O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Relógio da Alma

Regresso à saudade dos dias
em que olhava o véu de água
a descer do céu sem pressa
vindo duma nuvem solar
e da sua quietude obscura.

Acomodam-se no silêncio
que me escuta e compreende
essas horas dum tempo perto
do azul eterno e da sede única.

Um fio de água alisa a janela
e lá fora as árvores recordam
os meus olhares de outrora
singulares na sua fonte pura.

Descubro algumas certezas
tranquilas nos ciclos repetidos
mas novas inquietações nascem
como páginas dum livro à espera.

Os sinos dobram e não sentem
a frágil areia do ar que se agita
no seu hino continuado pela
límpida memória do riso.

Esses sons regressam da sombra
aquietam-se na manhã dormente
com suas labaredas de oiro vivo
perpetuadas na orla sábia da vida.