Um espaço para expressar, conhecer e reflectir as mais altas, fundas e amplas experiências e possibilidades humanas, onde os limites se convertem em limiares. Sofrimento, mal e morte, iniciação, poesia e revolução, sexo, erotismo e amor, transe, êxtase e loucura, espiritualidade, mística e transcendência. Tudo o que altera, transmuta e liberta. Tudo o que desencobre um Esplendor nas cinzas opacas da vida falsa.
(...) tantra relacionado com a purificação do corpo, da fala e da mente através da transformação destes no corpo, fala e mente de uma divindade, neste caso Chakrasamvara (Heruka).
Jonh Peacock, O Caminho Tibetano de Vida, Morte e Renascimento, Plátano Editora, 2005, p.39
Num texto de Anacleto Oliveira publicado na página treze do jornal "Voz da Verdade" lê-se o seguinte:
"A resposta de Jesus é introduzida como uma verdade de fé: «Em verdade vos digo: Quem não acolher o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele». Neste caso, a criança passa a modelo a imitar. Mas não pela sua inocência ou simplicidade ou qualquer outra virtude moral, como tantas vezes se diz. Nada disso. A razão é só e exactamente a mesma que leva Jesus a dar-se a elas: a sua fragilidade e radical dependência. É nessa condição que elas se abrem ao dom, se confiam a quem lhes pode dar o que não têm e de que necessitam para viver. Por exemplo os pais."
Julgo que Anacleto Oliveira fala-nos de fé, da abertura de espírito - semelhante à abertura das crianças para com os seus pais, originada pelo seu sentimento de fragilidade e de dependência - que é preciso ter para ir ao encontro de Deus.
Em O Caminho da Grande Perfeição, o Mestre Patrul Rinpoche fala-nos de três tipos de fé, a fé vivida - "aquela que surge em nós por pensarmos na imensa compaixão dos Budas e dos grandes mestres", - a fé ardente - "a nossa ânsia de nos libertarmos dos sofrimentos dos reinos inferiores (...); o nosso anseio de desfrutar a felicidade dos reinos superiores", - e a fé convicta - "a fé nas Três Jóias que vem do fundo dos nossos corações quando compreendemos as suas qualidades extraordinárias e o poder das suas bênçãos".
Se por um lado concordo com o autor do artigo no que diz respeito à entrega, à abertura de espírito derivada pela dependência que o crente deve sentir em relação a Deus para se transcender e alcançá-Lo - processo que eu comparo à saudade que um sujeito cindido nutre por um objecto, alcançando o primeiro saúde ou, des-vendando este a sua natureza primordial, ao aliar-se ao segundo no Uno -, por outro lado duvido da existência desse Uno, desse sujeito e desse objecto pois Uno pressupõe a existência de uma essência e o que me parece é que as coisas simplesmente derivam de outras coisas precedentes através de um conjunto de causas e condições, sem que necessariamente haja uma essência, um uno no cerne (ou fora) do processo. Assim, creio eu, pensam os seguidores da via de Buda cujos Mestres apelam aos discípulos a verificação da verdade (se existe algo a que se possa denominar verdade...) por experiência própria.
Acredito também que essa dependência acima mencionada é causa de sofrimento pois o crente essencialista, todos os dias e toda a hora, com a infinita variabilidade de causas e condições que caracteriza o jogo do mundo, busca a essência, busca Deus, busca o imutável, busca o "peixinho doirado" no meio da grande tempestade marítima que é a vida e isso fá-lo sofrer constantemente pois "a mudança é a única constante da vida"; talvez se o crente se libertasse da dependência, das causas e condições que fá-lo tornar-se activo no jogo do mundo, dos véus kármicos geradores de apego e de aversão, ... Enfim, talvez se o crente se libertasse do "velho deus, afinal bem menor e muito mais ridículo, do nosso ego, incapaz de se ultrapassar, de se trespassar e morrer nessa suposta transcendência de tudo!?" - palavras do professor Paulo Borges que tão bem caracterizam o ilusório, ignorante e opressor sentimento de si - o crente, agora sim, assemelhar-se-ia mais a uma criança e estaria mais livre para entrar no Reino de Deus.
Sim, as crianças são dependentes dos progenitores; e creio que se as crianças são simples e inocentes - o que considero ser ainda mais relevante - é porque (ainda) se sentem ligadas à natureza, ao cosmos, ao "nada que é tudo" que Agostinho da Silva misticamente denominou Espírito Santo. Todavia a miudagem cresce e torna-se cada vez mais dependente, primeiro dos pais, depois do sucesso académico que consequentemente abrirá portas para a dependência do sucesso laboral... Ops! Peço desculpa aos bloguers deste site como muitas vezes tenho feito;) pois enganei-me: não são as crianças que se tornam cada vez mais dependentes... é o EGO que se torna cada vez mais dependente até ao dia em que o sucesso conquistado não servirá de nada como a glória não serviu de nada a Aquiles após aquilo a que muitas tradições religiosas consideram ser a única verdade: a morte.
