http://www.youtube.com/watch?v=HwkltB3kzS8 - Uma versão de uma música lindíssima de Suzanne Vega.
http://www.youtube.com/watch?v=ZbwJarFL1c8 - A "Sonata ao luar", com a comovente história de como a música surgiu.
"(...) Despe a mente", comentário anónimo na noite serpentina.
Como responder à pergunta que não se consegue formular?
Fragmento anónimo, séc. 40 a.C.
O mundo está cheio de ódio e não devemos querer mudá-lo por inteiro para o bem ou para o mal o que em qualquer dos casos faria de nós ditadores, sujeitos megalómanos com vontade de controlo e que têm vontade de sobrepor a sua vontade a tudo. Muitas vezes não se trata de ter vontade de sobrepor a nossa vontade a tudo, mas do impulso cego de o fazer e é esse impulso que devemos eliminar, mas como? Libertando-nos de todas as concepções porque delas nascem as obsessões. Limitando-nos a respirar para que assim nos ilimitemos porque enquanto nos sentirmos limitados sentir-nos-emos presos e enquanto nos sentirmos presos teremos vontade de sair do cárcere e enquanto tivermos vontade de sair do cárcere espernearemos em todas as direcções e sentidos e enquanto o fizermos estaremos perdidos e enquanto estivermos perdidos navegaremos de mar em mar, de navio em navio, de noite em noite, de sonho em sonho, de ilusão em ilusão, de busca em busca sem busca - que buscas? Buscas-te? Buscas-me? Esquece a busca e sê tu mesmo que isso também se aprende. Liberta-te de tudo o que te atormenta e explode de uma vez por todas. Mais não te posso dizer, só tu poderás senti-lo.
ResponderEliminarPor que há tanto ódio e preconceito no mundo? Por que há tanta raiva? Por que há tanto ardor e vontade de magoar? Por que há tanta vontade de destruir? Por que há tanto desespero? Por que há tantos gritos e tantas lágrimas que ecoam eternamente na noite sem fim? Por que há tanto sofrimento? Por que é que existe este mundo cheio de sofrimento? Por obra de quem? Por que causamos tanto sofrimento a nós próprios? Por que nos destruimos, por que fazemos tanto mal a nós mesmos? Por que sentimos tanta dor dentro de nós?, como algo que nos enche o peito e sufoca até à garganta pedindo para sair? Andas de sonho em sonho subindo às maiores alturas apenas para caires no abismo da noite uma vez e outra e outra porque não são esses sonhos que persegues. Não persigas sonhos porque os sonhos são como fantasmas - acreditas em fantasmas? Então acredita também que todos os sonhos são ilusórios e ingratos: o mundo não te vai agradecer por nada porque como sabes "o universo não tem afeições humanas". Resta-te não sonhar e ser; não sonhes, sê. Sê o sonho que não sonhas. Sê o sonho do respirar. Sê o sonho da vida. Caminha, literalmente. Fala. Viaja. Não queiras ser Deus porque é um lugar muito solitário. "Bem vindo ao deserto do real".
ResponderEliminarUm dia és isto, outro és aquilo, outro ainda és aqueloutro, e dizes a ti mesmo "agora sou iluminado", "agora sou acrata", "agora sou aquilo que acredito ser", quando não chegas a ser nada disso. Não chegas a ser nada disso porque não acreditas em nada disso, porque não sabes em que acreditar. Dizes que agora és e tentas definir-te dizendo que és qualquer coisa, quando és nada. És ninguém. És zero, inexistente, embora os teus passos - relaxa - fiquem gravados na memória do mundo: todos ficam. Não porque deixes cá algo de ti, mas porque estiveste aqui e o mundo lembra-se de tudo, embora não se lembre de ninguém. "Passa tempo passa, cai fundo no esquecimento" - cai no cinzento do esquecimento, vive-o, sê como as pedras, sê como a chuva, sê como o frio, sê como a noite, sê como a noite que permeia o meio-dia, sê luz e sê escuridão, sê terra e sê mar, sê areia, sê vento: estás em todo o lado, mas estás (ou pensas que estás) num só sítio. Transforma-te em elemento e percorre a Terra pelo seu interior de uma ponta à outra, contorna-a pelo espaço escuro, e desce. Chora a tua humanidade, mero mortal. "Levanta-te e anda".
