"Quando eu morrer
voltarei para buscar os instantes
que não vivi junto do mar.
Como ondas do mar dançam em mim os pés do teu regresso.
Há muito que deixei aquela praia
De grandes areais e grandes vagas
Mas sou eu quem na brisa respira
E é por mim que espera cintilando a maré vasa.
No mar passa de onda em onda repetido
O meu nome fantástico e secreto
Que só os anjos do vento reconhecem
Quando os encontro e perco de repente
O mar azul e branco e as luzidias
Pedras – O arfado espaço
Onde o que está lavado se relava
Para o rito do espanto e do começo
Onde sou a mim mesma devolvida
Em sal espuma e concha regressada
À praia inicial da minha vida.
De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.
Casa branca em frente ao mar enorme,
Com o teu jardim de areia e flores marinhas
E o teu silêncio intacto em quem dorme
O milagre das coisas que eram minhas.
Não há fantasmas nem almas,
E o mar imenso, solitário e antigo,
Parece bater palmas.
Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.
Reino de medusas e água lisa
Reino de silêncio luz e pedra
Habitação das formas espantosas
Coluna de sal e círculo de luz
Medida da Balança misteriosa
Vem do mar azul o marinheiro
Vem tranquilo ritmado inteiro
Perfeito como um deus,
Alheio às ruas.
O sol rente ao mar te acordará no intenso azul
Subirás devagar como os ressuscitados
Terás recuperado o teu selo, a tua sabedoria inicial
Emergirás confirmada e reunida
Espantada e jovem com as estátuas arcaicas
Com os gestos enrolados ainda nas dobras do teu manto"
Sophia de Mello Breyner Andresen
O Homem do Novo Tempo nasce de Iemanjá, Mãe cujos filhos são peixes, a Rainha do Mar. Também conhecida por Princesa de Aiocá, do "reino das terras misteriosas da felicidade e da liberdade, imagem das terras natais da África, saudades dos dias livres na floresta", além de Nossa Senhora dos Navegantes.
ResponderEliminar(Os peixes representam os filhos que nascem sem se separarem da Mãe, continuando a ser a própria Mãe, o Mar.
ResponderEliminar|*ICHTHUS, do grego, peixe, as cinco letras formam o acrónimo grego com a frase: Iesus Christus Theou Yicus Soter, que quer dizer, Jesus Cristo filho de Deus Salvador.|)
"Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas,
ResponderEliminarÓ vida suja, hostil, inutilmente gasta,
Saber que existe o mar e as praias nuas,
Montanhas sem nome e planícies mais vastas
Que o mais vasto desejo,
E eu estou em ti fechada e apenas vejo
Os muros e as paredes, e não vejo
Nem o crescer do mar, nem o mudar das luas.
Saber que tomas em ti a minha vida
E que arrastas pela sombra das paredes
A minha alma que fora prometida
Às ondas brancas e às florestas verdes."
Sophia, 1944
Hoje vou ver o mar... a Bahia... de S. Martinho do Porto. ;)... que tem também Dunas... :)
ResponderEliminarRetrato de uma princesa desconhecida... -da Rainha do Mar-
ResponderEliminar"Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que a sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Foram necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos
Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino"
Sophia de Mello Breyner Andresen
Hoje trazes-nos a Sophia!
ResponderEliminarBelíssimos os Poemas. Neles vivo a minha vida.
E é interessante que estou de férias numa imensa, onde o pinhal de Leiria vai beijar o mar e onde posso vaguear pelas dunas completamente livre.
E é o mesmo mar que banha S. Martinho, embora aqui na Vieira ele esteja sempre muito agitado. Mas gosto dele assim.
:)
Escrevendo agora onde era para o ser...
ResponderEliminarEu sinto-me assim... como um mar revolto... mas talvez como a Terra o faz... não é por gostar de mostrar que anda "tudo" errado... porque não anda... isso é o mais incrível... tudo é suposto ser assim mesmo, só que tendo em conta o que somos... podemos ser muito mais. nós. ;) e por aqui que o meu rio me conduz. não para mudar o que seja, apenas des-cobrir o que ainda nos falta permitir ser.***
Como eterna aprendiz.
(e é estranha esta coisa de só falar de mim... mas foi assim que a vida me fez... a ser-me) :P
ResponderEliminarPois é. A nossa vida, se calhar, é um monólogo. Há uma espécie de harmonia pré-estabelecida, por isso, ao falarmos de nós, estamos a falar de outros. A dizer algo a outros.
ResponderEliminarE quem não tem violão, toca com o instrumento que tiver mais à mão.
:)
(é isto e é o de felicitar as obras dos outros com palavras, conscientemente... cada vez menos tendo para aí... cada vez mais só consigo amar os outros amando em silêncio ou cantando também a minha alma...)
ResponderEliminar:) é... é que do que falamos o que chega aos outros nunca é o que falamos... é o que dentro deles lhes fala. ;)
E se somos uma pessoa que fala porque não falar na primeira pessoa? Poderemos inventar falar como sendo outra coisa mas não o esquecendo. :P
Monólogo...
ResponderEliminarA vida como sonho real que é... que lógica há em vivê-la através do sonho dos outros... que não seja amando ou em brincadeira...
há algo que nos separa dos outros porque no fundo me parece que não somos senão todos os outros. A separação que há vem da nosso própria união como ser único. :PPP
Bom, e o mar chama-me para o seu salgado silêncio. Bom dia praieiro.
ResponderEliminarMar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim,
ResponderEliminarA tua beleza aumenta quando estmos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho,
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.
Mar Sonoro, Também da Sophia
Um dia iria trazê-lo. Foi hoje
Para Ti*
Adoro as palavras da Sophia*
Também gosto muito deste poema, da Sophia de uma maneira bastante intensa. Venho aqui também para te dizer que ando a fazer um texto para outro local sobre a Sophia e, como me chamaste a "Menina do Mar", depois mando-to. Este é o meu coração fundo. Dizer-te isto aqui é agradecer o desmesurado que deixaste lá em baixo. E eu sou do fundo, às vezes volto lá, depois volto a subir e com lágrimas nos olhos olho os que ficaram à minha espera. Recebe um sorriso da Isabel
ResponderEliminarAgradecida Sereia!
ResponderEliminarUm abraço sentido do tamanho do nosso mar Isabel. :)