O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


domingo, 16 de novembro de 2008

Comunicação


Vê. Que perfume vem do não ter sido

Que alvoradas te semeiam de espanto

No centro do teu peito está a luz

Essa luz que me traz anoitecido


A mesma luz que brilha no meu pranto

tudo em mim transfigura essa luz

Vê. Sempre essa luz alva e dançarina

Sempre sem mácula e alucinante


Tudo é na luz pouco mais que neblina

Uma vaga impressão um breve instante

Vê. O tempo é um voo para além


Não existe o que resiste à mudança

Não há morte. Vê. Que perfume vem

Do Longe que nenhum olhar alcança?


_________

(Para o Luís. Quando eu tinha 16 anos o seu irmão morreu quase sozinho no hospital Pulido Valente. Só lá estava eu e o meu medo sem nome. No sábado passado lembrei-me do olhar vazio do Zé e do sorriso triste do Luís. Minutos depois soube da sua morte. Uma morte do mundo.).

4 comentários:

Anónimo disse...

Paulo,

É com sentida comoção que leio o sentimento grandioso, enorme que se desprende do belíssimo poema. "...um perfume que vem do longe e que toca as sensíveis cordas do instante. Mágnífico.
Fecho os olhos e imagino essa "morte do mundo", em luz profunda.

Um abraço, um aperto no seu braço.

Anónimo disse...

Tão belo, apesar de triste!

Anónimo disse...

Paulo, este belo soneto é seu? O mundo sempre morre na morte de quem o percepciona como tal.

Anónimo disse...

"Tão belo, apesar de triste"... Como pode a beleza não ser triste, neste desterro que somos!?...