O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


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sábado, 14 de março de 2009

Da radical abolição de preconceitos

"Que maneira ha de approximar a sensibilidade da rapida multiplicação dos estimulos? Evidentemente que maneira natural, por assim dizer, não ha nenhuma. Mas ha uma maneira artificial.
Como obter essa artificialização da sensibilidade? Como pode o homem tornar-se, effectivamente, o constructor do seu proprio emotivismo?
Mediante trez processos:
(1) A abolição do preconceito da personalidade. Acabemos com a idéa de que cada individuo é só elle-proprio. Todos nós coexistimos ao mesmo tempo que existimos. Todos nós somos todos os outros.
(2) A abolição do preconceito da individualidade. Deixemos de acceitar como verdadeira a these fundamentalmente theologica da indivisibilidade da alma. Somos aggregados de celulas, agrupamentos de psychismos, de sub-nós, somos inteiramente tudo menos nós-proprios. Submerjamo-nos no mar de nós-proprios, afogados no Universo de lhe pertencermos.
(3) A abolição do dogma da continuidade lateral. Não julguemos mais que nós, do presente, somos um laço, um hyphen mobil, entre o passado e o futuro. Não somos. Somos sim continuos mas não com o passado ou com o futuro. A nossa continuidade é toda com o presente - com o presente externo de todas as cousas, e com o presente interno de todas as sensações"

- Fernando Pessoa, in Pessoa Inédito, coordenação de Teresa Rita Lopes, Lisboa, Livros Horizonte, 1999, pp.311-312.