Klimt virá porque terá de vir, e sobre o ouro dos vestidos derramará o pó de estrela com que vestiremos anjos que, saídos da jarra onde estiveram a secar as asas, vieram do jardim para outro jardim. Nele vêem-se os que em vigília são sentinelas. Sentinelas de pé no alto da torre, a receber o vento nas faces; a brisa nas pálpebras. No jardim que não há vêem-se no alto das quatro torres, anjos gigantes a devolver o grito mudo ao som do horizonte, a soltar as suas plumas no pano azul da seda deste céu e deste véu. Na torre as damas de preto são sons ouvidos ao longe, devolvidos em eco ao gesto de uma flor. Uma flor frágil no seu caule estreito. A sua taça de mel para as abelhas e os pássaros, um aclarar na voz calma do poeta.
O olhar de Klimt é como um ramo de rosas de oiro oferecidas ao vento. O vento traz do deserto o coração e a esperança. O Coração que é uma flauta angustiada a ferir a Primvera e os que escutam entre as grutas de pedra e os lagos, que hoje anoitecem mais cedo, entre juncos.Não há distância para a clareira de Deus. E o espírito que adeja sobre as pedras, será o nosso corpo como uma estátua a voar sobre a cabeça partida de uma hera a compor o muro. A folha de palmeiras de luz chama a Senhora da Noite. Ela apaga as lembranças que há na terra e os desenhos que estão no céu e ateia a cor aos frutos. São pombas que nascem das pontas de uma estrela, os olhos mansos da noite. Contavam do rito de um templo de luz sem tempo. Tinham dito que a pedra é uma possibilidade de luz, como um poema, e os vitrais que se abrem para o mar são o espinho e a rosa de uma aria mais alta ecoada na estação do ano em que as pedras dão flores só para quem viu nascer a for do sal entre os cabelos; e o jardim um barco por fora da paisagem das rosas e dos cheiros que embriagam.
Aqui é um lugar onde o tango se dança de olhos fechados. Como a cósmica noite e o eterno espaço perduram para sempre. Aqui é só uma noite e talvez o meu peito seja um só rio de duas margens. É-o, decerto, que o sinto correr desenfreado, cheio de suas águas e do seu amor. E prender essa força que teima em jorrar em palavras torna-se impossível. E uma nostalgia tão funda me entra nas veias que elas bem poderiam ser sal de lágrimas em vez de sangue. Ou será o mar? O mar a quem fechassem as comportas, por dentro do peito de águas a galopar. Oiço. Dentro desse terreno limpo de águas oiço um grito parado no ar. Um grito adormecido debaixo do céu.
Tinha-te dito que uma palavra não chega para salvar uma alma e tivemos que despir mais e mais a nossa nudez; ir até ao osso, à pedra de esmeril; ao toque de um bordado de linho na mesa de uma ceia repetida até ao fogo de um vinho que embriaga o corpo. A dança do último tango milongueiro na clareira da floresta. Mas antes o silêncio envolvera todos os frutos do seu guardar, a cor no brilho de asas, as de sal cobertas, flores silentes entre os dedos.Os pincéis de Klint são folhas que rodam e caem na superfície branca do papel pintado, mas o ouro é sobre a pele e sobre a paisagem. Um espalhar de Fogo cobre as pedras, pó de estrelas a cobrir os canteiros e os astros.
Klint onde estiver - para voltar ou não - há-de sentir orgulho de ter pintado a sua Primavera
ResponderEliminarAmigo Platero,
ResponderEliminarUm beijo de oiro para ti.
Klimt, o meu favorito, a noite e a solidão, as flores e o tango e o pó de estrelas que sou... e a nostalgia que tenho de tudo o que não sei. Gosto do que escreve e ajuda-me a passar os dias, bem-haja...
ResponderEliminarCara Fernanda,
ResponderEliminarAo ler o seu comentário fico na dúvida sobre o que devo pensar das suas palavras e também do que escrevo por aqui e por ali...
Se é para ajudar a passar o tempo... se é para se gostar... gosto é gosto... não percebo!
