Um espaço para expressar, conhecer e reflectir as mais altas, fundas e amplas experiências e possibilidades humanas, onde os limites se convertem em limiares. Sofrimento, mal e morte, iniciação, poesia e revolução, sexo, erotismo e amor, transe, êxtase e loucura, espiritualidade, mística e transcendência. Tudo o que altera, transmuta e liberta. Tudo o que desencobre um Esplendor nas cinzas opacas da vida falsa.
domingo, 28 de dezembro de 2008
Salto sem rede
"A que se reduzem todos os nossos tormentos senão ao remorso de não se ser Deus?"
- E. M. Cioran, "Le Livre des Leurres", in Oeuvres, Paris, Gallimard, 1995, p.212.
Deus..é Poder, Ideal de todos os ideais (Verdade, Liberdade, Sabedoria, Luz, Paz, Justiça, Beleza...), infinito, inefável, transcendente que nos (re)toca na nossa (in)finitide, feita de condicionantes ontológico-biológico-culturais.
Sim, aspiramos à divindade; uns na senda do Bem, outros, não...
A questão do "remorso" é uma questão pertinente, advém no contexto do autor do pecado original? (ainda não fui ao oráculo virtual, entenda-se, google rs).
A propósito de remorso, lembrei-me deste do injustamente esquecido Vitorino Nemésio:
“Cólofon”
"A noite isenta o homem e punge-o. A mão de Deus desenha a verdade no escuro e a alma se fez clara como a lã cardada à neve. Veio o dia e apagou este fulgor secreto, Veio a noite e no váculo tudo se repôs e deu. Quando na imagem fria outra vez me sei menino? Quanto mudei? Do que fui não restava senão o pano encardido. Hoje me remoço e lavo. Irei pedir aos velhos o sabor de suas palavras, aos ungidos o óleo de seus gestos, às virgens o sossego de seus seios: Mas de todo o emprestado que tirarei eu limpo? A brasa do remorso já não me cresta a carne: meu coração tornou-se como o pé do leproso, que não sente a água quente. Virão do Oriente as espadas em fogo, do Norte as setas geladas, do Sul o vento salino: A ver se arranco o ferro à minha tristeza torpe, à dor bruta e chorada, ao calmo desespero que julga que pensando se usurpa: E se me levam anjos de rastos pelas sarças dos sofridos, anjos severos e piedosos com os que fogem à guarda, Anjos duros de rémige porque no fechar do voo entregam a Deus o grão gerado limpo e seco!"
(in “Nem toda a noite a vida”, 1953)
(Isto me emudece de quanto houvesse eu para dizer...)
Um dia seremos Deus. Quando nos lembrarmos de quem somos. Ou poderemos ser um Sol, ou até dois sois numa galáxia distante. Responsáveis por um universo.
Agora Sou muito pequenina, Do tamanhão do meu Ego.
Agora Ser mais o coração. Despir os receios que o vestem. Ser mais o encontro. A simplicidade.
adorei este excerto: "Veio o dia e apagou este fulgor secreto, Veio a noite e no váculo tudo se repôs e deu. Quando na imagem fria outra vez me sei menino? Quanto mudei? Do que fui não restava senão o pano encardido. Hoje me remoço e lavo."
Cara Anónima, “Sereis como deuses”. “Sereis como Deus”: duas subtis nuances de um ímpar e único destino de sermos o que havemos de ser, se o quisermos. "Ser como deuses" é sermos divinos como eles, se bem que esculpidos pelas em cada um de nós variegadas im-perfeições. Porém, a medida de perfeição que cada um tenha é a perfeição à sua medida. Um copo cheio é sempre um copo cheio, se bem que possa ser do tamanho adequado a vinho ou a água. E ainda assim, entre os copos para água entre si, e os copos para vinho entre eles, existem diferenças de tamanho e formato. Mas todos são perfeitos no cumprirem o serem para ser copos, e como tal servirem.
"Ser como Deus" é ser deificado (theosis, no grego), ser por Ele inundado, transfigurado, transmutado de vil metal vital em precioso e luminoso ouro, luz incarnada do Espírito, santificando e sagrando o mais fundo abismo da matéria.
Aí, sim, amiga anónima (mas não de anónima amizade), creio que aí então nos recordaremos inteiramente d’“o que” somos e isso casaremos com o “quem” somos.
