sábado, 22 de março de 2008

Three Kinds of Souls, Three Prayers:

1) I am a bow in your hands, Lord. Draw me lest I rot.

2) Do not overdraw me, Lord. I shall break.

3) Overdraw me, Lord, and who cares if I break!

Nikos Kazantzakis, Report to Greco

12 comentários:

  1. Milenares, as noites,
    Baixam sobre os dias
    Os seus ombros nus
    Cobertos pelo brilho, finíssimo, da lua
    O arco das suas costas reflecte
    O olhar branco da luz,
    Arco-íris do sonho...
    As suas asas, gastas de poeira estelar,
    São o que de mais belo o universo viu.

    Por isso, ó noite única, sempre antiga e nova,
    Única e plural,
    No universo plural e único!
    Ó noite, colo de todas as preces,
    Vem sentar-te junto da minha fogueira!
    Vem aquecer as tuas asas húmidas de milhares de invernos;
    Frias de gelos milenares,
    Gastas de atravessar montanhas e ventos.
    Vem, ó noite! junta-te ao fogo da minha imaginação…

    Milenares, os teus gestos pausados,
    As tuas lágrimas purificadas,
    A tua longa cabeleira negra
    Debruada de miríades de luzes;
    Sublime o teu perdão,
    Serena a tua face límpida.;
    Por isso te entrego o lume das palavras
    Para que o poema te finja
    E te coroe, mãe
    Da minha inquietação atenta.

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  2. O dia, esfera de luz e sombra,
    Afunda no mar as horas
    Que foram reais para os olhos.

    Os raios que pintam o céu
    Espalham de luz dormente
    A anunciada nostalgia da hora.

    A noite, esfera de silêncio,
    Derrama-se no vaso inverso…
    Clepsidra de alma e chuva branca.

    A música cai na água
    Uma pedra pequena e redonda,
    Atirada ao lago, acorda a rã

    Assusta os pássaros,
    Espalha asas
    Nas quatro direcções do vento.

    Pela luz branca da manhã
    Alguém vai viajar…

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  3. Que saudades do mar!
    Desse gigante abismado e negro
    Que engoliu o tempo,
    Lambendo-o,
    Como Cronos lambeu os filhos,
    Antes de os devorar.

    Nascemos, morremos e voltamos
    A encontrar-nos.
    Devora-nos o próprio Tempo,
    Perdido no Mar:
    Nascimento e Morte
    Do eterno Mito.

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  4. Que saudades do mar!
    Desse gigante abismado e negro
    Que engoliu o tempo,
    Lambendo-o,
    Como Cronos lambeu os filhos,
    Antes de os devorar.

    Nascemos, morremos e voltamos
    A encontrar-nos.
    Devora-nos o próprio Tempo,
    Perdido no Mar:
    Nascimento e Morte
    Do eterno Mito.

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  5. Equinócios terrestres


    Abriram-se janelas
    E deus, que é sol também, entrou nelas.
    A luz, meio tonta, desse Inverno
    Disparou sobre os muros,
    E os ribeiros riram de suas margens;
    Verdes campos, viram a janela de deus aberta
    Como um grito na relva,
    Um germinar de seiva
    Na alma seca e estéril
    Da árvore fria e nua do vento.

    Que alegria a explodir
    Pelos olhos adentro!
    Esse calor da terra que desprende
    O aroma dos frutos, pelos gomos
    Dessa laranja redonda,
    Dessa sede de rebolar na terra,
    O ventre inchado;
    A alma cheia de uma lua maior
    Do que a celeste;
    Um grito quente da terra!
    Uma vida acabada de nascer!

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  6. São vozes que se elevam numa cadência rara
    Um pedido, um lamento, uma fé,
    Uma súplica modelada na voz…

    Uma pomba branca levanta as suas asas
    E roça levemente o capuz do monge,
    Não a seguem os olhos,

    Mas o canto vai com ela na subida,
    Move-se alto e veloz, no azul intenso da manhã.

    E as vozes, seguras, seguem os passos,
    Afastam-se na distância da terra
    Mas é no céu que roçam suas súplicas,
    Suas vestes castas…

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  7. No canto sombrio da casa da alma
    Mora uma presença mansa,
    Como a de uma flor a crescer de suas raízes.
    Todos os dias em que a noite sempre chega
    Oiço essa flor a beber da memória
    A sua seiva doce.

    Acaso essa flor não dorme ainda?
    Acaso o alimento desse lugar
    É o seu sustento, e essa presença atenta,
    A sua forma de ser, não é uma vez mais
    A essência mesma
    Do perfume eterno das rosas?

    Sabemos que só o sol filtrado
    Entra nesse lugar,
    Nunca o sol directo, nunca a vida.
    Porém as folhas estão verdes e os ramos altos
    E o perfume é diferentemente o mesmo
    A cada hora.

    Afinal para que inventámos a memória
    Se não foi para engolirmos o tempo?

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  8. Se digo astro e lábio,
    Se escrevo sal e mel,
    É só para sorver o ar fino do dia,
    A luz- prata da lua
    A crescer sobre o azul;

    O mar nítido e puro,
    A pátria devolvida à memória,
    A rota conhecida…
    Se falo estas palavras
    Sobra-me a noite e o dia

    E o tempo é a voz,
    Via-láctea do mar;
    Mapa, rosa, cruz…
    Emoção a florir,
    No chão do estrume vivo.

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  9. Estas três orações juntas e em progressão, nesta altura Pascal, são um manancial extático.

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  10. Que poemas magnificos, Alma do Obscuro! Obrigada por prestares tão sublime homenagem ao génio de Nikos Kazantzakis.

    Especialmente essa tua menção conjunta à Rosa e à Cruz.

    Luisa, tens toda a razão. Nikos foi dos escritores espiritualmente mais profundos do século XX.

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  11. Ai que alma mais luminosa a que o obscuro revelou...até senti a beleza do que esta escrito vestir-me a pele!

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  12. Fico contente...Algumas das suas luminosas vibrações também produzem em mim um efeito extremamente benéfico e raro. Gosto de lê-las e relê-las...
    Obrigado por esses momentos inspiradores e benfazejos.

    Bom renascimento.

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