Observa então os objectos que advêm no exterior.
Mais enganadores que falsas aparências,
São, como a água de uma miragem,
Evidentemente um sonho, uma alucinação mágica,
Semelhante ao reflexo da lua na água, semelhante ao arco-íris.
No interior, observa a tua mente:
Mesmo que capte a atenção quando não cuidamos,
Examinando-a, a sua “própria natureza” não se pode encontrar;
Um nada que se faz passar por alguma coisa, vazio e transparente;
Não se o pode definir dizendo: “é isso !”,
Este quase-nada efervescente.
Contempla o que se mostra
Em cada um dos dez orientes:
Qualquer que seja o aspecto,
A Realidade, sua essência,
É a vacuidade, espírito do abismo.
Sendo todas as coisas da natureza do vazio,
Visto ser o vazio que observa o vazio,
Quem esvaziará o que há a esvaziar ?
A ilusão mágica é testemunha da ilusão mágica,
E o extravio observa o extravio:
A partir daí que fazer das numerosas categorias
Tais “vazio” e “não-vazio” ?
[...]
“Dualidade”, “não dualidade” e assim por diante,
Todos estes quadros, ficções extremistas,
Deixa-os, como os remoinhos de um rio,
Apagarem-se naturalmente em si mesmos.
- Nyoshül Khen Rinpoche [Tibete, 1932-1999), "O espelho das chaves” [excertos], Le Chant de l'Illusion et autres poèmes, traduzido do tibetano, apresentado e anotado por Stéphane Arguillère, Paris, Gallimard, 2000, pp.87-88.
Ou o texto originário é poeticamente muito mau... ou a tradução deixa muito a desejar. JCN
ResponderEliminarComo? Diga?...
ResponderEliminarHavemos de sempre dar-nos, caro JCN, um certo benefício da dúvida: na incerteza.
Será que leio bem?
Ou tresleio-me em tropeço?
O problema é da linguagem: traduz sempre muito mal o silêncio.
ResponderEliminarBem me queria... parecer! JCN
ResponderEliminarO reflexo do real na água não é senão a aparência, assim se observamos a mente não a podemos encontrar em parte alguma: ela é como o reflexo na água: "espírito do abismo.
ResponderEliminarUm vazio a olhar outro vazio é o "espírito do abismo" que, tal como a agitação das águas há-de parar, assim a nossa mente, deixará de querer apreender a realidade.
Deixará, então, de haver necessidade de distinguir "dualidade" e "não-dualidade". Ambos serão movimento que se extinguirá.
Belo é, se observado, esse reflexo.
Será a Beleza distinta da Verdade?
Abraço.
E a Poesia? Será o Vazio?
o Bom e/ou o Mau?
Um quase-nada efervescente?
Adoro a incerteza, senhor Damien, porque
ResponderEliminaré a porta aberta... para todas as dúvidas! JCN
Talvez o vazio seja o espaço por entre as palavras. Quem sabe se dele nada se pode, nem deve, dizer. Nas nossas vidas, o espaço deixado em aberto pela perda do abandono. A perda do abandono é um vale de lágrimas: que é este vale senão amor? E o que é o amor senão aquilo que os poetas, escritores ou não, tentam desde sempre infrutiferamente dizer? E, apesar de o não dizerem, anunciam-no. Lá estou eu a tentar escrever palavras belas e com sentido; mas se o sentido não está nas palavras...
ResponderEliminarNunca ouvi nada tão certo, "saudadesdofuturo": não há distinção... entre Beleza e Verdade! Foi a resposta que Cristo negou a Pilatos e Sócrates aos seus discípulos que na morte o assistiram. É o lema do meu viver: Verdade com Beleza. E vice-versa. O resto... vem por acréscimo. O som do violino! JCN
ResponderEliminarIncertezas dessas, num poeta, soam (não lhe parece?) a dúvida imetódica, caro JCN.
ResponderEliminarDo Lema à consumação do lema vai, creio, a distância (que não houve) desde o pré-eterno Silêncio de/em Deus à unção de Silêncio com Yeschua de Nazareth "crismou" a abísmica invirtude da pergunta de Pilatos.
ResponderEliminarEla (e o que nela havia no "há") ela o fez, nisso de perguntar, como desiderato da hesitação - num trespasse que rasgou todos os tempos e questões de havê-lo e haver Isso -, ela fez Pilatos ser o involuntário e extreme lugar impotente da pergunta|resposta sem teor: isso de que é feito, precisamente, o de que aqui falamos melhor calando, e de que melhor falamos calando.
Será que realmente Pilatos pergunta para saber a Verdade ou para cumprir sem remorso a sentença de morte. "És tu o Rei dos Judeus?" foi a pergunta que terá quebrado o Silêncio de Yeshua.
ResponderEliminarQuanto à resposta... pois vem de Jesus em forma de desafio... sobre as perguntas que não têm resposta... Pilatos responde "lavando as mãos". Embora a Verdade se lhe atormentasse em dúvidas... Dizendo-se rei do que "não é deste mundo", Jesus alimenta a dúvida de Pilatos que questiona a possibilidade de em Cristo haver Verdade.
Ainda assim... lhe não acha motivo de morte...
JCN! Eu não afirmei nada, perguntei. Não por ser "Pilatos", mas por ser humana a linguagem que uso e... deste mundo... que não sei ser Silêncio.
Querendo apenas sê-lo em Poesia que diz calando o que cala escutando...
À falta de certezas... vivo de esperanças como se certezas fossem sob o rótulo de místicas. O que aceito, senhor Damien, é boiar no vazio... sem para-quedas. Assusta-me! JCN
ResponderEliminarCorrijo a expressão "O que aceito", que saiu truncada, em vez de "O que não aceito". Desculpem a desatenção. JCN
ResponderEliminarEstou em crer, "saudadesdofuturo", que quando Pilatos perguntou a Cristo o que ele entendia ser a Verdade ("E o que é a Verdade?") foi mesmo para se inteirar da sua essência... na melhor das intenções, pergunta a que Cristo se furtou... permanecendo calado. A mesma pergunta que um dos seus discípulos fez a Sócrates à beira da morte, altura em que não se mente nem se dissimula. O filósofo limitou-se a tapar o rosto com o manto e, quando lho retiraram, já se encontrava morto. O que é realmente a Verdade ?!... Permita:
ResponderEliminarApesar de sempre andar
na boca de toda a gente,
a verdade é tão-somente
um termo vocabular.
Quem podia revelar
o seu sentido imanente,
o que ela é concretamente,
furtou-se... a nos informar.
Segundo certos relatos,
o sofista ateniense,
no que disse, não convence.
Até o próprio Jesus
preferiu morrer na cruz
a responder a Pilatos!
JOÃO DE CASTRO NUNES
Lemas são lemas, senhor Damien, e nada mais que lemas. Ponteiros da bússula apontando o norte. Nada mais do que isso. Que se cumpram... bom é que sim. Tudo há que fazer! Outros de mais valimento... falharam nos bons propósitos. Em que deu o DÉSIR do Infante das sete partidas? E o TALENT DE BIEN FAIRE do Navegador, que nem sempre procedeu com recta intenção? E o IL ME PLAIT do mártir de Fez... morrendo inconformado? E o POUR BIEN do pai de todos, o qual nem sempre andou pelos melhores caminhos da virtude conjugal?... Pelo meu... respondo eu... "tant bien que mal" e, seguramente, mais mal que bem. Mas foi o que escolhi: BELEZA e VERDADE. Ao som do violino. "Ad astra"! Sonhar em grande. A mira inatingível! JCN
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