quinta-feira, 5 de novembro de 2009

são sombras que passam


no verso desta folha
as sombras das letras são marcas
do esquecimento das palavras
entornadas no depois
nem sons sequer
apenas a breve labareda de lavrá-las
o aparo sedento
da caneta irónica de tinta permanente
é um arado de treva
e tu leitor
és um solo que não tem fronteiras
nascem de ti as árvores frondosas do princípio
em ti morro aquela morte das sementes inúteis
porque tens em ti a razão de ser de todas as coisas
enterradas no esquecimento
que te faz dono do teu chão volátil
a tua curiosidade infantina
vai pois em paz
que és o reverso de mim
alado viajante da mesma incerteza
a tua leitura é uma escrita que me desfaz
linha a linha
verso a verso
na tua noite se desfazem os meus dias
a minha errada busca dessa Ítaca
que é a sombra da tua impermanência
nada nos espera no fim

8 comentários:

  1. Esse nada ondula ao sabor dos teus versos, e o que o escritor diz é o que cada um de nós diria a quem pelo prazer da leitura oscila por dentro das mesmas palavras.

    A fotografia é, de facto, uma fotografia, que não nos arranca os olhos, mas sim, que nos devolve à aparência que se escapa passageira.

    É para dizer... consigo imaginar o fotógrafo e a sua posição no espaço, enquanto delicadamente espera pelo momento certo que faça juz ao que em memória escreveu, ou no depois do contacto, quando uma imagem lhe reclama o seu mais profundo sentir, que tão sublimente enquadra num inexistente caixilho, pois que sua alma não tem forma.

    um abraço extremo mas encurtado pelo apreço deste teu vislumbre.

    tudo de bom! :)

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  2. No reverso do teu verso
    Encontro enfim a sombra
    do teu olhar de passagem
    da tua letra em aparo e chama
    brilha em arado a terna treva
    o cristal do aparo
    A certeza do chão
    na incerta palavra
    em que te vejo e passo
    e cruzo o lasso passo
    Somos o que somos
    Sombra e avesso da fala
    Somos as coisas que sobem e descem
    nas escadas que a si mesmas
    esperam ao fim da noite
    a quem os dias ausentam
    O dia a quem as noites esperam
    Nada sobe ou desce
    para além das sombras
    que descendo sobem
    cruzando-se com outras
    que subindo descem:
    sombras que passam;
    Passam por mim
    a impermanência das horas
    Chegarei antes de partir
    à ideia de passagem.

    Um beijo... e agradeço o vislumbre
    e a passagem: a sombra da sombra.

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  3. Nada nos espera no fim:
    nem nós
    de nós desatados
    desasidos

    Belíssima foto!

    Abraço

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  4. começo a reconhecer-te pelas primeiras palavras
    -o que também não deixa de agradar-me

    abraço

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  5. Prefiro a luz... à somra, tal como a perfeição... sem sombras! JCN

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  6. Grato, amigos!
    Tudo na vida que tenha densidade é um vislumbre do que, imponderável, inqualificável, está aquém e além duma apreensão explicativa.
    Fica o imenso do amplexo de luz que recebo e ao qual me uno!

    :)

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