domingo, 14 de dezembro de 2008

Lembrando Rilke e sua voz, crisálida boca ...




Hum ... Domingo parece ser tempo (já pareceu mais, embora) ou de ir à missa … ou de ler poesia ...
Nem de propósito.
Pede-me o poeta Donis de Frol Guilhade - sempre com aquela sua peculiaríssima maneira, como que a pedir licença para existir – que aqui “poste” um seu poema, o que faço, honrado pela escolha do paupérrimo e nem por isso muito predestinado mediador.
Fica porém belissimamente, parece-me, ao lado do soberbo e “lusófono” haiku de Luiza Dunas ...



(Lembrando Rilke e sua voz, crisálida boca,
tinindo pétalas: qual saudades cantasse do futuro)


...Ah, que fará, minha alma,
que eu mais ondeie, incerto embora,
pelos fortuitos caudais que a brisa em mim esfria ao velejar-te –
lá onde insone a superfície das lágrimas cruas beija minha barca esguia
e, ao tinir de seu cristal intacto, a boca me despreza –
e não acorra eu antes, ai, às correntes mais fundas,
ali onde, em chamas, o cantor de olhar líquido e voz incélere,
derrama, desde o céu das pétalas das torres nuas,
com seu punho dourado a sangue da alma vígil e pronta,
a rosa extreme da presença mais pura, terrível ainda,
que em seu alor futuro o anjo perfume
e o sentir me antoje da mais perene alegria?...

Donis de Frol Guilhade

13 comentários:

  1. Caro Lapdrey,

    Quando se chora, tudo o mais fala na transparência absoluta do cristal. A boca pode fechar-se. Creia que depois de o ler (e um Hermes é de algum modo aquilo que transporta ou transfere para o escutável e para o visível) - ou foi por relembrar Rilke e eu o escutar como o cantor "de olhar líquido e voz incélere" -, se briu em mim uma rosa líquida e em chamas há muito fechada pela urgência do esquecer. A outra voz, a da poesia que traz, a de Donis de Frol Guilhade, não me trouxe a "perene alegria" - porque espero ainda a "rosa extreme da presença mais pura" que não pode abrir em mim que não sou inocência e devir - mas a "alegria breve" com que hoje, dia de Domingo e poesia, tomarei nas mãos outros versos e cantarei a chorar. Receba um agradecimento infindo...

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  2. "Gesang ist Dasein" ("A existência é Canto/Cântico" - Rilke

    Gratíssimo

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  3. Caro Laprey,

    Grata por este Domingo de alma, na voz de Donis, entregue com comoção.
    Se me permite, com ele vou conversar em poesia dominical:

    Para que as pétalas dormidas dos olhos
    acordem seus perfumes
    Haverá lugar na barca para os anjos
    Que o silêncio leve à torre das muitas almas.
    Para o deserto se desviam as vozes
    E os arqueiros do céu desenham na constelação
    velada do olhar, uma cruz de sublimado nome
    Altíssimo, colherão as rosas e os beijos
    E o perfumado riso do pescador de pétalas.
    E a água tomará a forma sem forma dos perfumes
    Em taças sopradas no ar frio do mais puro cristal.


    Um abraço de gratidão.

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  4. Que bonito post! Ótimo para começar a semana!
    Boas festas para vc tb, que seu 2009 seja repleto de coisas maravilhosas, e obrigada pela visita!

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  5. Mea culpa!
    Por lapso, de que aqui presto me redimo, não mencionei a autoria da imagem: o seu, a sua dona!
    Trata-se de uma fotografia - sim, fotografia, pasme-se!- de Pia Davis, foto-grafante fruto de uma viagem da artista ao infra-detalhe de vibro policromático. Deslumbramento "sub-real"...
    (Agradeço a Donis tamanha descoberta: ele que, sempre tão "audiente", se mostra aqui, porém, tão mais "visuante"...)

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  6. Já de antes de haver mundo se sabe que Donis de Frol Guilhade é um grande poeta.

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  7. Salve, Serpente Emplumada!

    Feliz Aniversário!

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  8. Sim, Maria da Conceição. E tu vives de azia...

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  9. eu vivo de poesia, Mª da Conceição, e é...maravilhoso!!!

    todos os dias constrúo um poema vivo d'amor, em toques de desconhecido...

    um bj poético

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  10. eu vivo aqui desterrada e job, num desejo de nunca ser eu! Cristo redentor, dá-me a tua luz para que a infâmia hostil não mais me persiga por ermos amaldiçoados do afrontamento peri-pós-atafonético manifestado pela minha incómoda opinião quando eu mesmo não tenho uma nem mesmotenho o que perguntar...

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  11. Quem, Maria da Conceição, que aqui se sente desterrada e um outro Job sofredor(agora fémina); quem não deseje ser si mesmo; quem ache que a sua opinião seja “incómoda” (ó, Eclesiastes, vem-me aqui em socorro: vaidade das vaidades!); ache mesmo que não tenha uma opinião sequer, e diz saber até que nada tem a perguntar; minha boa amiga, melhor fora que seguisse deveras o Cristo Redentor (com o Nome aqui tão, mais um vez, inutilmente invocado), em cuja luz diz acoitar-se e, àquela pergunta que ainda hoje ecoa (“Nada respondes? O que testemunham estes contra ti?”) como o de Kempis imitantemente fizesse e, na verdade, como o Cristo fizesse, que Tomás imita: “Jesus, porém, ficou calado.”(Mt. 26, 63).
    Nada se perderia, e a nossa excelente amiga não perderia outrossim mais uma boníssima oportunidade de nada dizer, ou melhor, de dizer nada ...
    Agradeceria, por certo, o Cristo Redentor, lá onde esteja (que em nada, cá me parece, pode ser acrescentado), e agradecem, sim, os que aqui estão, que aqui não vêm carpir lamentos nem lamentar "infâmias hostis" imaginárias.


    (Entrementes - assunto realmente sério-, aqui aponho errata do meu anterior comentário: onde se lê “vibro policromático”, deve evidentemente ler-se “vidro policromático”).

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