Sendo tudo vazio "saído do vazio", só re.aprendendo o silêncio e o vazio podemos aprender a escutar. A escutar o que nos é dito e a assentir com um sorriso ou afastando-nos com o nosso silêncio. A dependência e a confiança, seja a das crianças, efectivamente entregando-se à sabedoria e sensatez de seus pais; seja a do homem adulto à renúncia ao ego e às muitas palavras que o impedem de uma escuta activa, no vazio de seu coração.
A fé, independentemente de que natureza ou tipo se revista ou a que Uno se dirija, a fé é uma entrega e um esvaziamento. Mas, paradoxalmente, é esse vazio que é pleno de centelha divina.
Esse vazio que é Tudo é... "Deus" e só no Vazio Ele se manifesta um Tudo/Nada.
Ser criança é estar disponível para Amar e ser Amada... ou não?
acho que ser criança é não sê-la, amando sem saber que se está a amar... Pela pouca experiência que tenho com crianças, vejo que elas melhor que ninguém sabem outrar-se nos seus jogos e brincadeiras, devendo a escola ser por isso o local onde os adultos deveriam reaprender a outrar-se sendo os mesmos...
A escola poderia ser muita coisa daquilo que não é.
Concordo consigo. Uma metáfora é sempre uma metáfora!...
Ao contrário da sua experiência, a minha sempre me pôs em contacto com as crianças.
O saber é ainda outra coisa... que nos daria outros tantos dedos de prosa...
Passo a vida a fazer isso! A "outrar-me"! Que não é outra coisa que o "despejar-me" do ser e do saber. Preparo-me para as "brincadeiras", respeitando a pausa e o vazio...
Silencio-me para compreender. Tento não interromper. "Pobre de Espírito" me encontro. Plenamente entrego à Vida a minha escuta.
Se viemos do Vazio para ao Vazio voçtarmos, para que foi... a Vida?!... Senhor KUNZANG, dê-me uma razão desta sua evidência, que profundamente me angustia! JCN
Caro Doutor Nunes, vou postar o seu soneto no meu blogue... Tocou-me imenso... O que foi a vida? Julgo que cada um sabe à sua maneira a resposta para essa pergunta... Quanto a mim... fico-me pela pergunta...
Ouvir Tulku Pema Wangyal cantar... Sentir o toque da mão cálida de um buda vivo... Permanecer numa sala repleta de gente perante Jigme Khientse Rinpoche em estado de samadhi... ler os evangelhos e meditar sobre as palavras de Jesus... fazer amor e deixarmo-nos preencher pelo continuum sonoro e luminoso... beijar a fronte de um bébé... beijar e dar a mão um idoso frágil e à beira da morte... abrir a janela para libertar uma mosca da sala... morrer compenetradamente na natureza primordial e moksha... fazer uma fogueira e queimar todo este palavreado vão...
(...) tantra relacionado com a purificação do corpo, da fala e da mente através da transformação destes no corpo, fala e mente de uma divindade, neste caso Chakrasamvara (Heruka).
ResponderEliminarJonh Peacock, O Caminho Tibetano de Vida, Morte e Renascimento, Plátano Editora, 2005, p.39
"Quem não acolher o Reino de Deus como uma criança não entrará nele"
ResponderEliminarMc 10,15
Diz-me tanto este texto do Evangelho de S. Marcos que, em pensamento, sempre me remete para Mestre Echart.
ResponderEliminar"Como uma criança" recebo esse texto.
Com um sorriso que retribuo:)
Desulpem a distração na grafia: "Mestre Eckhart".
ResponderEliminarNum texto de Anacleto Oliveira publicado na página treze do jornal "Voz da Verdade" lê-se o seguinte:
ResponderEliminar"A resposta de Jesus é introduzida como uma verdade de fé: «Em verdade vos digo: Quem não acolher o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele». Neste caso, a criança passa a modelo a imitar. Mas não pela sua inocência ou simplicidade ou qualquer outra virtude moral, como tantas vezes se diz. Nada disso. A razão é só e exactamente a mesma que leva Jesus a dar-se a elas: a sua fragilidade e radical dependência. É nessa condição que elas se abrem ao dom, se confiam a quem lhes pode dar o que não têm e de que necessitam para viver. Por exemplo os pais."
