Até que um dia vieram aqueles que não partiram mais.
Começaram por pôr trancas nas portas e janelas e começaram a trazer coisas para dentro de casa. Depois, fixaram-na ao chão, com cabos de aço, para facilitarem a tarefa de acumulação e enchimento. Cobriram os tectos com placa sólida. Trouxeram raiva, amargura, frustração. E coisas, muitas coisas. Coisas sólidas, que ocupam tudo, de todos os tamanhos, côres e texturas, coisas grandes e coisas pequenas, bicudas e redondas, com e sem arestas, de formatos simples ou complexos. A paisagem desapareceu e a casa começou a encher-se do pó dos que não partiam e do envelhecer das coisas. Já nem havia espaço para as aves de arribação, que com tristeza, ainda pousavam nos beirais, de vez em quando, até que um dia deixaram de vir. A casa ficou cheia, muito cheia, e escura e triste. E a alma que vivia lá dentro, deixou de conseguir respirar e morreu, sem espaço e sem luz.
~
Gosto muito deste blog e dos seus membros e pedi ao Paulo Borges para participar. Espero contribuir de forma digna.
Um abraço a todos.
Bem vinda! Começa muito bem. Assim arriscamos morrer, preenchidos de tantas coisas.
ResponderEliminarQuando as casas são assim, envelhecidas, belas e dignas, por serem sem camuflagem o que são, queremos ser lá dentro e lá fora. A Madalena é uma casa! Que moradas de silêncio e palavras nos promete...
ResponderEliminarVim à janela de "casa" oferecer-lhe flores simples e sem nome. Inventei-as, dentro de mim, para si.
Bem-vinda!
Caro Paulo,
ResponderEliminarvou manter o meu caos lá fora.
Cara Isabel,
agradeço as suas flores simples e procurarei retribuir.
Ah, Madalena, como eu gosto de dormir no chão!
ResponderEliminarCircular e circulante, essa sua casa? Imagino que o seja em todas direcções e sentidos, claro.
E, por certo, a parte habitável é o lado tido como "de fora": a parte de dentro, cabe à imaginação e vivência de cada um, o visitá-la, sem nela morar.
A verdadeira casa, na verdade, é a morada sem endereço.
Bem vinda, Madalena.
Aliás, (pres)sinto que já aqui esta(va).
Abraço de carinho.
Obrigada, Lapdrey. Penso que teremos diálogos interessantes.
ResponderEliminarCara Madalena,
ResponderEliminarFico contente por receber a "ideia" e também a poética dessa casa que a traz consigo. Gosto de casas e do que elas dizem dos seres que as habitam. Seja uma morada ou um lar, ou até o seu oposto. Fiquei interessada em conhecer-lhe os recantos, o cheiro, o sabor e o viver que nela haja. Porque é habitada por quem chega e se mostra espaço de si, para o outro.
Seja muito bem vinda a este espaço.
Abraço, Saudades
Cara saudadesdofuturo (também eu as tenho), como diz o lapdrey, "a verdadeira casa é a morada que não existe", é o que connosco se movimenta em liberdade, a verdadeira casa, diria eu, tem asas. Eu é que agradeço terem-me aceite neste espaço. Somos todos para o outro, se o outro não existisse, nada existiria. Todos, mesmo os que pensam que o outro é propriedade.
ResponderEliminar