Deixe-me citá-la, porém, nesta maravilha que me tocou fundíssimo:
“Agora Ser mais o coração. Despir os receios que o vestem. Ser mais o encontro. A simplicidade.”
Isto é programa de vida permanente para qualquer um. Para mim o é. Obrigado.
Isabel, Quão grato é, e será sempre, vê-la aqui também, e mais amiúde... aqui, onde posso falar directamente consigo.
(Sempre sabe onde encontrar-me e como contactar-me quem o queira fazer por outro meio: no meu perfil há como fazê-lo)
Como sempre, suas palavras de ouro são perfeitas adagas de luz que cumprem o ofício de comungar o mais alto com o mais fundo de quanto nos cabe e nos chama. Grato como sempre. Nessas lágrimas corre, em quem elas corram, a seiva de vida da alma quando viva, quando divina, isto é, quando sumamente humana... …Em flor vivamos, pois. Como flores, as flores, sim: flores de um outro jardim...
Anita, Concordo em que seja um imenso deslumbre, este poema de Vitorino Nemésio.
Quanto a quem haja tido memória viva e pessoal dele, enquanto professor, aqui deixo, com a vossa licença, o testemunho emocionado de certa senhora (digo senhora, sim, como já raro hoje se vê, com tal trato qual ela o tinha), minha professora de Português no antigo Secundário - a quem devo eternamente (pasme-se) a iniciação profunda em Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé – e que, comparando os dois “titãs” catedráticos em Letras, na altura (Vitorino Nemésio e Rodrigues Lapa) - estava-se na década de setenta do século passado (faz um tempo) - dizia relativamente a isso algo assim:
“As aulas de Rodrigues Lapa, de um rigor e detalhe imensos e duma densidade eruditíssima, eram de difícil acompanhar, mas nós sentíamos (imaginávamos nós) que muito havíamos aprendido após cada aula, e havíamo-lo, de facto, aprendido. Por seu lado, as aulas de Vitorino Nemésio eram deslumbrantes e estimulantes como nenhumas, a gente ficava do principio ao fim de orelha colada na boca do sábio professor mas, depois de termos feitos uma imensa viagem por quase todas as áreas do saber e da sabedoria humanas, sentíamos que talvez nada houvéssemos aprendido que tivesse a ver com a matéria.
Porém, pese embora o que devemos a Lapa, é sobretudo o que de modo tão apaixonado, ainda que algo dispersantemente, nos transmitiu Nemésio, que encontramos as melhores raízes daquilo que foi mais decisivamente importante para cada um de nós ter podido vir a ser aquilo que veio a ser no futuro da vida. Podemos dizer que se Rodrigues Lapa nos deu os materiais para levantar as paredes da casa de vida que estávamos a construir, foi porém Nemésio quem nos mostrou o que poderia ser e o que poderíamos colocar no seu espaço interior.” Jamais esqueci estas palavras.
Amiga Fragmentus, É exaltante sentir o quanto exulta a sua alma com um texto com a riqueza deste de Nemésio. Poeta assim sente poeta...
A propósito: parece que a nossa Maria da Conceição afinal conseguiu resistir a este post... Ou então talvez esteja para outras bandas, quem sabe? Se eu quisesse ironizar diria: Hum... talvez a Maria da Conceição já seja Deus, ou esteja em Deus! (Eu não disse isto, ok? Ela ainda me excomunga!)
Interessantíssimo é notar como a cada um de nós tocou mais fundo uma diferente passagem do poema. A mim, foi mais abísmica aquela (acho eu irrespondível) pergunta, ainda que isso me não impeça de me questionar na mesma: “De todo o emprestado que tirarei eu limpo?
Porém, mais importa agora não perdermos de vista a questão inicial deste post, a pergunta de Cioran, citada por Paulo Borges:
“A que se reduzem todos os nossos tormentos senão ao remorso de não se ser Deus?"
Para quem crê que o seu único possível fim é em Deus, talvez remorso não lhe diga muito... mas uma insana ânsia por 'ainda não' "...ser Deus", acompanhada de uma (aparente) inútil consciência de que não poderia ser distinto do que é.
Para os que não o crêem poderá ter então lugar o remorso...
Grato, amiga Maria da Conceição, pela minha promoção a trapezista (com rede): um dia, quando eu for grande, ainda hei-de saltar sem rede... e sem salto também (qual se arte de arqueiro zen me convertesse em lusófono).
