Um espaço para expressar, conhecer e reflectir as mais altas, fundas e amplas experiências e possibilidades humanas, onde os limites se convertem em limiares. Sofrimento, mal e morte, iniciação, poesia e revolução, sexo, erotismo e amor, transe, êxtase e loucura, espiritualidade, mística e transcendência. Tudo o que altera, transmuta e liberta. Tudo o que desencobre um Esplendor nas cinzas opacas da vida falsa.
quinta-feira, 29 de janeiro de 2009
Alguma coisa que nos devore
Que procuramos nós nas paisagens? Alguma coisa que nos devore
- Pascal Quignard, Vie secrète, Paris, Gallimard, 1998, p.254.
Creio que a saudade que sentimos diante da paisagem é a saudade de havermos sido devorados, de a paisagem estar dentro de nós, nós dentro dela ou de nós e ela estarmos dentro de algo sem dentro nem fora.
Talvez seja isso que se sente como mistério e silêncio em terror sagrado.
Para mim, adentrar-me na floresta, olhar, tocar nas árvores,nas pedras, no chão, lembra-me e faz-me sentir a minha finitude: tudo aquilo que é tão velho me sobreviverá. Também por isso, o campo inspira-me ficar, recolher,pura deter. O mar impele à partida, a desvairadas intentonas.Ambos pincéis na minha pintura/paisagem individual.
Paisagem é, creio, qualquer âmbito sensorial (ainda que onírico) de sentido, carregado de fala silenciosa.
Há paisagens que devoramos com os sentidos, e outras que nos devoram o sentido, ou de sentido.
As primeiras, no devorarmo-las, mais nos devoram, de tão ávidos estarmos delas. As segundas, apossando-se de nós, mais largueza íntima nos permitem, posta a vastidão e o excesso de "empaísamento" que nos apossa.
Isto constitui, ao que se me afigura, a paisagem enquanto tal: o ver de alguma parte do mundo, "enquadrado" num âmbito com-plexo (ainda que possa ser simples) de "detalhes" que como tal interagem connosco, a que o sentir confere um nexo e carrega de significado.
Não há paisagem independente do ver: é o ver, sentindo (com todos os sentidos), que a faz.
Assim, continuaremos ad aeternum passeando estultamente sobre o fio da lâmina, "decepados" pelo todo, em duas metades que são o todo de partes outras...
Mais vale a holónica de Koestler... É bem mais libertadora e "comprehensive"...
Terá isso a ver com a saudade que sentimos diante de certas paisagens, diante das vastidões do mar, do deserto ou da montanha?
ResponderEliminar" Essas madrugadas deixaram em mim, para sempre, não sei que fria sensação do mistério e do silêncio e o terror sagrado das paisagens."
ResponderEliminarTeixeira de Pascoais
Creio que a saudade que sentimos diante da paisagem é a saudade de havermos sido devorados, de a paisagem estar dentro de nós, nós dentro dela ou de nós e ela estarmos dentro de algo sem dentro nem fora.
ResponderEliminarTalvez seja isso que se sente como mistério e silêncio em terror sagrado.
Para mim, adentrar-me na floresta, olhar, tocar nas árvores,nas pedras, no chão, lembra-me e faz-me sentir a minha finitude: tudo aquilo que é tão velho me sobreviverá.
ResponderEliminarTambém por isso, o campo inspira-me ficar, recolher,pura deter. O mar impele à partida, a desvairadas intentonas.Ambos pincéis na minha pintura/paisagem individual.
O mundo também tem fome
ResponderEliminartambém nos deseja e possui
O combate inútil e vão da história e da civilização para lhe fugir
quanto mais julgamos dominar a natureza mais estamos já a ser devorados por ela
devorados, digeridos e evacuados em nada
Paisagem é, creio, qualquer âmbito sensorial (ainda que onírico) de sentido, carregado de fala silenciosa.
ResponderEliminarHá paisagens que devoramos com os sentidos, e outras que nos devoram o sentido, ou de sentido.
As primeiras, no devorarmo-las, mais nos devoram, de tão ávidos estarmos delas.
As segundas, apossando-se de nós, mais largueza íntima nos permitem, posta a vastidão e o excesso de "empaísamento" que nos apossa.
Isto constitui, ao que se me afigura, a paisagem enquanto tal: o ver de alguma parte do mundo, "enquadrado" num âmbito com-plexo (ainda que possa ser simples) de "detalhes" que como tal interagem connosco, a que o sentir confere um nexo e carrega de significado.
Não há paisagem independente do ver: é o ver, sentindo (com todos os sentidos), que a faz.
No limite, a natureza é, na verdade, antropófaga.
Comer não é ter fome de ser comido?
ResponderEliminarA uma certa fome, que a si mesmo se devora em processo uroboros, porventura inútil:
ResponderEliminarFalar é não ter medo de ser calado?
Pois que pensas e dizes senão Uroboros? Não é esse o símbolo-rosto que escolheste?
ResponderEliminarEscrever/inscrever é coisa diversa de auto-morder-se!
ResponderEliminarTem, precisamente, a parede sem porta que vai do ex-crever, pelo des-crever, ao ins-crever, triádica triunívia!
Ademais, o bisturi que escreve/inscreve fá-lo mutuamente no pulso: ali, onde se irmana o sangue e se cumpre os pactos da liberdade...
... sobremaneira aqueles, da mais iludente roda urobórica, que se rompe ...
(grato pela observação...)
Tudo é voragem que se auto-devora e, simultaneamente, jejum infinito.
ResponderEliminarAssim, continuaremos ad aeternum passeando estultamente sobre o fio da lâmina, "decepados" pelo todo, em duas metades que são o todo de partes outras...
ResponderEliminarMais vale a holónica de Koestler...
É bem mais libertadora e "comprehensive"...
PASCAL QUIGNARD!
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