Palavras de Krishnamurti
«A mente religiosa difere completamente da mente que crê na religião»
«Em todas as páginas deste livro, o que sempre nos interessou foi a realização, em nós mesmos e, por conseguinte, em nossas vidas, de uma revolução total fora da estrutura social ora existente. A sociedade, como atualmente está constituída, é uma coisa horripilante, com suas intermináveis guerras de agressão - não importa se agressão defensiva ou ofensiva. Necessitamos de uma coisa totalmente nova, de uma revolução, uma mutação na própria psique. O velho cérebro nenhuma possibilidade tem de resolver o problema humano das relações. O velho cérebro é asiático, europeu, americano ou africano, e, assim, interrogamos a nós mesmos se é possível operar-se uma mutação nas próprias células cerebrais.
Investiguemos, também, agora que chegamos a compreender-nos melhor, se é possível a um ente humano que vive sua vida normal de cada dia, neste mundo brutal, violento, cruel - um mundo que se está tornando cada vez mais eficiente e, por conseguinte, cada vez mais cruel - se é possível a esse ente humano promover uma revolução não só em suas relações externas, mas também em toda a esfera do seu pensar, sentir, agir e reagir.
Todos os dias vemos ou lemos coisas aterradoras que estão acontecendo no mundo, como resultado da violência no homem existente. Podeis dizer: "Eu nada posso fazer a esse respeito", ou "Como posso influir no mundo?". Eu acho que podeis influir no mundo de uma maneira admirável se em vós mesmo não sois violento, se viveis realmente, em cada dia, uma vida pacífica, uma vida sem competição, sem ambição, sem inveja, uma vida não causadora de inimizade. Pequenas chamas podem tornar-se em incêndio. Reduzimos o mundo ao seu atual estado de caos com nossa atividade egocêntrica, nossos preconceitos, nosso nacionalismo, e quando dizemos que nada podemos fazer a tal respeito, estamos aceitando como inevitável a desordem em nós mesmos existente. Partimos o mundo em fragmentos e, se nós mesmos estamos partidos, fragmentados, nossa relação com o mundo será também fragmentária. Mas se, quando agimos, agimos totalmente, então a nossa relação com o mundo passa por uma enorme revolução.
Afinal de contas, todo movimento que vale o esforço, toda ação de profunda significação, tem de começar em cada um de nós. Eu tenho de mudar primeiro; tenho de ver qual é a natureza e a estrutura de minha relação com o mundo - e no próprio ato de ver está o fazer - por conseguinte, como ente humano que vive neste mundo, devo criar uma coisa diferente, e essa coisa, a meu ver, é a mente religiosa.
A mente religiosa difere completamente da mente que crê na religião. Não podeis ser religioso e ao mesmo tempo hinduísta, muçulmano, cristão, budista. A mente religiosa nada busca, não pode fazer experiências com a verdade. A verdade não é uma certa coisa ditada por vosso prazer ou vossa dor, ou por vosso condicionamento hinduísta - ou qualquer que seja a religião a que pertenceis. A mente religiosa é um estado de espírito em que não há medo e, por conseguinte, não há crença de espécie alguma, porém, tão-só o que ê, o que realmente é.
Na mente religiosa há aquele estado de silêncio que já examinamos, que não é produzido pelo pensamento, mas é oriundo do percebimento, ou seja da meditação com completa ausência do meditador. Nesse silêncio há um estado de energia isento de conflito. Energia é ação e movimento. Toda ação é movimento e toda ação é energia. Todo desejo é energia. Todo sentimento é energia, todo pensamento é energia. Todo viver é energia. Toda vida é energia. Se se deixa essa energia fluir sem nenhuma contradição, nenhum atrito, nenhum conflito, ela é então ilimitada, infinita. Quando não há atrito, não há limites à energia. O atrito é que dá limites à energia. Assim, percebido isso, por que é que o ente humano sempre introduz o atrito na energia? Por que cria atrito, nesse movimento a que chamamos vida? A energia pura, a energia ilimitada é para ele apenas uma idéia? Não tem realidade?
Necessitamos de energia, não só para promovermos a revolução total em nós mesmos, mas também para podermos investigar, olhar, atuar. E, enquanto houver atrito, de qualquer natureza, em qualquer de nossas relações, seja entre marido e mulher, seja entre um homem e outro, entre uma e outra comunidade, ou uma e outra nação, ou uma ideologia e outra - se há qualquer atrito, interior ou exterior, em qualquer forma, por mais sutil que seja - há desperdício de energia.