Na verdade, Anita, sempre importa bem distinguir remorso e arrependimento. Eu vejo o remorso mais como um peso agudamente focado, relativamente ao qual tudo se faz para lograr libertação, ao passo que arrependimento é mais um movimento tensional interior que tende para levar a alma a uma condição propícia ao desejo de aceitar o perdão. Nem um nem outro têm, é claro, necessariamente que ver com religião ou espiritualidade.
A minha relação com o significado das palavras é bem mais primária que a sua, Lapdrey. Remorso continua a não me fazer sentido, mas é possível que seja afinal o meu sentido que não tenha, aqui, sentido...
Anita, A linguagem é um rio comum onde todos nos "banhamos" de acordo com as nossas necessidades e como queiramos. Há quem molhe apenas os pés, quem atire a si mesmo apenas uns simples salpicos e há quem mergulhe fundo no leito. Não importa! O grande rio é de todos, por igual direito. E nem há modo melhor ou pior de utilizar o rio...
Grato embora pelo que disse, enjeito o ensinar, que nada ensina quem nada sabe de certo, mas por certo não podemos impedir-nos de sempre aprender com tudo, e com os outros sobretudo. É quanto cuido de fazer.
Quanto ao "ímpeto poético": é o que é, é o que seja, que for.
Quanto, finalmente, a generosidade. É-se generoso de forma, parece-me, sempre "interesseira": a melhor maneira de ser generoso é ser verdadeiro. Até!
"O Paraíso geme no fundo da consciência, enquanto a memória chora. E é assim que pensamos no sentido metafísico das lágrimas e na vida como desenrolar de um remorso" - "Des Larmes et des Saints".
Se o amor é relação, a nada pode preceder. Se for união, relação é ainda. O amor não pode jamais ser primordial, embora possa manifestar o que é primordial.
O que é primordial? Não se diz, porque não é, nem não é.
olha, se baixares o salto, conseguirás...é necessário q não estejas tão elevada, matrerialmente, nem te sintas superior a...humildade, visão horizonte fazem de ti a amante ideal (ou quase)de Deus.
pssttt MConceição, diga lá se não é assim, anda sempre rasa, e só aqui se eleva pelo dogmatismo?!... (vou levar c/algum sapato...rs)
Deus..é Poder, Ideal de todos os ideais (Verdade, Liberdade, Sabedoria, Luz, Paz, Justiça, Beleza...), infinito, inefável, transcendente que nos (re)toca na nossa (in)finitide, feita de condicionantes ontológico-biológico-culturais.
ResponderEliminarSim, aspiramos à divindade; uns na senda do Bem, outros, não...
A questão do "remorso" é uma questão pertinente, advém no contexto do autor do pecado original? (ainda não fui ao oráculo virtual, entenda-se, google rs).
aposto q a Mª da Conceição não resiste a este post :)
ResponderEliminarFeliz Natal, amiga!rs
salto sem rede...o precipício...o abismo de nós próprios em confronto permanente, da nossa própria inquietude, solidão, e impotencia...
ResponderEliminarA propósito de remorso, lembrei-me deste do injustamente esquecido Vitorino Nemésio:
ResponderEliminar“Cólofon”
"A noite isenta o homem e punge-o.
A mão de Deus desenha a verdade no
escuro e a alma se fez clara como a lã cardada à neve.
Veio o dia e apagou este fulgor secreto,
Veio a noite e no váculo tudo se repôs e deu.
Quando na imagem fria outra vez me sei menino? Quanto mudei?
Do que fui não restava senão o pano encardido. Hoje me remoço e lavo.
Irei pedir aos velhos o sabor de suas palavras, aos ungidos o óleo de seus gestos, às virgens o sossego de seus seios:
Mas de todo o emprestado que tirarei eu limpo?
A brasa do remorso já não me cresta a carne: meu coração tornou-se como o pé do leproso,
que não sente a água quente.
Virão do Oriente as espadas em fogo, do Norte as setas geladas, do Sul o vento salino:
A ver se arranco o ferro à minha tristeza torpe, à dor bruta e chorada, ao calmo desespero que julga que pensando se usurpa:
E se me levam anjos de rastos pelas sarças dos sofridos, anjos severos e piedosos com os que fogem à guarda,
Anjos duros de rémige porque no fechar do voo entregam a Deus o grão gerado limpo e seco!"
