se não sai de ti a explodir
apesar de tudo,
não o faças.
a menos que saia sem perguntar do teu
coração da tua cabeça da tua boca
das tuas entranhas,
não o faças.
se tens que estar horas sentado
a olhar para um ecrã de computador
ou curvado sobre a tua
máquina de escrever
procurando as palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes para teres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma e outra vez,
não o faças.
se dá trabalho só pensar em fazê-lo,
não o faças.
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.
se tens que esperar para que saia de ti
a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.
se tens que o ler primeiro à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou pais ou a quem quer que seja,
não estás preparado.
não sejas como muitos escritores,
não sejas como milhares de
pessoas que se consideram escritores,
não sejas chato nem aborrecido e
pedante, não te consumas com auto-
-devoção.
as bibliotecas de todo o mundo têm
bocejado até
adormecer
com os da tua espécie.
não sejas mais um.
não o faças.
a menos que saia da
tua alma como um míssil,
a menos que o estar parado
te leve à loucura ou
ao suicídio ou homicídio,
não o faças.
a menos que o sol dentro de ti
te queime as tripas,
não o faças.
quando chegar mesmo a altura,
e se foste escolhido,
vai acontecer
por si só e continuará a acontecer
até que tu morras ou morra em ti.
não há outra alternativa.
e nunca houve.
Charles Bukowski (1920-1994)
Apenas o "se foste escolhido,/ vai acontecer" me causou certa perplexidade, no universo denotante respirado pelo poema e, antes dele, pelo próprio poeta.
ResponderEliminarObrigado, Liliana, por mais este belo Bukowski.
Faz-me bem esta linguagem rente-ao-chão do pó.
Mulheres de Charles Bukovski
ResponderEliminarParecia uma índia. O nariz e a boca eram de índio. Teria vinte e três anos, olhos castanhos, falava pausadamente e tinha um corpo fabuloso. Lera quatro ou cinco dos meus livros. Porreiro.
Uma entretela "porreira", essa... mascavada.
ResponderEliminarSe não fosse a india, até parecia Lobo Antunes,isso.
Se bem que este que escreve lento e pachorrentamente e se entranha seco na remela à terceira linha me faça adormecer e à décima primeira acordar de susto perguntando
Valha-me São José Onde está o tio Saramago para ensinar a este António a ganhar um Nobel de vez
Olha Esqueci me daquela coisa da pontuação Nunca hei de aprender Nem o Saramago a escrever realmente bem
O Carlinhos e ca dos meus.
ResponderEliminarEste poema deveria ser gravado em pedra a porta de toda e qualquer editora, livraria, cafe estilo "art nouveau", pardieiro "heavy metal" ou "punk-hardcore-straightedge", para nao dizer a porta da Associacao Portuguesa de Escritores, na primeira pagina das revistinhas literarias e na porta de toda e qualquer casa de banho publica.
Este poema é muito inspirador. Obrigado Liliana:)
ResponderEliminarTambém não exageremos, ó amiga Ana Margarida, ok?
ResponderEliminarOu será que a Ana quer também uma lápide com o poema, à sua porta, gravado em caracteres, sei lá, pali ou assim, par'li estar a minha amiga sentada em "charla" bukowskina?
"Mulheres"! - diria ele, o... "Carlinhos", quando chegasse...
Para isso, prefiro o questionário de Proust: é mais curto e usa menos as mesmas palavras.
(O "Marcelinho" é cá dos meus...)
(O Carlinhos é lá do seus...)
Pronto!
Bjs!
N.B. Eu ponho acentos porque me apetece, mas pode continuar sem os pôr: não mace o teclado!
Eles entendem-se às mil maravilhas...
Amigo Lapdrey,
ResponderEliminarPor acaso esse poema do Carlinhos e daqueles que uso para me lembrar a toda a hora de que escrevo apenas pois nao sei fazer nada de realmente util nesta vida.
Visto que a porta do meu humilde estudio e demasiado pequena e ainda por cima e arrendado, o que me proibe de tais desvarios esteticos, e que nao conto ter uma lapide muito grande na minha campa, perfiro manter esses nacos de lucidez num caderninho sempre pronto a abrir em momentos que esta ameace faltar-me (isto e, nos momentos em que julgo que ler, escrever e investigar valem realmente alguma coisa).
E o amigo poeta Lapdrey, ja pensou em fazer o mesmo?
Ja agora, para stisfazer a sua curiosidade: Nao ponho acentos, pois o teclado nao me permite: Comprei o computador nos EUA (pronto, agora ja sabe de onde vem a raiz da minha deformacao). Sim, ha maneiras de o fazer, bastante complexas, mas nao estou para gastar mais tempo nos blogues do que ja gasto.
Que me desculpem aqueles a quem ofendo o sentido estetico.
obrigada a todos, sem excepção pelos comentários.
ResponderEliminar(p.s - já me vou habituando ao Lapdrey, nas suas lanças, e Ana Margarida Esteves, esteve "limpa" na sua resposta --------eheheh isto tem sido giro assim, ver as pessoas realmente envolvidas nos seus comentários---------o charles gostaria disto também)