Enquanto houver um intervalo de tempo entre o observador e a coisa observada, esse intervalo criará atrito e, por conseguinte, desperdício de energia. Essa energia se acumula até o mais alto grau quando o observador é a coisa observada, e nisso não há nenhum intervalo de tempo. Haverá então energia sem motivo, a qual encontrará seu próprio canal de ação, porque, então, o EU não existe.
Necessitamos de uma enorme abundância de energia para compreender a confusão em que estamos vivendo, e o sentimento "tenho de compreender" produz a vitalidade necessária para a compreensão. Mas, o descobrir, o investigar, implica o tempo, e, como já vimos, o gradual descondicionamento da mente não é a maneira certa de proceder.
O tempo também não é o caminho certo. Quer sejamos velhos, quer jovens, é agora que o integral processo da vida pode ser levado a uma dimensão diferente. A busca do oposto do que somos não é, tampouco, o caminho certo e também não o é a disciplina artificial imposta por um sistema, por um instrutor, um filósofo ou sacerdote; tudo isso é muito infantil. Ao percebermos isso, perguntamos a nós mesmos: "Será possível libertarmo-nos imediatamente desta secular e pesada carga de condicionamento, sem cairmos noutro condicionamento - sermos livres, com a mente completamente nova, sensível, viva, alertada, intensa, capaz?". Eis o nosso problema. Não há outro problema, porque, quando a mente se renova é capaz de enfrentar e resolver qualquer problema, É essa a única pergunta que temos de fazer a nós mesmos.
Mas, nós não a fazemos. Preferimos ser ensinados. Um dos aspectos mais curiosos da estrutura de nossa psique é o querermos, todos nós, ser ensinados, porquanto somos o resultado de uma propaganda de dez mil anos. Queremos ver o nosso modo de pensar confirmado e corroborado por outrem, ao passo que fazer uma pergunta é fazê-la a nós mesmos. O que eu digo tem muito pouco valor. Vós o esquecereis no mesmo instante em que fechardes este livro, ou vos lembrareis de algumas frases, as quais ficareis repetindo, ou comparareis o que aqui lestes com o que lestes noutro livro; não quereis olhar de frente a vossa própria vida. E só ela é que importa: a vossa vida, vós mesmo, vossa mediocridade, vossa superficialidade, vossa brutalidade, vossa violência, vossa avidez, vossa ambição, vossa diária agonia e infinito sofrer; é isso que tendes de compreender, e ninguém, nem na terra, nem no céu, pode salvar-vos, senão vós mesmo.
Vendo tudo o que se passa em vossa vida diária, em vossas atividades cotidianas, quando escreveis, quando falais, quando sais de carro ou passeais a sós numa floresta, podeis, num só alento, num só olhar, conhecer a vós mesmo, muito simplesmente, tal como sois? Quando vos conhecerdes como sois, compreendereis então toda a estrutura da luta do homem - seus embustes, suas hipocrisias, sua busca. Para tanto, tendes de ser sumamente honesto perante vós mesmo, em todo o vosso ser. Quando agis de acordo com vossos princípios, estais sendo desonesto, porque, quando agis conforme o que julgais ser correto, não sois o que sois. É uma coisa brutal - ter ideais. Se tendes ideais, crenças ou princípios de qualquer espécie, não podeis de modo nenhum olhar-vos diretamente. Portanto, podeis ser completamente negativo, manter-vos inteiramente tranqüilo, sem pensar, sem temer, e ao mesmo tempo estar extraordinariamente, apaixonadamente, vivo?
Aquele estado em que a mente já não é capaz de lutar constitui a verdadeira mente religiosa, e, nesse estado mental, podeis encontrar-vos com essa coisa denominada verdade ou realidade ou bem-aventurança ou Deus ou beleza ou amor. Essa coisa não pode ser chamada. Por favor, compreendei esse simples fato. Ela não pode ser chamada, não pode ser buscada, porque vossa mente é tão estúpida e limitada, vossas emoções tão vulgares, vossa maneira de vida tão confusa, que aquela imensidade, aquela coisa ilimitada não pode ser chamada a vossa pequena casa, ao insignificante canto em que viveis, tão pisado e cuspido. Não podeis chamá-la. Para a chamardes, deveis conhecê-la, e vós não podeis conhecê-la. No momento em que alguém, não importa quem, diz: "Sei" - não sabe. No momento em que dizeis que achastes, não achastes. Se dizeis que a experimentastes, nunca a experimentastes. Tudo isso são maneiras de explorar um homem - vosso amigo ou inimigo.
