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Na cela onde medito,
Erodindo-se a vida,
Recordo, e deixo escrito
O enigma da partida.
A própria situação
Em que me encontro agora
É de luz e prisão,
É de mágoa e de glória.
O respirar é brando
E revulsivo o olhar —
Ainda vislumbrando
Perigos sem lugar.
A terra que murmura
Abraçando os sinais
De uma noite escura,
Esfuma-se no cais...
Tudo se depura.
Sobe a voz ao vento
E trémula, insegura –
Na canção do tempo
O silêncio escoa –
A boca se esvazia
E — leve — a coroa
De espinhos caída.
O som de uma pluma,
Nem tanto, falava,
Arcaico, e nenhuma
Palavra se escutava.
Contemplo-me, calmo,
A respirar calado.
Ouço-me, sossegado:
Já não posso dar-me...
E, porém, a luz
Que diviso agora
Nem sequer reduz
A beleza da hora.
Vejo a longa sala
Com as almas dentro:
Ora ocas de gala,
Ora em pensamento...
E porém o peso
Que me fecha os olhos
Não o sinto ou penso:
Pára-nos, e foge-nos.
Cinzas do apagado
Fogo se atearam
E é só luz a chama
Do espírito no ar:
Já não anda cego
O navio, fica
Vazio; surpreso,
O enigma não
Se explica.
O lábio está preso
À porta fechada;
A cela onde rezo
Esfria, abandonada.
Mas quem é que fala
Commigo e, ao sê-lo,
Porque não me cala?
Porque vou sabê-lo?
...
Depois era o céu
Límpido do sul
Delido no seu
Infinito azul.
Um abraço, Francisco, de infinito azul de céu e mar... De memórias que alimento nas salas vazias por onde o meu pensamento andou perdido.
ResponderEliminarA cela onde leio traz este belo som de antes. Soantes. E é infinito o seu sopro.
ResponderEliminar...Depois era o som límpido de Antes delido no seu
Infinito Silêncio...
Depois de o ler, na cela onde leio, entra a Beleza.
Olho-a para que ela apague tudo e deixe de novo ouvir o que foi soprado.
Obrigada
Belo poema ! Grato e um abraço, Francisco.
ResponderEliminarResistes a Angola ou ela inspira-te ?
Obrigado pelos vossos comentários.
ResponderEliminarPaulo: estou em casa. Espero que nos visites aqui um dia destes. Com a Nova Águia nas mãos.