer nada dessas partidas que, se calhar são os vossos jogos, as vossas brincadeiras, desculpem interferir.
Dedico-te um poema ou fado/poema
Uma lágrima de prata
Na negrura do xaile.
Vai por esse rio
A dor da voz
Ao encontro das naus,,,
A maré engoliu
Os meus secretos pensamentos
Aproximou o azul das pupilas
Até que só ficou
A emoção
De uma rosa a florir
Na cruz dos meus sentidos
Há tantos caminhos para o olhar
E todos são o mesmo.
Um abraço
Um sorriso:)
Muita paz
Obscuro,
Tudo o que nos é dirigido afecta-nos, cada palavra tem uma vibração e conjugada com outras é uma tal torrente de emoções e imagens que dificilmente sobreviveríamos não fosse podermos escolher o ritmo, a interpelação, a interrupção, a ausência, o mergulho, a profundidade, tudo isto para dizer: a relação. É a nossa vontade de lidar com o que nos acontece que faz com que tudo se transforme e recrie... Tu já viste quanta correspondência passa pelos nossos sentidos? A selecção é natural.
Não és de companhia, mas não dizes: não me peguem no braço! Não há necessidade, porque, como tu dizes, não há obrigação. Mas há liberdade que é muito mais exigente. E Presença, e Encontros. E mais, os Irmãos reconhecem-se em qualquer sítio, sob qualquer nome.
Devo agradecer as tuas palavras.
As que queria ouvir eram as de quem parte, com mágoa... o que eu queria, afinal, pararafraseando o poeta «...era que o namorado voltasse para a costureirinha...»
Se me entendes...
Não já o que me acontece a mim.
Tanta gente a partir e a chegar ! Parece o aeroporto ! Só ninguém reparou na partida verdadeiramente real e de lamentar: a de Adama...
Será que ela partiu mesmo?
Certamente.
Não acredito que Adama tenha partido ! Deve estar em retiro com Deus ! Há-de voltar... tenham fé !
Ó Obscuro triste, só agora tive tempo para te ler... nós já conversámos e até já desconversámos... hoje fiquei com uma lágrima no olho... bolas, tu foste muito querido ...
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