Perguntamos então, a nós mesmos, se é possível encontrar-nos com essa coisa sem a chamarmos, sem a esperarmos, sem a buscarmos ou explorarmos - se é possível ela "acontecer", tal como a brisa fresca que entra na sala quando deixamos a janela aberta. Não podeis convidar o vento a entrar, mas tendes de deixar aberta a janela - o que não significa ficar num estado de espera; essa é uma outra maneira de nos enganarmos. Não significa que devais "abrir-vos" para receber; essa é uma outra forma de pensamento.
Nunca perguntastes a vós mesmo por que aos entes humanos falta essa coisa? Eles geram filhos, satisfazem o sexo, têm ternuras, a capacidade de compartilhar as coisas num estado de companheirismo, de amizade, de camaradagem, mas essa coisa - por que razão não a tem? Nunca vos ocorreu, num momento de folga - ao andardes sozinho por uma rua imunda, ao viajardes num ônibus, ao passardes umas férias à beira-mar, ao passeardes numa floresta, entre os pássaros, as árvores, os regatos, os animais selvagens - nunca vos ocorreu perguntar por que razão o homem, que vive há milhões e milhões de anos, ainda não possui essa coisa, essa flor maravilhosa e imarcescível; por que razão vós, um ente humano, dotado de tanta capacidade, tanta inteligência, tanta sutileza; vós, que tanto competis, que possuis uma tão maravilhosa tecnologia, que sois capaz de elevar-vos aos espaços e de descer ao fundo do mar, de inventar fantásticos cérebros eletrônicos - por que razão não possuis essa única coisa verdadeiramente importante? Não sei se alguma vez já considerastes seriamente esta questão: Por que está vazio o vosso coração?
Que responderíeis se fizésseis a vós mesmo essa pergunta; qual seria vossa resposta imediata, inequívoca, sem sutilezas? Vossa resposta deveria corresponder à intensidade com que fizésseis a pergunta, e ao vosso sentimento de urgência; mas vós não sois intenso, nem sentis aquela urgência, e isso porque não tendes energia, a energia que é paixão - pois nenhuma verdade se pode descobrir sem paixão - paixão impelida por intenso fervor, paixão sem nenhum desejo secreto. A paixão é uma coisa um tanto assustadora, porque, se tendes paixão, não sabeis aonde ela vos levará.
Assim, será o medo a razão por que não possuis a energia daquela paixão, para descobrirdes por vós mesmo por que vos falta aquela essência do amor, por que não arde em vosso coração essa chama? Se examinastes com muita atenção vossa mente e vosso coração, sabereis por que não a tendes. Se sois apaixonado, no descobrir por que não a possuis, ela se vos mostrará. Só pela negação completa, a mais alta forma da paixão, torna-se existente aquela coisa que é o amor. Como a humildade, não podeis cultivar o amor. A humildade vem à existência com a total cessação da presunção - e, então, jamais sabereis o que é ser humilde. O homem que sabe o que significa ter humildade é um homem vaidoso. Do mesmo modo, quando aplicais vossa mente e vosso coração, vossos nervos, vossos olhos, todo o vosso ser, a descobrir o caminho da vida, a ver o que realmente é, e a ultrapassá-lo, a rejeitar total e completamente a vida que hoje vivemos - nessa negação do maléfico, do brutal, torna-se existente a outra coisa. E nunca o sabereis. O homem que sabe que está em silêncio, o homem que sabe que ama, não sabe o que é o amor ou o que é o silêncio».
Jiddu Krishnamurti, Liberte-se do Passado, XVI capítulo
http://www.jiddu-krishnamurti.net/pt/index.php
Um abraço a todos, e um em especial para o Paulo
ResponderEliminar«Quando agis de acordo com vossos princípios, estais sendo desonesto, porque, quando agis conforme o que julgais ser correto, não sois o que sois.»
ResponderEliminarIsto é o que se poderia dizer estar contra muita coisa, mas não contranatura, que é o único contra que há - visto tudo vir dela.
