O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Uma Musa Para Teixeira de Pascoaes


O teu rosto incendeia-se com a sua nudez. É um ocaso perante a sua aurora carnal. Não estás surpreendido: já estás aí há muito tempo. Aguardando que se dispa, aguardando que se mostre. Estás preparado e só. Ela também não parece ter pressa. Os que se reencontram não têm tempo na alma e no corpo. Esperas mais. Esperas que tudo para ela se recolha e reconverta antes de ti. E tudo se reconverte para a vestir, a sagrar de coroas e pulseiras, ténues véus e um espesso manto. O teu olhar atravessa-a mas não a possui. Ela baixa os olhos para te sinalizar um estremecimento, um atiçamento. Consegues imobizá-la porque ela te sabe aí, mas não te quer suspenso no terror do engano e do desejo. E tu ardes. Ela refresca-te. Preferes ainda assim ouvir nesta distância-dentro, o gotejar das diferentes fontes do seu corpo. Ela inclina-se e trava o abalo das águas que podem corrê-la, transcorrê-la desde outrora, desde sempre. Mostra-te que está preparada: a água que nela corre e transcorre aviva as flores. Despontam mais viçosas na proximidade do seu corpo-leito onde repousarás da espera, da inconsolável individuação e da longa vigília em que nesse mesmo lugar a viste partir e regressar. Acalmarás a febre, o incêndio: é um horto de perfumes e águas. O ar redolente inebria-te. Sentes a derrota do preceito que impuseste à floresta da vontade cheia de sombras e vozes que te arrepiam de medo e fantasia. A ebulição consome a tua passividade convulsa porque, atrás dos olhos, tens o desejo a revelar-se como uma potência divina ou como um raio de Zeus. Os olhos formulam o sussurro do apetite e ela, fingindo não ver, mas ouvindo os vestígios da unidade que se revolvem nas ruínas do teu semblante triste, responde movendo o pé, fazendo que fecha a porta quando ela já não tem chave. E o teu desejo último e primeiro implode com as cores da forja que vos moldou uma só alma em dois corpos distintos-distantes. Ela, intacta ao tempo, não se aflige com as cores estranhas com que a floresta dos afectos te pintou, te envelheceu e te tornou um eremita, etéreo como o vento e a maré. Ela espera-te com incenso: quando entrares pela porta, em cinza juntos no amor-morte, se evolarão pelos céus atrás dos pássaros que perdeste quando ainda eras do tempo e de que ela sabe o rastro intacto. Mesmo sendo silêncio e visão, frémito, grito e fluída evocação. Mulher, terra e mãe que te oferece nos seios, no ventre, nos olhos e nos (a)braços o sentido secreto da tua eternidade lunar. Vem, é a Lua que chama o Ocaso da tua consumação!

Para responder à provocação que muito gostei de um Teixeira de Pascoaes renascido nos comentários ao texto anterior que aqui deixei. Uma musa para Pascoaes é um grande agradecimento ao "poeta" e um pedido de desculpa por ficar tão aquém do que ele merece.

14 comentários:

Teixeira de Pascoaes disse...

Fiquei sem fôlego! Depois de ler o texto, decidi que deixarei os meus aposentos e vou passear no Marão, beber nas fontes para me refrescar... conversaremos depois se a menina não se importar. Por ora um aceno num rosto purpurino. Até depois.

Anónimo disse...

Não posso, Isabel e Pascoaes, meu pai! ser a musa de Pascoaes, sou as suas divinas Saudades!(risos)e ele é o meu "pai"! (mais risos)

Deixo um "sonho acordado" no jardim. Não quero "ver" as musas, antes de elas se revelarem,

Ai,ai, Isabel! ... Isso é que é calor e fervor (agora é que ruboresceu!)

(Suspiro de Saudades)

Maria disse...

Nem com o mar te refrescas, Isabel? Estás em brasa! Risos… Vê lá se diriges o olhar para o Diógenes que sempre deve causar menos calor e mais reflexões…

João de Castro Nunes disse...

Mal escrito, sem nervo, uma patetice. Aproveitei as férias e encontre donzel, bem precisa!...

João de Castro Nunes disse...

A monca de Pascoaes, era uma ovelha, vocemessê também parece que não está com o juízo todo!...

João de Castro Nunes disse...

Corrija-se!... "Aproveite as férias".

João de Castro Nunes disse...

Uma ofensa fingirem que são o Pascoaes, que tinha fôlego para vocês todos!...

Atirem pedras medíocres!

baal disse...

o amor está sempre aquém, isso sabia-o pascoaes. por isso caminha eternamente.

† † † † † disse...

Luto sentido por haver comentários tão desadequados a um texto belo e profundo. Além do mais por seres que se divertem a ser "clones"!

tumba na caneca disse...

Terrífico!

Joana disse...

Lamentável, de facto!

☆☆☆☆☆ inclinei-me e disse...

Isabel, que este horto se estenda a todos os que têm uma visão tão vil, estreita e apagada para as coisas verdadeiramente belas... que nem sorrir conseguem!

Bem hajas pelos teus belos textos!

Anónimo disse...

uma desgraceira valha nos deus lol

Teixeira de Pascoaes disse...

Vagando como um pobre tolo e não podendo hoje, mais do que cantar dedico-te menina:

“ – Senhora minha, meu amor, lhe disse.
Sou imagem de fumo e nuvem sou;
Ténue floco de espuma, à superfície
Da onda virginal que te criou;
Onda revolta e verde de esperanças,
Redemoinho genésico, a espumar;
Onda coberta de algas e de tranças
De ninfas e amorzinhos a nadar…

Eu sou, Senhora minha, a criatura
Rendida dos teus olhos criadores;
Presa aos teus pés gentis de noite escura
Que só pisam espuma e trilham flores.
Eu sou aquele que ama; o rasteirinho
De corpo, e de alma clara e alevantada.
Sou a poeira que ergue, em teu caminho,
Tua saia com rendas de alvorada.”