quarta-feira, 3 de setembro de 2008

"A saudade"

"Sedento bebo teu perfume e seguro teu rosto
com ambas as mãos, como quem segura
na alma um milagre.
Queima-nos a proximidade, olhos nos olhos, como estamos.
E contudo me sussurras: "Tenho tanta saudade de ti!"
Falas tão misteriosa e desejosa, como se eu estivesse
exilado em outro mundo.

Mulher,
que mares levas no peito, e quem és?
Canta ainda uma vez mais tua saudade,
por que te ouça
e os instantes me pareçam botões prenhes
de que florescessem de fato... eternidades"

- Lucien Blaga, 1919, in A Grande Travessia, selecção, tradução e introdução de Caetano Waldrigues Galindo, edição bilingue romeno-português, Brasília, Editora Universidade de Brasília, 2005, p.87.

Lucien Blaga é um dos mais eminentes filósofos e poetas romenos do século XX, sendo autor de quase quarenta livros. Foi diplomata em Portugal. É um poeta e pensador da saudade, tradução legítima do romeno "dor".

5 comentários:

  1. O que mostra que não há proximidade que redima a distância, não há presença que esgote a fundamental ausência de que somos feitos... Mas por isso mesmo os instantes podem florescer eternidade! A coincidência mataria o mundo e o espírito... Por isso a saudade é o mais sagrado dom! Celebremo-la sem temor!

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  2. Mergulha na ausência e serás salvo!

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  3. "Procuro, não sei o que procuro. Procuro
    um céu passado, a véspera extinta. Meu rosto
    vai tão baixo, que antes nos céus ia posto!

    Procuro, não sei o que procuro. Procuro
    auroras idas, que jorravam, inflamadas
    fontes — hoje com águas presas derrotadas.

    Procuro, não sei o que procuro. Procuro
    a grande hora que em mim restou sem figura
    como em um cântaro morto um fim de abertura.

    Procuro, não sei o que procuro. Sob estrelas de
    [ ontem,
    sob as que passaram, procuro
    a luz apagada que ainda enalteço."

    L.Blaga

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  4. Resposta da Mulher Saudades ao poeta Lucien Blaga.


    tentativa 1:

    Segura nas tuas mãos,
    nas tuas duas mãos,
    no rosto, os lábios sopram
    o mistério, o milagre
    da mais que humana e divina Saudade.
    E sussuro e confesso:
    sou Saudade, sou d'aquém
    sou d'além.
    E, se te exilo é porque te liberto de ti e d'aqui.
    Homem!
    Lança-te no mar dos meus olhos:
    nas torrentes das suas lágrimas, soantes e consoantes, do seu canto-pranto.
    Canto-a.
    Canto-nos.
    Num canto único, infundo,
    florescente, fosforescente.
    Ardemos em chamas.
    Afundamo-nos em lamas.
    Vem!
    É nas vozes que se afunda o que está guardado no nosso instante eterno.
    Ai as nossas vozes são chaves!
    As nossas vozes são aves:
    aves de fogo com que atravesso
    o teu olhar ardente,
    o teu corpo redolente.
    Ai! as nossas vozes são rimas,
    são cachos cheios para as vindimas!
    Homem!
    Sou néctar para a tua alma
    de mim embebida.
    Brinda-me com a tua voz de chama...
    Brindo-te com a minha voz que clama.
    Vem...

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  5. Divinal... e mais não digo.

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