segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A vocação lusófona

De política externa. Ao que nós todos tendemos, os da Língua Comum — angolanos, brasileiros, cabo-verdianos, guinéus, mauberes, moçambicanos, portugueses, sãotomenses, (será que poderia acrescentar galegos ?) — , é fazer do mundo a cidade de todos e para todos, a polis global, que daí vem política e meta lhe deve ela ser. Política externa que sempre seja a interna virada para fora, aos de dentro tratando com a largueza humana que para os de fora se requer. Com Povo algum deixaremos de ter relações de coração, que tal é o étimo de cordial, embora com seus governos tenhamos as elementares precauções que se têm com vespa ou com bicho, ainda que doméstico, de retráctil unha. Toda a economia será de cooperação, para que assim nossas metafísicas, teológicas ou não, passem dos professores de filosofia ao quotidiano de nossos procedimentos. Caminhará a educação para ser o pleno entendimento de nossas culturas peculiares, vendo a todas as outras como suas irmãs, pois que humanas, ainda que não gémeas. E à metafísica ela própria ? Acima de tudo ecuménica, mas, na verdade, para além de ecuménica, que só quer dizer do que, nosso conhecimento, é habitado: no fim de tudo a desejamos cósmica. Talvez um amplo abraço de Aristóteles e Platão, desde tão longe adversos: que faça as pazes o leão do céu com o da terra; e quem sabe se não teremos para isto de acabar firmando nossos pés naquele para além de tudo ou nada que já anda no Buda e se apura nos mestres zen; ou, se preferimos as linguagens de hoje, nos melhores dos físicos: para além dos que muito a sabem os que, parece, melhor a entendem. Como estamos em todos os continentes, de firme planta como na América, ou irredentos como em Timor, nos caberão tarefas várias: por exemplo, na Europa, e com nossos coabitantes da Ibéria, renovarmos a salvação que levámos aos transpirenaicos quando os trouxemos das ideias puras ao firme chão da mortal existência, ou quando lhes comunicámos o descoberto; do outro lado do Atlântico, agregando a poeira de nações que saíram da intransigência castelhana; na África, pensando de novo no mapa-cor-de-rosa, agora para sempre independente do Terreiro do Paço; no Índico e Pacífico, lançando ponte de poldra a poldra do que ainda é a Língua ou do que jamais deixará de lhe ser lembrança. Talvez Ela, o que mais nos liga, não seja o veículo de pregar Evangelho Português, como o teria pensado Fernão Lopes: mas quem sabe se não será bem adequada para entender e praticar o Outro; alargado, porque Deus pai universal, a todos os teísmos ou ateísmos do mundo - Agostinho da Silva, 82: Semanário do mês de Santiago o qual lhe aparecendo pensado compôs em linguagem Agostinho e assim o enviou a seus Amigos [1982], in Dispersos, 1989 (2ª edição), pp.745-746.

7 comentários:

  1. Será verdadeiramente a isto que tendem os lusófonos ou serão apenas as tendências de Agostinho e de outros como ele, projectadas nos lusófonos, para não se sentirem tão sozinhos?

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  2. São as fundas aspirações da alma, justificadas a partir da história e da cultura, o que me parece uma ilusão de óptica...

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  3. Concordo consigo, cara amiga, e tenho dito isso nalguns textos publicados sobre a questão... Todavia, há também um sentido pedagógico na mitopoética de Portugal e da vocação lusófona... A mente rege-se por mitos e mitos há que a podem encaminhar para despertar de todos os mitos...

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  4. Quando se tem a experiência de se ser o sacrário do Deus-Homem vivo acabam-se todos os mitos.

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  5. Como deve saber, poderia dizer o mesmo em relação à experiência de ser Buda... Se isso não fosse ainda um mito... Que pode libertar ou não, conforme o efeito que a mente dele souber colher.

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  6. Como é que uma ilusão liberta da ilusão?

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