(in “Nem toda a noite a vida”, 1953)
(Isto me emudece de quanto houvesse eu para dizer...)
Um dia seremos Deus. Quando nos lembrarmos de quem somos.
ResponderEliminarOu poderemos ser um Sol, ou até dois sois numa galáxia distante. Responsáveis por um universo.
Agora
Sou muito pequenina,
Do tamanhão do meu Ego.
Agora
Ser mais o coração. Despir os receios que o vestem.
Ser mais o encontro. A simplicidade.
excelente citação!
ResponderEliminaradorei este excerto:
"Veio o dia e apagou este fulgor secreto,
Veio a noite e no váculo tudo se repôs e deu.
Quando na imagem fria outra vez me sei menino? Quanto mudei?
Do que fui não restava senão o pano encardido. Hoje me remoço e lavo."
A mim também, caro Lapdrey, e minha mãe sabia-o de cor, que é como sabe, muito melhor do que eu...
ResponderEliminarcorrem-me lágrimas para a beleza pura do poema e neva dentro de mim.
"A ver se arranco o ferro à minha tristeza torpe, à dor bruta e chorada, (...)"
E fecho as duas mãos com a força deste agradecimento...talvez despontem flores puras para outros jardins.
É fascinante, Lapdrey.
ResponderEliminarCara Anónima,
ResponderEliminar“Sereis como deuses”. “Sereis como Deus”: duas subtis nuances de um ímpar e único destino de sermos o que havemos de ser, se o quisermos.
"Ser como deuses" é sermos divinos como eles, se bem que esculpidos pelas em cada um de nós variegadas im-perfeições.
Porém, a medida de perfeição que cada um tenha é a perfeição à sua medida.
Um copo cheio é sempre um copo cheio, se bem que possa ser do tamanho adequado a vinho ou a água. E ainda assim, entre os copos para água entre si, e os copos para vinho entre eles, existem diferenças de tamanho e formato. Mas todos são perfeitos no cumprirem o serem para ser copos, e como tal servirem.
"Ser como Deus" é ser deificado (theosis, no grego), ser por Ele inundado, transfigurado, transmutado de vil metal vital em precioso e luminoso ouro, luz incarnada do Espírito, santificando e sagrando o mais fundo abismo da matéria.
Aí, sim, amiga anónima (mas não de anónima amizade), creio que aí então nos recordaremos inteiramente d’“o que” somos e isso casaremos com o “quem” somos.
Deixe-me citá-la, porém, nesta maravilha que me tocou fundíssimo:
“Agora
Ser mais o coração. Despir os receios que o vestem.
Ser mais o encontro. A simplicidade.”
Isto é programa de vida permanente para qualquer um.
Para mim o é. Obrigado.
Isabel,
Quão grato é, e será sempre, vê-la aqui também, e mais amiúde... aqui, onde posso falar directamente consigo.
(Sempre sabe onde encontrar-me e como contactar-me quem o queira fazer por outro meio: no meu perfil há como fazê-lo)
Como sempre, suas palavras de ouro são perfeitas adagas de luz que cumprem o ofício de comungar o mais alto com o mais fundo de quanto nos cabe e nos chama.
Grato como sempre.
Nessas lágrimas corre, em quem elas corram, a seiva de vida da alma quando viva, quando divina, isto é, quando sumamente humana...
…Em flor vivamos, pois.
Como flores, as flores, sim: flores de um outro jardim...
Anita,
Concordo em que seja um imenso deslumbre, este poema de Vitorino Nemésio.
Quanto a quem haja tido memória viva e pessoal dele, enquanto professor, aqui deixo, com a vossa licença, o testemunho emocionado de certa senhora (digo senhora, sim, como já raro hoje se vê, com tal trato qual ela o tinha), minha professora de Português no antigo Secundário - a quem devo eternamente (pasme-se) a iniciação profunda em Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé – e que, comparando os dois “titãs” catedráticos em Letras, na altura (Vitorino Nemésio e Rodrigues Lapa) - estava-se na década de setenta do século passado (faz um tempo) - dizia relativamente a isso algo assim:
“As aulas de Rodrigues Lapa, de um rigor e detalhe imensos e duma densidade eruditíssima, eram de difícil acompanhar, mas nós sentíamos (imaginávamos nós) que muito havíamos aprendido após cada aula, e havíamo-lo, de facto, aprendido.