Meu caro João Beato,
ResponderEliminarCom toda a sinceridade e honestidade lhe reafirmo que - conquanto seja, naturalmente, não desinteressante ler e sobretudo viver num certo crivo "krishnamurtino", depurante de muita canga inútil e entolhante, na mais repassante abordagem ao que importa, sempre lhe digo que não vislumbro ainda hoje o que tenha Krishnamurti trazido, que o Budismo Zen não o houvesse já feito.
Quer ajudar-me a entender? (francamente lhe pergunto)
Abraço!
Anita,
ResponderEliminarNessas palavras que presumo sejam de Krishnamurti, está-se ainda ao nível de que precisamente ele pretende que nos libertemos.
Prefiro então, ainda assim, o efeito Koan do Zen:
É simultaneamente "mais" explosivo e implosivo!
E some, no "limite" com o próprio "-plodir"...
Abraço
Lapdrey,
ResponderEliminaro que me parece, é que não se pode 'estar' nas palavras, nem, por conseguinte, em qualquer nível. O nosso nível é sempre o mesmo, o silêncio que as cria, e ele sim, que somos e estamos, sempre.
Estas palavras ousam libertar o homem de qualquer dualidade, da mesma que o cega para a unidade que vive em tudo. A unidade de um só chão, de um só coração, de cada homem ser um só, de não poder, portanto, haver um correto e um errado. A ousadia de o devolver à realidade da vida, a si mesmo, à sua Origem.
Se elas são ainda pouco... não sei. Preencha-as, então, o homem que as está a ler - a ser. Sei lá... ;)
Um beijo.
Caro João Beato, saúdo o teu ressurgimento, sobretudo porque temia que houvesses ficado melindrado com alguma coisa.
ResponderEliminarQuanto a Krishnamurti, é óbvio que é sempre bom ouvir estas coisas, mesmo que também não veja o que elas trazem de novo ao que de mais profundo é proposto e vivido pelas tradições espirituais da humanidade. Noto até alguma limitação ou contradição, quando ele fala da necessidade de negar alguma coisa, embora compreenda o que quer dizer. Prefiro, porém, a visão da Grande Perfeição de tudo: confesso que o Dzogchen é a minha trip predilecta e não vejo nada de melhor.
Enfim, cada um com a sua.
Um grande Abraço amigo
Anita,
ResponderEliminarEu, por mim, admito sem dificuldade estar ainda ao nível da palavra e seu limite, ou porventura do seu salto tensor para o ilimite.
Por outro lado, se eu quando "ajo, não ajo conforme o que julgo ser correto", então ajo conforme o quê?
Desonesto (seria mais exacto dizer incoerente) para consigo mesmo, será dizer algo em si mesmo contraditório, mas que não faz como o Zen, que rasga, rompe, estilhaça o campo de compreensão conceptual e conceptiva, através do koan e outros processos de "abruptismo" despertante.
Claro que quem diz que não somos o que somos está ainda ao nível disso mesmo: de não sermos o que somos.
A questão que eu já coloquei (a João Beato) e aqui te coloco a ti é a seguinte:
Se Krishnamurti é um mestre, onde estão os discípulos DESPERTOS, que o legitimem enquanto tal;
Se os não há, presume-se que até Krishnamurti ande à procura: não se sabe é de quê...
Se assim for, dele precisamos pouco ou para nada.
Continuo, claro, aberto sinceramente a que me mostrem que assim não seja. O que muito agradeço.
Abraço
caro João Beato
ResponderEliminara sua reflexão exemplar sugeriu-me esta para mim sentida a que chamo "quadra p´ra pular"
:
quem for honesto profundo
sem fantasia ou batota
se não endireita o Mundo
ao menos não o entorta
receba-a envolta num abraço amigo
Meu caro Platero,
ResponderEliminar"Reflectir" com as palavras ou o palavreado dos outros (conforme se esteja a favor ou contra, ou...) não custa nada, ou melhor, custa apenas um simples copy/paste: depois é esperar pelos comentários, de pernas cruzadas nos braços, ou vice-versa.
Prefiro, a anos-luz de distância, a espontaneidade genuína das suas quadras ao gosto "popular", porventura mais sábias que pobres descobertas de descobridores da descoberta de descobrir...
Até agora, aliás, o silêncio de João Beato é, como vem sendo habitual, porventura por si elucidativo de dois modos.
Qualquer deles é bom, mas cada um deles é mau.
Já me habituei!