ResponderEliminar"Dá tudo o que tens e segue-me" - percebes? Significa "dá tudo o que tens e segue o meu exemplo". Que exemplo é esse? É um exemplo de entrega até ao fim. É um exemplo de amor. Amor por tudo e por todos. Esquecimento de si. Cristo não existe para si mas para os outros, até para os animais, para o burro a que carinhosamente chama "jumentinho". Cristo pode estar morto, sim, mas a sua memória sobrevive para sempre, e o seu exemplo vive em nós para sempre. "Morreu o melhor de todos os homens". Sócrates é mais racional e Cristo é um homem de afectos. Sócrates é um mestre da lógica e Cristo é um mestre da ética. Esquece a lógica e a ética: Cristo é um mestre do amor. "O melhor" é um julgamento que Platão faz sobre Sócrates. Esquece Platão e lembra-te de Sócrates - o seu exemplo é o da arte da parteira. Esquece tudo ("dá tudo o que tens") e parte ("segue-me"). Mas "segue-me", não partas só, não fiques só, como Paulo não viajava só - nisso concordam com Aristóteles e não são cínicos. Mas se Aristóteles defende que a melhor vida é a contemplativa! Como pode o ser humano ser dotado para a convivência e a melhor vida ser a contemplativa? Som e silêncio, inspiração e expiração. Mesmo os monges contemplativos têm momentos de comunhão, até o Super-Homem desce da montanha. Mas este tem de descer da montanha e por isso não queiras sê-lo. Liberta-te do super-homem que há em ti (lol).
ResponderEliminarSão Francisco levou à letra o que leu e deu tudo o que tinha. Mas dedicou-se aos outros, como Madre Teresa. Quem dá tudo o que tem ou "fica" com os outros ou fica só. Corremos o risco de nos perdermos no que temos e no que queremos ter. O que possuimos pode possuir-nos - a vida possuída por uma coisa sem vida? Por um pedaço de papel ou madeira? ("what was wood became alive") Nós é que nos possuimos como se fossemos outro. Incorporamos o papel e a madeira em nós, pelo intelecto, e com essa ideia nos possuimos, carrascos de nós mesmos, o que não implica que todas as ideias nos possuam. Mas desde sempre o ser humano teve vontade de se libertar. E não é a vontade que é necessariamente má, mas o ser humano que desde sempre se sentiu preso. Não no corpo, mas na ideia do corpo, porque é do pensamento que vem o sentimento de prisão e não do corpo que nada pode (e aqui contrario Bakunine). A prova que nada pode é que acaba por ficar imóvel, frio e sem capacidade de resposta a estímulos. A prova contrária é que antes se movimenta, é quente e responde. O corpo sem mente é como uma pedra. A mente sem corpo é uma mera possibilidade. Mas de que interessa uma mente sem corpo, fechada em si mesma, ao outro, ao mundo, aos sentimentos? A menos que, como Brahman, sonhe esquecida de si e "viva" os mundos que sonhe, eternamente, sem qualquer tipo de ingratidão que não a que advém de viver.
ResponderEliminarTudo é memória e tudo é passagem porque o que acontecerá amanhã um dia terá passado e tudo um dia terá passado e mais não será que memória. Olhamos para trás e tudo o que sobra são sombras, sorrisos, ecos, abraços, "corpos suados". Teremos tempo para perguntar se valeu a pena? Que interessa, se tudo é passado? Que interessa viver focado no passado? Que interessa viver focado no futuro? Interessa viver focado no presente? Interessa viver focado? Sobre o passado reflecte-se, sobre o futuro sonha-se, sobre o presente reflecte-se ou vive-se. Mas o que é viver? Como viver? Pode-se viver de muitas maneiras, irreflectidamente... mas "uma vida irreflectida não vale a pena ser vivida". Não interessa tanto o prazer quanto a libertação. a libertação é a catarse: a emoção libertadora que advém do choro ou da arte (ou através desta). E o esquecimento: libertação e esquecimento. Esquecimento como quando nos embrenhamos em algo (a escrever). Libertação como quando nos esquecemos. São as duas formas de libertação. O próprio acto compassivo é um acto catártico. É um acto de comunhão. Na comunhão já não somos nós, mas não somos o outro, nem o outro é ele nem nós: somos algo novo que se criou e que existe entre os dois e nenhum dos dois existe.
