terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Miguel Torga: Viagem

É o vento que me leva.
O vento lusitano.
É este sopro humano
Universal
Que enfuna a inquietação de Portugal.
É esta fúria de loucura mansa
Que tudo alcança
Sem alcançar.
Que vai de céu em céu,
De mar em mar,
Até nunca chegar.
E esta tentação de me encontrar
Mais rico de amargura
Nas pausas da ventura
De me procurar...

Miguel Torga in Diário XII

10 comentários:

  1. Quase que arriscava o nome do local de onde foi tirada esta fotografia...

    Para onde olha Torga desenraizando-se da aspereza da paisagem?

    Olha pelo seus olhos a flor violácea, oscilando até ao mar o vento miradoiro que uma pétala haveria de soltar.

    Foi o vento que o levou, e sua alma-raiz na terra permaneceu.

    Grato, Laura.

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  2. ORFEU DA REBELDIA

    O Poeta morreu: frente ao Mondego
    com suas águas mansas acalmando
    o seu conatural desassossego,
    ninguém mais o verá... com Deus brigando.

    Ali, no seu refúgio da Portage,
    indiferente às horas que se somem,
    tecia e destecia a linguagem
    das suas poesias sobre o Homem.

    Corridas as cortinas das janelas
    por ter deixado de assumar-se a elas,
    parece que a cidade está vazia.

    Foi ter com Deus... o ático Poeta,
    o vate de Coimbra, meio asceta,
    o transmontano Orfeu da rebeldia!

    JOÃO DE CASTRO NUNES

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  3. RECÍPROCA AVERSÃO

    Foste avesso a Coimbra, cujas ruas
    conhecias de cor e salteado
    e sobre cujas pedras contuinuas
    a projectar teu vulto esgrouviado.

    Transmontano da orla duriense,
    entre os beirões nunca acertaste o passo:
    no meio social conimbricense
    para o teu génio não havia espaço.

    Pouco te disse a Universidade
    que por seu turno, em reciprocidade,
    não te assumiu além de quanto baste.

    Como tu próprio referiste um dia,
    nem ela deu por ti, como devia,
    nem tu por ela... quando nela andaste!

    JOÃO DE CASTRO NUNES

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  4. Tenho que assinalar, sem favor nenhum, a beleza dos dois sonetos aqui apresentados por JCN.

    Apesar do seu conteúdo ser "prosaico" não entrando em profundidade psicológica ou filosófica, limitando-se a referir um ou outro facto da vida do autor... os poemas estão bem feitos.

    Não sei se aceita, o inspirado JCN, esta crítica sem açaimo. Esta pedra nua.

    Agora que já me meti com JCN, Laura, digo que Torga é de uma grande densidade de pensamento à mistura com talento.
    É "pedra" de lei, este Torga!

    Um beijo para ambos.

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  5. TORGA... EM TOSCO

    Transmontano de gema, a cem por cento,
    autêntico, vernáculo, frontal,
    hostil de rosto e de temperamento,
    eras de corpo e alma vertical.

    Se eu te quisesse erguer um monumento,
    não to faria nunca de metal,
    mas de granito ou xisto pardacento
    como era o teu aspecto pessoal.

    Não ficaria menos verdadeiro
    se fosse de rugoso castanheiro
    de de S. Martinho d'Anta ou região.

    Olhar cavado, a golpes de martelo,
    havia, Torga, de mandar fazê-lo
    ao mais castiço e rústico artesão!

    JOÃO DE CASTRO NUNES

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  6. "saudadesdofuturo", eu não entrei na alma de Torga, porque ele carecia de alma. Só tinha ossos, razão por que lhe foi negado o Prémio Nobel: não tinha suporte humano para carregar com ele. Quanto aos versos... é do melhor que temos, depois dos meus, obviamente. Não lhe parece? JCN

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  7. Ó JC eu gosto de si. À brava. E olha que este sentimento em mim é ouro. Até lhe perdoo as biqueiradas e tudo. Acho que estou a crescer em tolerância. Mas nos poemas... lá para trás que estou na fila.

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  8. É verdade, sim! JCN!
    Claro que parece!

    Que bem que sempre sabe receber críticas, mesmo que sejam pedrinhas ou pedregulhos!!

    Saúdo-o por isso, apesar das suas
    "biqueiradas", como chama Fausta, às pedras que J.C. atira.

    Ela gosta de si, calcule!...


    (De onde terá sido tirada a fotografia? Rui?)

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  9. Acreditam em tudo. São de uma inocência aterradora!

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