Abraço, amigo Platero!
caro Lapdrey
ResponderEliminarjulgo que há profundas divergências entre colaboradores-filósofos deste interessante espaço de comunicação. Não me meto nisso, porque não Vos entendo nem sequer é essa minha dimensão. Movimento-me num outro patamar - mais baixo - talvez na cave da intelectualidade da Serpente.
a minha "Quadra" é fruto da leitura do texto de Beato, que me lembrou qualquer coisa, muito esfiapada na memória,de lida há tantos anos, de LAO-TSÉ.
Espero não me sentir fautor de perturbação entre vocês
abraço
Lapdrey,
ResponderEliminarSe fosse para viver de acordo com o que eu acho certo ou errado, de modo (parcialmente) consciente, a vida havia-me perguntado se era certo ou errado eu nascer, ou o coração quanto a viver. Mas como nenhum dos casos acontece/u, nada na minha vida está baseado no que eu penso, somente no chão, no corpo-terra.
Tenho dificuldade em perceber alguma linguagem tua, por isso é provável o inverso. Espero que me concedas a "folga" que te falei, tal como eu vou tentando.**
Meu caro Lapdrey, a minha presença neste espaço não é contínua. Venho até aqui quando venho e prefiro mil vezes o silêncio a conversas sobre nada.
ResponderEliminarQuanto à sua questão, começarei, primeiro, por observar que a sua "abertura" para a recepção da explicação que espera talvez não seja a melhor maneira para chegar "lá", se é que existe algum "lá" onde chegar. Como o próprio Krihsnamurti diz no texto, «não significa que deveis "abrir-vos" para receber; essa é mais uma forma de pensamento».
De seguida, reparemos que a resposta que procura já está contida nas suas próprias palavras:
«Se Krishnamurti é um mestre, onde estão os discípulos DESPERTOS, que o legitimem enquanto tal;
Se os não há, presume-se que até Krishnamurti ande à procura: não se sabe é de quê...»
Comparar os conteúdos da mensagem de Krishnamurti com outras grandes tradições e chegar à conclusão de que nada de novo acrescentam ao Budismo Zen ou ao Dzogchen é inevitável para quem as conhece, mas não é essa a questão nem é para isso que Krishnamurti é aqui chamado. A questão é precisamente sobre o que se entende por "autoridade espiritual", "conhecimento espiritual" e respectivos "seguidores". A última coisa que Krishnamurti quer é que o ponham num altar e lhe façam prosternações e oferendas diárias. Filosofia, escola, corrente, religião "krishnamurtina" é algo que não faz qualquer sentido. Se este homem veio ensinar alguma coisa ao mundo, foi simplesmente que cada ser humano é capaz de criar o seu próprio dharma sem ter que se filiar, iniciar, identificar ou integrar numa qualquer e específica escola, seita, religião, filosofia ou qualquer outro meio de libertação espiritual. A revolução está na relação entre "mestres" e "discípulos" e na maior autonomia entre uns e outros. "Krishnamurtismo" é algo que nunca virá a surgir, ao contrário do que aconteceu com "cristianismo" ou "budismo". A reflexão é sobre o que significa uma "autoridade espiritual" e a sua desautorização, pelo bem da verdade. Se o Lapdrey acha que a mestria se mede pela aparição de discípulos, de intérpretes, de seguidores iluminados que pregam uma doutrina e prometem a libertação, então pode ficar descansado porque não precisa do Krishnamurti para nada. Mas se acha que é capaz de se libertar a si e ao mundo sem o recurso a uma "autoridade tradicional", pode ter algum interesse em compreender a sua mensagem. É a melhor ajuda que lhe posso dar. Um abraço.
Amigo Paulo, também gosto muito dessa trip, como poderás imaginar, tendo sido por essa porta, e através de ti, que tive o meu primeiro encontro com o budismo. Dzogchen. Mas, como também sabes, e quanto a "trips predilectas", não prefiro nenhuma em particular: a independência da rosa é tudo para mim... ;)
Anita, há muito tempo que tenho isto para te dizer. A primeira coisa que reparei quanto entraste na Serpente foi que fazemos parte da mesma "Indústria": Mar. «Temos aqui navegadora» foi o que pensei logo, e continuo a pensar. Um grande abraço.
Mestre Platero, a sua contribuição não poderia ter sido mais oportuna, a suas palavras trazem a sabedoria que aqui nos falta. Receba este abraço amigo.