Por seu lado, as aulas de Vitorino Nemésio eram deslumbrantes e estimulantes como nenhumas, a gente ficava do principio ao fim de orelha colada na boca do sábio professor mas, depois de termos feitos uma imensa viagem por quase todas as áreas do saber e da sabedoria humanas, sentíamos que talvez nada houvéssemos aprendido que tivesse a ver com a matéria.
Porém, pese embora o que devemos a Lapa, é sobretudo o que de modo tão apaixonado, ainda que algo dispersantemente, nos transmitiu Nemésio, que encontramos as melhores raízes daquilo que foi mais decisivamente importante para cada um de nós ter podido vir a ser aquilo que veio a ser no futuro da vida.
Podemos dizer que se Rodrigues Lapa nos deu os materiais para levantar as paredes da casa de vida que estávamos a construir, foi porém Nemésio quem nos mostrou o que poderia ser e o que poderíamos colocar no seu espaço interior.”
Jamais esqueci estas palavras.
Amiga Fragmentus,
É exaltante sentir o quanto exulta a sua alma com um texto com a riqueza deste de Nemésio.
Poeta assim sente poeta...
A propósito: parece que a nossa Maria da Conceição afinal conseguiu resistir a este post... Ou então talvez esteja para outras bandas, quem sabe?
Se eu quisesse ironizar diria: Hum... talvez a Maria da Conceição já seja Deus, ou esteja em Deus!
(Eu não disse isto, ok? Ela ainda me excomunga!)
Interessantíssimo é notar como a cada um de nós tocou mais fundo uma diferente passagem do poema.
A mim, foi mais abísmica aquela (acho eu irrespondível) pergunta, ainda que isso me não impeça de me questionar na mesma: “De todo o emprestado que tirarei eu limpo?
Porém, mais importa agora não perdermos de vista a questão inicial deste post, a pergunta de Cioran, citada por Paulo Borges:
“A que se reduzem todos os nossos tormentos senão ao remorso de não se ser Deus?"
A lide continua, amigos ...
Mas se nem Zeus parece poder controlar a sua Balança...
ResponderEliminarPara quem crê que o seu único possível fim é em Deus, talvez remorso não lhe diga muito... mas uma insana ânsia por 'ainda não' "...ser Deus", acompanhada de uma (aparente) inútil consciência de que não poderia ser distinto do que é.
ResponderEliminarPara os que não o crêem poderá ter então lugar o remorso...
«Crente é pouco sê-te Deus
ResponderEliminare para o nada que é tudo
inventa caminhos teus»
(Agostinho da Silva)
Só vejo nestes comentários saltos com rede... O costume.
ResponderEliminarhahaha apareceu,Mªda Conceição!
ResponderEliminarafinal até gosta de nós...
lisonjeada pelas suas palavras,Lapdrey e sempre atenta ao que escreve :)
ResponderEliminarGrato, amiga Maria da Conceição, pela minha promoção a trapezista (com rede): um dia, quando eu for grande, ainda hei-de saltar sem rede... e sem salto também (qual se arte de arqueiro zen me convertesse em lusófono).
ResponderEliminarNa verdade, Anita, sempre importa bem distinguir remorso e arrependimento.
ResponderEliminarEu vejo o remorso mais como um peso agudamente focado, relativamente ao qual tudo se faz para lograr libertação, ao passo que arrependimento é mais um movimento tensional interior que tende para levar a alma a uma condição propícia ao desejo de aceitar o perdão.
Nem um nem outro têm, é claro, necessariamente que ver com religião ou espiritualidade.
A minha relação com o significado das palavras é bem mais primária que a sua, Lapdrey.
ResponderEliminarRemorso continua a não me fazer sentido, mas é possível que seja afinal o meu sentido que não tenha, aqui, sentido...
Agradecida!
Anita,
ResponderEliminarA linguagem é um rio comum onde todos nos "banhamos" de acordo com as nossas necessidades e como queiramos.
Há quem molhe apenas os pés, quem atire a si mesmo apenas uns simples salpicos e há quem mergulhe fundo no leito.
Não importa!
O grande rio é de todos, por igual direito.
E nem há modo melhor ou pior de utilizar o rio...
Grata pela sua Generosidade, Lapdrey.
ResponderEliminarE pelo seu ímpeto poético criador de imagens cruas e vivas.