ResponderEliminarNuno, penso que a pergunta que o autor quer formular é a seguinte: o que subjaz? O que subjaz a todos os teus pensamentos e momentos de paz e intempérie, que coisa é essa a que tudo está ligado, ora desligado ao desaparecer ou ficar nos "palácios da memória", que coisa é essa a que decidiram chamar "consciência"? Penso que o autor não fala tanto da consciência, já que a consciência é de algo, mas do núcleo a que se ligam os vários elementos que vão aparecendo e desaparecendo. Não é a mente como um todo, não é a mente, talvez seja aquilo a que decidiram chamar "eu" ou talvez seja aquilo que está até para lá do eu, um núcleo negro, esfera perfeita a que os elementos se ligam como raios, e tu sabes que "é o vazio do centro da roda que permite o movimento", e isso é o substrato. Está para lá do eu, é o silêncio para lá de todos os fenómenos, a cola ontológica. Não existe cola ontológica entre o substrato e os elementos que se ligam e desligam, o substrato é a cola. O próprio eu é já uma criação do pensamento, uma ideia. O substrato está para lá das ideias, as ideias estão no substrato. Não sabemos se são mónadas, se está em todo o lado e é um e imóvel. Sabemos que podemos pensá-lo, imaginando-o, ou pelo menos descobrindo a sua existência embora não o consigamos definir. Claro que não pode ter a propriedade de não ter propriedades, mas tem de ser algo! "Não é o que vê, mas o que permite a visão; não o que ouve, mas o que permite a audição"... não o que existe mas o que permite a existência? Possibilidade de todo o ser. Sendo todas as possibilidades, é infinito, incondicionado, tudo nele pode acontecer. De facto, tem de existir algo incondicionado - mas se tem de existir, como pode ser incondicionado? Não lhe podemos atribuir nenhuma propriedade que não a liberdade, pura, total, mas será que é livre o que não tem vontade? Daí Deus afirmar "Faça-se", porque os hebreus põem Deus como vontade pura para que seja livre. Mas a própria vontade está sujeita a ser vontade, só pode querer. A vontade não pode não querer. É condicionada. A moralidade, por sua vez, pode escolher e condicionar a vontade. E ainda assim é condicionada pelas opções que tem. A imaginação tem de imaginar e a necessidade tem de ser. O incondicionado tem de ser incondicionado. E o ser só liga o objecto ao seu conceito. No início está o objecto - sujeito e conceito só depois surgem -, o indefinido, o indefinível, a pedra, o cinzento, o frio, o mundo: o outro. Não a outra pessoa, porque aí não há pessoas, mas a outridão. Só podemos definir o princípio como outridão. O que quer que encontres, o princípio não é isso, é outro. Por isso vamo-nos libetando de tudo pela teologia negativa embora não cheguemos a lado algum que não à consciência da escuridão que subjaz a todas as coisas. E aí encontramo-la imóvel, omnipresente e inexistente como o vento.
ResponderEliminar"Tu és isso" - tu não és isto, mas isso, outro.
ResponderEliminar"E assim vimos Deus nos nossos olhares e tomámo-nos como divinos".
ResponderEliminarGrato pelas palavras anónimo! Só uma correcção: embora te foques em Brahman, é Brahma que sonha. Beijinhos.
ResponderEliminarToma, talvez encontres aqui fonte de inspiração:
http://www.youtube.com/watch?v=IILkfCk47D0&feature=related
Que irrupção sábia e reflexiva a deste anónimo nocturno! Abençoadas as insónias! Volte sempre.
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