Desculpa, João, mas o Dzogchen não é uma porta nem budista nem nada! E não foi através de mim que o contactaste, porque Dzogchen é o Despertar eterno e imediato, o único estado natural de tudo, que não tem através nem mediadores.
ResponderEliminarQuanto ao que dizes, não se arriscará a ser considerado krishnamurtismo, mesmo não sendo essa a tua intenção?
Enfim, como bem o expressas, discussões de nada.
Cada um com a sua e todos com nenhuma
Abraço
Marinheiro João,
ResponderEliminaré a sina de quem nasce - e se reconhece - Pessoa: a de só poder viver a navegar... ;)*
Paixão. É aqui que está a diferença. Este texto fala de paixão. Iluminou-me principalmente esta frase: "Só pela negação completa, a mais alta forma da paixão, torna-se existente aquela coisa que é o amor." Esta foi a pérola que hoje extraí. Que cada um tenha as suas, todos os dias, é o que desejo. Obrigada por esta pérola, João Read Beato.
ResponderEliminarCaro João,
ResponderEliminarObrigado pela sua extensa e esforçada tentativa de servir-me ajuda, o que muito agradeço.
Vamos por partes.
Quanto à questão "abertura". Essa é uma falsa questão, João, do meu ponto de vista.
Quem, menos que um discípulo Zen, está "aberto" para o estoiro do satori?
Precisamente por isso: por NÃO estar, é que estruge, e de que maneira...!
Quanto a "autoridade espiritual", "conhecimento espiritual" e respectivos "seguidores".
A questão coloca-se, quanto a mim, em saber o que é comunicável, transmissível, despoletável, etc. em quem o queira.
Mas o querê-lo é admitir que se é carente disso. E ser carente é admitir que aquilo que nunca perdemos, esteja por nós dado como perdido.
Aqui entramos no vício de pensar circular. E daqui não se sai, como por aqui já bem vimos.
Concordo em que cada homem tem o seu dharma, mas isso é budismo puro e simples, caro João.
E quanto ao "filiar ou não filiar, iniciar, identificar ou integrar numa qualquer e específica escola, seita, religião, filosofia ou qualquer outro meio de libertação espiritual, etc." -
para mim é igual a estar aqui, ou ali ou além de forma livre ou não estar: a liberdade está, não na coisa, mas no como estejamos nela.
Diz depois: "A revolução está na relação entre 'mestres' e 'discípulos' e na maior autonomia entre uns e outros."
Concordo em que este aspecto é importante, mas ainda que se rejeite ser mestre, como Krishnamurti, que foi sobretudo alguém que pensou em voz alta - muito provavelmente, apenas isso; não digo que seja pouco, nem muito, foi o que foi.
Mas isso não pode deixar de introduzir-se subtilmente na mente dos auditores. É inevitável. Só não é inevitável se ele nas audições funcionar de facto como um mestre, desmontando e desbloqueando porventura processos mentais. Logo, haverá mestria, e "mestre" e "discípulos".
Se não houver nada disso, então o que houve durante anos foi uma enorme inutilidade e perda de tempo: de Krishnamurti e dos ouvintes.
Abraço, João!
Anita,
Ok!
... a "folga"...!
Folguemos!
Demos folga então aqui ao parafuso, e um diazito de folga também!
O amor, filho da "negação completa"!?
ResponderEliminarNão quero compreender alguns dos comentários ao texto de Krishnamurti do modo como os estou a perceber, considerando a vida e a acção de Krishnamurti como uma inutilidade. Prefiro pensar o filósofo, o teósofo, como um pedagogo cuja vida e acção influenciaram o sentido de educação, despertando as mentes para a importância de desenvolver no infante e no adulto o gosto por compreender a formação dos seres nas diferentes dimensões do saber e do ser, procurando dessa forma chamar a atenção de que Oriente e Ocidente e todas as religiões nada são se o homem não alargar a sua visão do mundo, por forma a encontrar, primeiro em si, a semente do seu mais além de si. Ao focar o seu pensamento em questões de ordem ecológica, ética e artística, na educação, por forma a torná-las veículo para a expansão do bem, do belo e do bom; ao despertar muitos para o erro que é o homem fechar-se ao mundo e a Deus, Buda, Allah.... etc., na época em que o fez, foi o que fez com que tivesse seguidores. Possuindo, como se sabia, também o modo de ser simples no expôr, adaptando o seu discurso ao auditório, foi mestre e com mestria, tanto que muitos foram os que se sentiram impulsionados e influenciados pelas suas leituras e pensamento a desenvolver a sua senda. Isto em nada o diminui face a outros mestres que o mesmo fizeram por outros processos.
