terça-feira, 12 de julho de 2011

Garbaje

Qual é o problema de Portugal ser um lixo? Não é no lixo que há brindes e bolo rei? Não é ao lixo que vêm buscar o que pode valer muito e depois vendem caro? Desperdícios de famílias enfortunadas? Não é ao lixo que vêm buscar coisas e reciclam, fazendo assim aproveitações nunca antes vistas? Não é das cinzas que sai a Phoenix renovada de cristal? Se as reciclagens estão na moda, como há reclico sem lixo? Como se constituía o fetiche lustroso e pouco acéptico das reciclagens se merdum não houvesse?

A propósito, será Portugal um lixo separado? Se sim, que tipo de lixo? Metal, plástico, papel ou vidro? Ou será lixeira da montanha dos arrabaldes das cidades para donde os camiões recolhedores descarregam tudo? Não é do lixo que as gaivotas se alimentam? Não é no lixo que há todo um romantismo por explorar? Vagabundos e outras marginais atiram-se ao lixo com a curiosidade de final do dia e mexem, remexem. Navegam lá, inauguram os descobrimentos porque sabem que no lixo there's more than meets the eye.
Mal empregado, puseram isto no lixo, uma placa desfibriladora da Rowenta. Vou já construir um comboio de arame e vime, tenho paciência e perícia.

Não está o lixo na categoria das alternatividades cada vez mais propagandadas, não obstante continuarem a denominar-se alternatividades? São as ditas coisas que é preciso fazer em tempo de crize, é nadar no lixo e ter "criatividade". Tanto tempo a criatividade esteve confinada ao seio "artístico". Criatividade agora: quem não a tem já na boca pronto a cuspir? "Ah, criatividade isto e aquilo, é preciso é criatividade, vamos ao lixo buscar os materiais e construímos uma empresa de jovens empreendedores que somos nós, ou então não nos safamos".
Haja lixo, haja o que houver, tudo é oiro e rosas.

Alternatividades tipo a agricultura biológica, a produção própria, a permacultura, os investidores por conta própria recorrendo ao microcrédito, tudo coisas em ascensão dos tempos modernos que em tempos foram antigos. O lixo fará parte deste tipo de items, é dar-lhe tempo, primeiro estranha-se, depois entra pelo nariz, o cheiro é forte, é tudo avant-garde.
Primeiro ignoram-te, depois riem, depois coiso e depois entram em negociações com o lixo e tiram partido dele e dizem "olha, até que há vantagens, sim senhor, nunca tinha pensado nisso". Assim o lixo há de ser moda grande que tudo há de cheirar a podre e ter Casinos Royales a fazer apostas.

Não está em voga os lixos e as coisas lixadas e seus aproveitamentos/reciclagens e reabilitações e apoio social ao domicílio e associações sem fins lucrativos com voluntariado mais exposto? Pois então peguem no Portugal e façam um brilharete, quinquilharia para oferecer às esposas, elas adoram bijutaria e coisas em segunda mão do Bairro Alto, Feira da Ladra ou artesanadas pelo ofertor.
Não se pode desperdiçar, logo lixo é bom.
Até os tios agora podem dizer que compraram barato em nome da "comunidade", há toda uma legitimidade para isso.
Temos de ser uns pós outros, melher.
Agora é fixe. Fixe lixo.

O Diogo Miguel anda a dizer mal de ti. Sabes o que é que toda a gente pensa que és? Um chibo!
Olha que a reputação é muito importante nestas idades. E a tua mãe é cantoneira, ó cabrão. Vai-te limpar a pele que bem precisas.

- Olha, filho, sabes como resolves isso? Chama-lhe o mesmo que ele te chamou. Fazes-lhe asneiras com as mãos, assim mostras que és igual... aliás, diferente da raça deles, aquela escória alarviana.
- Mas mãe, ele foi fazer queixa ao reitor. Agora vou ser suspenso e já não posso participar nas olimpíadas do clube. E nós íamos ganhar, garanto-te. Agora já sei como vai ser, o Rodrigo não me vai emprestar os carros, mas ao menos a Marta vai gostar mais de mim, os bad boys safam-se com as raparigas.
- O quê?! Não te vão emprestar a borracha? Cresce e aparece, pá, aprende a viver sem louvores e ofensas. É boa altura para aprenderes, acho bem isto ter acontecido que veio mesmo a calhar.
Desculpa, filho, esqueço-me que só tens sete anos.

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