Já aprendi consigo.
A amiga anónima
Salamaleque matinal,amiga Anónima!
ResponderEliminarGrato embora pelo que disse, enjeito o ensinar, que nada ensina quem nada sabe de certo, mas por certo não podemos impedir-nos de sempre aprender com tudo, e com os outros sobretudo.
É quanto cuido de fazer.
Quanto ao "ímpeto poético": é o que é, é o que seja, que for.
Quanto, finalmente, a generosidade.
É-se generoso de forma, parece-me, sempre "interesseira": a melhor maneira de ser generoso é ser verdadeiro.
Até!
O que é para si mergulhar fundo no leito desse rio? (se lhe apetecer, verdadeiramente, responder)
ResponderEliminarPessoalmente, não faço por mergulhar muito fundo no rio, prefiro simplesmente que ele me conduza... a um seu outro fundo... o mar.
ResponderEliminarMas é (muito) provável que a cada um o rio o conduza de modo distinto, para um semelhante destino.
O meu maior remorso é não ser a amante de Deus.
ResponderEliminarCaro Lapdrey
ResponderEliminar"Ensinas melhor o que mais precisas de aprender."
"Ilusões", Richard Bach
Alguém me disse entusiasmado há uns dias: "Nada esqueças de ensinar".
"O remorso é a voz da solidão. Quem murmura nesta voz? Tudo o que em nós já não é homem"
ResponderEliminar"O Paraíso geme no fundo da consciência, enquanto a memória chora. E é assim que pensamos no sentido metafísico das lágrimas e na vida como desenrolar de um remorso" - "Des Larmes et des Saints".
ResponderEliminar"A metafísica é o remorso do homem da culpa de haver nascido" - "O Brasil Mental".
ResponderEliminarLapdrey é um excelente contributo aqui na Serpente!
ResponderEliminarfragmentus
e quando se encontra o amor, ao que se reduzem os nossos tormentos?
ResponderEliminarMaísha, eis que falas do fulcro de tudo.
ResponderEliminarUma achega quanto ao tema...
«Não é amante quem morre porque amou, senão quem amou para morrer.»
Padre António Vieira
Quem nos matará de amor?
ResponderEliminarPor quem morreremos nós de amor?
Por quem viveremos nós a morte?
Por quem nasceremos nós para a Vida?
(Ah tudo o resto são meras vias adjacentes.)
Fá-lo-emos por nós mesmos? Por esse outro?
Senão pelo que eu e o outro, em conjunto, somos.
Deus.
Maísha, suponho não ter ainda respondido...
ResponderEliminar"quando se encontra o amor, ao que se reduzem os nossos tormentos?"
... ao que nós nos reduzimos. Reduzimo-nos ao que somos.
Ao que não conhece remorso, nem tormento... pois a isso tudo precede.
Se o amor é relação, a nada pode preceder. Se for união, relação é ainda. O amor não pode jamais ser primordial, embora possa manifestar o que é primordial.
ResponderEliminarO que é primordial? Não se diz, porque não é, nem não é.
olha, se baixares o salto, conseguirás...é necessário q não estejas tão elevada, matrerialmente, nem te sintas superior a...humildade, visão horizonte fazem de ti a amante ideal (ou quase)de Deus.
ResponderEliminarpssttt MConceição, diga lá se não é assim, anda sempre rasa, e só aqui se eleva pelo dogmatismo?!...
(vou levar c/algum sapato...rs)
visão horizontal (rectifico)
ResponderEliminarGárgula,
ResponderEliminarisso que diz o meu coração não reconhece, nem os meus olhos... nem o que mais haja em mim.
O primordial não se diz pois o Amor não se diz.
O Amor é e não é, nele se encontram todos os opostos reunidos.
(certamente, o Amor também não é, nem não é... mas isto é para mim.)
ResponderEliminarIsso mostra que não falas do Amor, mas apenas de ti.
ResponderEliminarterminando apenas... para mim, que mesmo cega apenas vejo Amor.
ResponderEliminar"Isso mostra que não falas do Amor, mas apenas de ti."
Como se pudesse eu falar do que fosse senão pelo Amor... do Amor.
Ahh como se não fosse eu apenas ele. Ahh como se só ele não existisse. Como se só ele não fosse o que é.
Sim, falo de mim. Só de mim.
Ai do meu Amor, que és tu, que sou eu.