sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

As Fontes

Um dia quebrarei todas as pontes
Que ligam o meu ser, vivo e total,
À agitação do mundo do irreal,
E calma subirei até às fontes.

Irei até às fontes onde mora
A plenitude, o límpido esplendor
Que me foi prometido em cada hora,
E na face incompleta do amor.

Irei beber a luz e o amanhecer,
Irei beber a voz dessa promessa
Que às vezes como um voo me atravessa,
E nela cumprirei todo o meu ser.


Sophia de Mello Breyner Andresen, in Poesia I, 1944

9 comentários:

  1. Madalena, sinto que esse dia é a "Hora" que em nós e tudo a cada instante soa, o mais que pessoano "É a Hora" face ao qual todos os nossos relógios, desejos e esperanças sistematicamente se atrasam...

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  2. Sem dúvida. O que importa é nunca parar de caminhar.

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  3. Certo, mas a questão que levanto é a da legitimidade de se colocar/adiar como futura uma exigência de cada instante. O "dia" de que fala Sophia, o "dia" da ascensão às "fontes", à "plenitude" e ao "esplendor" prometido, o "dia" do pleno cumprimento de todo o nosso ser, nunca se dará "um dia" se não se der Agora, se não fizermos despontar a cada instante em nós esse "dia"... Não o fazer é permanecer no tempo e morrer com as mãos e a alma cheias de promessas, vislumbres, esperanças e saudades... ou seja, repletas de nada.
    É preciso o "já", o salto - agora mesmo! - , para onde desde sempre estamos, para a superabundante "fonte" que somos. Só isso quebra "todas as pontes" em que nos prendemos "à agitação do mundo do irreal", o mundo em que "um dia" não coincide com Agora.

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  4. Concordo com o Paulo Borges. Já não há mais tempo. O tempo é agora. O instante eterno da aurora de nós. Abandonemos o intervalo de nós próprios. Já.

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  5. Paulo, Maria Aurora, se fosse assim tão fácil o Agora, já todos teríamos o Céu na Terra. Não há legitimidade em adiar, de facto, mas creio que o Caminho é necessário, por alguma razão. Se não percorrermos o Caminho, diria que o Divino em nós não saberá quem é.

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  6. "- amanhã é o nosso endereço permanente
    e aí mal nos hão-de achar (se acharem),
    mudaremos ainda mais para diante: para agora."
    E.Cummings

    Madalena, não temos como não percorrer o caminho. Apenas precisamos de compreender que essa espécie de inevitabilidade feliz pode realizar-se agora.
    Adiarmo-nos porquê?
    Mas o poema é bonito.Grata.

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  7. Bolas, esqueci de assinar o comentário anterior. Com tantos anónimos problemáticos não quero ser confundida com qualquer um.É apenas uma questão de ego.

    Anonimamente, Maria da Aurora

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  8. Sophia de Mello Breyner Andresen:)

    é a poetisa que em que venero o etéreo, o odor dos elementos da natureza, a fragilidade, o adiar das coisas, o imaginário, a crítica à injustiça...

    mas sobretudo o perfume que emana, das suas palavras, como uma fragrância que repousa ao de leve...

    levemente como maresia...

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  9. Procurar é desencontrar. És o que procuras.

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