O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quarta-feira, 20 de outubro de 2010

-gritos-




Derrubei a paisagem inexplicável da mentira,
Derrubei os gestos sem luz e os dias impotentes.
Lancei por terra os propósitos lidos e ouvidos.
Ponho-me a gritar,
Todos falavam demasiado baixo,
falavam e escreviam,
Demasiado baixo

Arrebato à morte essa visão da vida
Que lhe destinava um lugar…

Com um grito,

Tantas coisas desapareceram
Que nunca mais voltará a desaparecer,
Nada do que merece viver

Canta debaixo das portas frias
Sob armaduras opostas,
Ardem no meu coração as estações,
As estações dos homens os seus astros
Trémulos de tão semelhantes serem.

E o meu grito nu sobe um degrau
Da escadaria imensa da alegria.
E esse fogo nu que me pesa
Torna a minha força suave e dura.

Eis aqui o lugar generoso
Onde só dormem os que sonham.

O tempo está bom, gritemos com mais força
Para que os sonhadores durmam melhor
Envoltos em palavras
Que põem o bom tempo nos meus olhos

A felicidade jorra do meu grito
Para a mais alta busca,
Um grito de que o meu seja o eco.


excerto de Grito, Paul Éluard (Eugène Grindel)

4 comentários:

rmf disse...

"Eis aqui o lugar generoso
Onde só dormem os que sonham", "Com um grito"


Une Image Revient À Qui L'a Mise Au Monde

"Elle rêve et de qui rêve-t-elle de moi
Dans le draps de ses yeux qui rêve sinon moi

Dans ses yeux la durée s'accroche à l'être humain
Mon règne dans ses yeux s'accorde à tous les règnes

Le monde est sus la table des métamorphoses."

Éluard, Paul. 1968. Oevres Complètes - vol.oo. Éditions Gallimard. p.264

Belíssimo grito suportado por não menos belíssima fotografia. Bons ares que giram-ao-sol! :)

Abraço fraterno

rmf disse...

*sur la table

pardon :)

platero disse...

Boa escolha

obrigado

beijinho

Anaedera disse...

às vezes apetece gritar!
principalmente quando se está sem
voz...
Bjs