ResponderEliminarCara Saudades,
ResponderEliminarA questão é porventura saber se, tendo Krishnamurti feito e dito o que haja feito (se, alfim, o haja) e dito, isso não redunda no mesmo de que ele queria negar-se no mesmo falar de não ser ele isso, nem devermos sê-lo ...
Tudo o resto disso decorre.
A verdade é sempre, alfim, uma vazia "inutilidade": para nada "serve", e a nada serve.
"o filósofo, o teósofo, (...) pedagogo cuja vida e acção influenciaram o sentido de educação, despertando as mentes para a importância de desenvolver no infante e no adulto o gosto por compreender a formação dos seres nas diferentes dimensões do saber e do ser" - isso é paisagem do que é sem paisagem.
"chamar a atenção de que Oriente e Ocidente e todas as religiões nada são se o homem não alargar a sua visão do mundo, por forma a encontrar, primeiro em si, a semente do seu mais além de si." - continuo a achar que é isso, nele, foi tiro no pé de quem falava do ponto que não está nas palavras de quanto se diga: das duas, uma - ou as palavras nada valem, ou, se valem, para nada valem. Irresolúvel enigma... já soluto.
"Ao focar o seu pensamento em questões de ordem ecológica, ética e artística, na educação" - focar o pensamento "em questões" é precisamente a melhor maneira de o não livrar de si mesmo.
A questão "única" é um "sempre alhures": o "Uuuuuuh!" de Tchau-Tcheu
Na verdade, Krishnamurti nunca nasceu, e eu não estou a falar e, porém,... Krishnamurti já não há e eu porventura ainda não sou... o que já sou.
Usuais patacoadas de Lapdrey!
É para mim também evidente, Lapdrey, que dizer e passar a vida a dizer aquilo que se pensa não dever ser dito é o paradoxo a que se arrisca todo aquele que pelas palavras o faz.
ResponderEliminarEm certa medida o erro está aí. Concordo em que a verdade e tudo o que seja “paisagem” possa ser uma inutilidade, mas só para os outros. Se nos pomos a comparar a acção de um verdadeiro mestre com a de um escritor e divulgador de um pensamento (como é o caso), é claro que este não será nem uma coisa nem outra... Saber que Cristo ou Buda está em nós, não faz de nós O Buda ou O Cristo. Krishnamurti não é um Iluminado, concordo. Nem eu, nem o Lapdrey...
Aqui faz sentido a quadra do Platero... A não ser que haja “fraude”. Aí salve-se o mal que não fez ou que terá feito(?).
Mais umas “santas” (de quem o não é) saudações saudosistas-futuristas!
Conversa fiada
ResponderEliminarHummm...?
ResponderEliminarAgora é preciso fiador para estar aqui ?
Ponho-me já a desfiar daqui!!
Ou...
Espere aí, Lapdrey meu amigo... que eu não sei se me fie...
ResponderEliminarFazemos assim: o Lapdrey vai por ali e eu vou por acolá... se não vier ninguém ao nosso encontro, é porque trocámos...então, fazemos ao contrário... Já não nos podemos fiar em nada! Ufa!
Fique bem, abraço!
Andamos sempre à volta do mesmíssimo extreme limite, Saudades: entre o que o dizer evoca e convoca, num mistério sempre insondável, e o que não cabe jamais dito nem cabe ser dito, no que quer que se diga.
ResponderEliminarNem mesmo no silêncio de não dizê-lo.
O (meu) Cristo está crucificado no (meu) Buda!
O Buda ressuscita precursivo no que me morre a cada instante, e no que não tem antes nem depois (me) revive: "Antes de Abraão, Eu Sou!" é o que Buda mesmo diz da primordial natureza!
O Cristo desperta na Árvore de Bodhi nos quarenta dias de deserto: a Vida que dele brota do Gólgota, Lenho da Vida de Morte para a vida, Vida para a morte da Morte! Buda di-lo, creio, também, na transcensão de todos os iludentes contrários!
Desperto em despertar o despertado!
Sem autoridade a mim exterior o digo - que a sou apenas de mim para mim ...
Obrigada por me fazer recordar estas palavras
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