Que tempo ajuda a passar? O que é o tempo? Para que queremos que ele passe? O tempo é para "passar"?
Não há tempo. Haverá continuidade, nisso a que chamamos tempo?
O oiro , as flores e o tango serão apenas "o oiro", "as flores" e "o tango"? Klimt reduz-se ao pintor favorito de alguém?
A nostalgia do que se não conhece?
Não será antes uma memória de deus?
Estranho o seu comentário! Sem querer, levou-me a repensar muita coisa. Isso deixou-me com um gosto de tristeza na boca. Uma lágrima, talvez, um desalento fundo...
Grata por isso.
Bem-haja!
Obrigada.
Olá Saudades
ResponderEliminarNão sou da filosofia sou das pedras e da terra e procuro nelas as origens, por vezes (muitas) sinto que não procuro nada, sou só feliz (e em nada penso) quando remexo na terra e as encontro (as pedras) ao tê-las sinto-me em comunhão com quem as trabalhou noutros tempos que não os de agora...
Gosto de Klimt porque ele me faz feliz como nenhum outro...
gosto de tango por me deixa com um aperto no coração que não sei o que sinto mas é bom e faz-me lembrar Jorge Luís Borges...
gosto de estrelas e do Universo... de cores....de flores e árvores... de César Vallejo e Pablo Neruda... Agostinho da Silva... Bach e Wagner...
gosto de gatos ... do eterno retorno ... do Tibete e do Butão... gosto de meditar e do Dalai Lama...
Tenho vindo a descobrir neste blog outros autores(alguns já conhecia mas pouco, outros são uma autentica descoberta), para mim a sua escrita é como descobrir algo quando remexo a terra... sinto-me bem e feliz e é nesse sentido que me ajuda a passar os dias ...
A nostalgia de mim que(des)conheço quem sou? para que vim? Qual o Caminho?
Obrigada pelo comentário
Será pouco, ajudar a passar os dias!?...
ResponderEliminarSó de gatos! E os outros serezinhos todos, Fernanda? Gostei de saber que gostas de nós, mas os outros também precisam de ti ...
ResponderEliminarOlá Fernanda,
ResponderEliminarAgradeço. Também não sou da Filosofia. Nem sei se "sou" de alguma coisa... A sua
resposta elucidou-me bastante mais do que o seu comentário inicial que me pareceu(desculpe)um pouco "superficial". Já vi que não. Pois se é tão positiva e aberta,a sua alma,a tão vastas e variadas impressões dos sentidos e também a alguma vibração positiva que a escrita que aqui deixo possa trazer-lhe, só posso sentir-me grata por isso.
Um abraço, então, Fernanda que gosta da vida e que se vira para as origens, sem esquecer que a terra tem um gosto e um sabor únicos e que para ser feliz é preciso ser-se simples e inteiro no que se faz.
Um abraço.
Olá Bastet
ResponderEliminarGosto de todos os bichos (as baratas respeito-as pela idoneidade de cerca 400 milhões de anos de evolução ...) mas são os gatos que me enternecem e que fazem parte da minha vida... como deusas em casa partilho o espaço com 3 delas: a Inês, a Rita e a Brida ...
Isso mesmo, Fernanda! Não somos só nós, os gatos...
ResponderEliminarSorriso.
Que um espalhar de Fogo coma as pedras que também somos.
ResponderEliminarBastet, o gato da feira dos imortais? é já muita banda desenhada.
ResponderEliminarQue esse Fogo nos devore!
ResponderEliminarUm abraço e um sorriso:)
Vou-me, 'imortalizar' em ti, Homem de Papel! Deixas-me fazer um desenho? ...
ResponderEliminarVenham para aqui fazer desenhos, venham!...
ResponderEliminarSim, porque não? Já sou crescidinha... tenho 23 anos, já sei desenhar!
ResponderEliminaranónimo és parvo?
ResponderEliminarMafalda a imortalidade não existe só a ausência.
Mafalda fugiu com Manolito!
ResponderEliminarJá registámos a sua "ausência" ...
o manelito é filho de merceiero, isto está mais para banqueiros.
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