As primeiras coisas eram verdes ou azuis, com água pela cintura;
duras esmeraldas umas, outras animais, vibrantes
quando lhes toca a luz; o mais das vezes encostados
à parede do estábulo, com grandes olhos húmidos
e um precipício ao fundo (e as nuvens são o seu bafo).
E no entanto, visto à distância exacta, tudo se transforma:
o cenário do mundo é só um infinito espaço
cheio de coisa nenhuma, e a luz o puro efeito
de dois deuses menores que marcam o compasso.
É certo que, na chuva, o teu corpo anuncia
com seu distante olhar, um prazer que não cabe
na estreiteza da fábula; um céu, não duvidemos,
acolhe o terno gesto que não foi.
Já na parede a meio branca traço, a contragosto,
o tempo mal passado que apodrece; e ruminante encosto
ao tampo da água o bico ou pincel fosco
onde surgira, de repente, nada.
Os portões oscilam, e a erva adiante, se nos aproximamos.
Claramente vejo como te divides
num infinito número simultâneo de mundos.
As palavras celebram, mudas, a água na paisagem,
verde ou azul, conforme desejaste.
Avanço imóvel, descalço sobre a erva,
e quando fecho os olhos invade-me a luz por dentro
compacta, completa, como as coisas primeiras.
António Franco Alexandre
muito bonito
ResponderEliminargostava de ter escrito
abraço
Estas 'Primeiras Coisas' começam bem logo no primeiro verso!
ResponderEliminarLindo, lindo, lindo!
Beijinho*
E também para o querido Platero*