O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


sábado, 2 de fevereiro de 2008

Apagamento

"Todas as coisas que vejo, ouço, respiro, toco e como, todos os seres que encontro, privo tudo isso do contacto com Deus e privo Deus do contacto com tudo isso na medida em que alguma coisa em mim diz eu.
Posso fazer alguma coisa por tudo isso e por Deus, a saber, retirar-me [...]"
- Simone Weil, La Pesanteur et la Grâce, Plon, 1991, p.52.

6 comentários:

Isabel Santiago disse...

Officium:
"Definitivamente, não quero que este mundo criado deixe de me ser sensível, mas sim que não dependa de mim que ele seja sensível. A mim, não pode contar o seu segredo que é demasiado elevado. Que eu me retire, então, para que o criador e a criatura troquem segredos.
Ver uma paisagem tal como é quando lá não estou...
Quando estou num sítio qualquer, maculo o silêncio do céu e da terra com a minha respiração e o bater do meu coração."
Simone Weil, op cit.p.47 (trad.portuguesa) e a escuta de uma música que é o segredo de todas as coisas sensíveis do mundo, dentro e fora de nós.

luizaDunas disse...

Gostei muito de ouvir a Simone Weil, atravessou-me o olhar com o que senti como olha o que sente. Distante e impenetravelmente próxima da experiência humaniversal.

Luar Azul disse...

A ausência do eu torna suportável o Inferno, mas se não formos Criadores não podemos entrar no Paraíso (vemo-lo de fora).

Não ter eu dá-nos esta vantagem: "não ter sítio para ser atacado", uma aceitação tão transparente que permite ouvir também o maravilhoso som de tudo o que É (mesmo que fragmentado e fragmentador).

Nesse "destronar o Inferno" abrimos mais uma porta para o "beyond Paradise" que está em toda a parte: resta-nos ainda (talvez entre muitas outras coisas, quem sabe?) descobrir que nunca deixámos o Paraíso, que "Deus" esteve sempre connosco, e foi Sempre nós e nós Ele... até nessa Liberdade incondicionada, tantas vezes desprezada, umbigo de Divino.

Ou talvez não, plof, plof, plof, há alguém que saiba? e desses que sabem, quem o pode afirmar? e desses que o afirmam, quem convencerá? Eu não sei, faço blá blá blás com as palavras como quem faz bolhas e bolas de sabão e nada do que digo é para levar a sério, incluindo isto e isto:

"Nada existe. Se algo existisse não poderia ser conhecido. Se pudesse ser conhecido não poderia ser comunicado." (Górgias)

Luar Azul disse...

PS - no meu texto anterior seria mais correcto dizer "co-Criadores"

Paulo Borges disse...

Senhor, livra-me do paraíso, do inferno, da criação, de ti, de mim e de tudo o que os homens dizem ou não !

Paulo Borges disse...

Mas deixar Deus e as criaturas a sós, livres da presença do sujeito, será compatível com a manutenção de Deus e das criaturas ? Um contacto não filtrado pela minha observação não será desde o início fusão indistinta ?