Julgo que Anacleto Oliveira fala-nos de fé, da abertura de espírito - semelhante à abertura das crianças para com os seus pais, originada pelo seu sentimento de fragilidade e de dependência - que é preciso ter para ir ao encontro de Deus.
Em O Caminho da Grande Perfeição, o Mestre Patrul Rinpoche fala-nos de três tipos de fé, a fé vivida - "aquela que surge em nós por pensarmos na imensa compaixão dos Budas e dos grandes mestres", - a fé ardente - "a nossa ânsia de nos libertarmos dos sofrimentos dos reinos inferiores (...); o nosso anseio de desfrutar a felicidade dos reinos superiores", - e a fé convicta - "a fé nas Três Jóias que vem do fundo dos nossos corações quando compreendemos as suas qualidades extraordinárias e o poder das suas bênçãos".
Se por um lado concordo com o autor do artigo no que diz respeito à entrega, à abertura de espírito derivada pela dependência que o crente deve sentir em relação a Deus para se transcender e alcançá-Lo - processo que eu comparo à saudade que um sujeito cindido nutre por um objecto, alcançando o primeiro saúde ou, des-vendando este a sua natureza primordial, ao aliar-se ao segundo no Uno -, por outro lado duvido da existência desse Uno, desse sujeito e desse objecto pois Uno pressupõe a existência de uma essência e o que me parece é que as coisas simplesmente derivam de outras coisas precedentes através de um conjunto de causas e condições, sem que necessariamente haja uma essência, um uno no cerne (ou fora) do processo. Assim, creio eu, pensam os seguidores da via de Buda cujos Mestres apelam aos discípulos a verificação da verdade (se existe algo a que se possa denominar verdade...) por experiência própria.
Acredito também que essa dependência acima mencionada é causa de sofrimento pois o crente essencialista, todos os dias e toda a hora, com a infinita variabilidade de causas e condições que caracteriza o jogo do mundo, busca a essência, busca Deus, busca o imutável, busca o "peixinho doirado" no meio da grande tempestade marítima que é a vida e isso fá-lo sofrer constantemente pois "a mudança é a única constante da vida"; talvez se o crente se libertasse da dependência, das causas e condições que fá-lo tornar-se activo no jogo do mundo, dos véus kármicos geradores de apego e de aversão, ... Enfim, talvez se o crente se libertasse do "velho deus, afinal bem menor e muito mais ridículo, do nosso ego, incapaz de se ultrapassar, de se trespassar e morrer nessa suposta transcendência de tudo!?" - palavras do professor Paulo Borges que tão bem caracterizam o ilusório, ignorante e opressor sentimento de si - o crente, agora sim, assemelhar-se-ia mais a uma criança e estaria mais livre para entrar no Reino de Deus.
ops... esqueci-me de mencionar o dia do jornal: 4 de Outubro de 2009...
ResponderEliminarO jornal que sai amanhã!?...
ResponderEliminarSim, as crianças são dependentes dos progenitores; e creio que se as crianças são simples e inocentes - o que considero ser ainda mais relevante - é porque (ainda) se sentem ligadas à natureza, ao cosmos, ao "nada que é tudo" que Agostinho da Silva misticamente denominou Espírito Santo. Todavia a miudagem cresce e torna-se cada vez mais dependente, primeiro dos pais, depois do sucesso académico que consequentemente abrirá portas para a dependência do sucesso laboral... Ops! Peço desculpa aos bloguers deste site como muitas vezes tenho feito;) pois enganei-me: não são as crianças que se tornam cada vez mais dependentes... é o EGO que se torna cada vez mais dependente até ao dia em que o sucesso conquistado não servirá de nada como a glória não serviu de nada a Aquiles após aquilo a que muitas tradições religiosas consideram ser a única verdade: a morte.
ResponderEliminar... só agora é que reparei na data... é o jornal de amanhã mas já está à venda...
ResponderEliminarKunzang, mas o autor deu-lhe o artigo a conhecer, antes do jornal sair? Era essa a minha questão.
ResponderEliminarAbraço
Ok. Já percebi.
ResponderEliminarCaro Kunzang,
ResponderEliminarSendo tudo vazio "saído do vazio", só re.aprendendo o silêncio e o vazio podemos aprender a escutar.
A escutar o que nos é dito e a assentir com um sorriso ou afastando-nos com o nosso silêncio.
A dependência e a confiança, seja a das crianças, efectivamente entregando-se à sabedoria e sensatez de seus pais; seja a do homem adulto à renúncia ao ego e às muitas palavras que o impedem de uma escuta activa, no vazio de seu coração.
