sexta-feira, 2 de maio de 2008

O cuco


Seja na Cidade ou no Campo, há vários sítios onde sempre volto, para estar. Sob a mesma árvore, sentada na mesma pedra, a olhar o mesmo vale, a escutar, a observar. Têm as histórias que o Vazio proporciona e a memória não é de lembrança nem se descreve. São sítios de saudade, miradouros do tempo que a frequência e os anos tornam intemporais.
O que me surpreende infinitamente como uma terna explosão é a consciência de estar a existir no momento em que me dissolvo ante a beleza do mutável. As estações são o meu fascínio, parece que tudo se repete uma e outra vez e nunca encontro as mesmas cores, as mesmas flores, os mesmos frutos; os sons, os pássaros, os cheiros, a familiaridade do novo, ciclicamente novo.

Mal desci a ladeira, eis o cuco. Não o vejo, só o escuto. Ah… e tudo se transforma em cucar, os véus de nuvens, o sol que se abre, a vinha do pai, o rosmaninho, as giestas, tudo o que é passível de diferenciação e encanto próprio fica submerso no cucar do cuco. E a Manhã é pura sonoridade.

4 comentários:

  1. «Mal desci a ladeira»
    Eis a Terra!
    As serpentes e os astros
    A maré do tempo a lavar a paisagem
    A Senhora do Dia a beijar a luz
    O olho sublime e variado das estações
    A cobrir a face antiga do Tempo...
    E tudo muda em nós e na paisagem!
    Eis-nos de novo transmudados em cor
    em miríades de estrelas novas
    anjos novos que moram na cor
    no cheiro e no sabor das almas
    Vindos da mesma força que levanta as marés
    Que desenha o compasso de uma dança
    renovada e forte.
    Eia, tudo o que é novo!
    Eia! as novas serpentes
    saídas da mesma e renovada pele!
    Eia, cantos de pássaros e de Natureza em festa!
    Que viva a força que nos traz voluntariamente cativos
    Naturalmente abertos às paisagens
    com pele e corpo e plumas
    E desejos de mar e longe, aqui
    Neste perfil de pedra animada
    Coberto de água e sementes
    Do sem tempo que torna
    Diversa e vária
    a face nua do vento.
    A chama eterna do que se move
    E está parado, para lá das paisagens transformadas
    Para além do momento.

    ResponderEliminar
  2. Que a Vida seja Manhã e pura sonoridade !

    ResponderEliminar
  3. E tudo se transforma em cucar...não te vejo...só te escuto...
    E até concebo no mais fundo e já no olhar que vê com nitidez as tuas paisagens. Deito-me no chão da terra, da Primavera da Terra e vem depois a voz dos Olhos de Águia e acredito que desta vez durma, descanse. Descanse da outra Terra que não conhece nem Primavera, nem cucos, nem pessoas que escrevem em estado sentinte. Obrigada aos dois, Luíza e Olhos de Águia.

    ResponderEliminar
  4. Meus Queridos Irmãos, transbordo a perder-me. A perdição é uma felicidade. Um sopro que me aviva e me limpa da vida.

    ResponderEliminar