A fé, independentemente de que natureza ou tipo se revista ou a que Uno se dirija, a fé é uma entrega e um esvaziamento. Mas, paradoxalmente, é esse vazio que é pleno de centelha divina.
Esse vazio que é Tudo é... "Deus" e só no Vazio Ele se manifesta um Tudo/Nada.
Ser criança é estar disponível para Amar e ser Amada... ou não?
O dia do jornal... é Amanhã?
Não... Comprei hoje o jornal na paróquia... não conheço o autor mas enviei um mail a informá-lo do comentário.
ResponderEliminarabraço
Bom!... devo ter demorado a escrever...~
ResponderEliminarJá o Paulo Borges (sempre atento!) tinha dado pelo lapso da data?
Cara Saudades,
ResponderEliminaracho que ser criança é não sê-la, amando sem saber que se está a amar... Pela pouca experiência que tenho com crianças, vejo que elas melhor que ninguém sabem outrar-se nos seus jogos e brincadeiras, devendo a escola ser por isso o local onde os adultos deveriam reaprender a outrar-se sendo os mesmos...
Caro Kunzang,
ResponderEliminarA escola poderia ser muita coisa daquilo que não é.
Concordo consigo. Uma metáfora é sempre uma metáfora!...
Ao contrário da sua experiência, a minha sempre me pôs em contacto com as crianças.
O saber é ainda outra coisa... que nos daria outros tantos dedos de prosa...
Passo a vida a fazer isso! A "outrar-me"! Que não é outra coisa que o "despejar-me" do ser e do saber. Preparo-me para as "brincadeiras", respeitando a pausa e o vazio...
Silencio-me para compreender. Tento não interromper.
"Pobre de Espírito" me encontro.
Plenamente entrego à Vida a minha escuta.
Um sorriso:)
Se viemos do Vazio para ao Vazio voçtarmos, para que foi... a Vida?!... Senhor KUNZANG, dê-me uma razão desta sua evidência, que profundamente me angustia! JCN
ResponderEliminarENTRE CRIANÇAS
ResponderEliminar(Para o senhor KUNZANG que, ao seu jeito e quando calha, também lida com as musas)
Lê-se nos evangelhos que Jesus
gostava do convívio das crianças
com as quais se entretinha, envolto em luz,
falando-lhes de um mundo de esperanças.
Olhando-o de soslaio os fariseus
fartavam-se, entre si, de o criticar
por se afastar dos hábitos judeus
na forma de as crianças abordar.
- "Como ele perde o tempo, vejam lá,
com estas criaturas que, ao crescer,
como serão... no dia de amanhã?"
- "Quem não tiver, vos digo, um coração
como o destas crianças, podeis crer,
ensejo não terá... de salvação"!
JOÃO DE CASTRO NUNES
Coimbra, 3 de Outubro de 2009.
Caro Doutor Nunes,
ResponderEliminarvou postar o seu soneto no meu blogue... Tocou-me imenso...
O que foi a vida? Julgo que cada um sabe à sua maneira a resposta para essa pergunta... Quanto a mim... fico-me pela pergunta...
Questão inspirada na dialéctica de Nagarjuna: como pode o vazio sair do vazio?
ResponderEliminar...
ResponderEliminarOuvir Tulku Pema Wangyal cantar... Sentir o toque da mão cálida de um buda vivo... Permanecer numa sala repleta de gente perante Jigme Khientse Rinpoche em estado de samadhi... ler os evangelhos e meditar sobre as palavras de Jesus... fazer amor e deixarmo-nos preencher pelo continuum sonoro e luminoso... beijar a fronte de um bébé... beijar e dar a mão um idoso frágil e à beira da morte... abrir a janela para libertar uma mosca da sala... morrer compenetradamente na natureza primordial e moksha...
ResponderEliminarfazer uma fogueira e queimar todo este palavreado vão...
(Seguindo o pensamento de Nagarjuna...)
ResponderEliminarSó porque as coisas são vazias é que elas podem existir.
O espaço não se altera por elas existirem.
As coisas configuram-se no espaço
As coisas, os fenómenos - para Nagarjuna -,não "corrompem" a vacuidade, adornam, por assim dizer, a vacuidade.
Assim, os fenómenos são vazio, saindo do vazio. Como?? De nenhum modo, pois que o vazio é não vazio saído do vazio e do não vazio...
A Vacuidade é a natureza de tudo, não o Vazio.
...
Tudo é uma fogueira.
ResponderEliminarAbraços
E nela de bom-grado nos queimamos, como a borboleta nerudiana atraída pelo fulgor das chamas. JCN
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