terça-feira, 14 de outubro de 2008

Meditações sobre a Saudade


Estou nesta Casa, mas não sou de cá. Nesta casa onde estou, o que menos está sou eu. Não é que esteja ausente, nem viva de chamar ou evocar outro universo ou outra pátria. Não substituo, restituo. O quê? A quem? Primeiro em mim o acharei, e só depois é que o Princípio vem. Todas essas respostas o espírito as achará, não no sentimento da memória (quilha de navio partida, embarcadouro sôfrego do vazio, vale fundo …), mas em imaginação e chamamento, não do que desapareceu e se afastou, mas do que se aproximou e apareceu. Pelo espírito, a concha e a água, o conteúdo e o continente, o antes e o depois, se clarificam e eternizam, libertos do tempo e do peso do sentimento. E se do mesmo fado se não libertarem, aceitar pode ser a via da Saudade. Pela palavra e pelo corpo o sentir e o ser simpatizam com o mundo criado.

Primeiro havia a vontade de ser. Quando o Ser se separou do estar, criou-se a cisão que abriu as portas aos dois mundos. Passar por essas portas em simultâneo, atravessar espírito e matéria para criar o incriado, só em Saudade o fazemos. Também por isso, a “folha que cai é a alma que sobe” (e as garças do lago são para mim a neve do Natal…). E se Deus se quis oculto em sua origem, mostrou-se em ausência e desejo puro. De quê? Do mesmo mundo, divina sombra.

5 comentários:

  1. Não sou nesta casa. Estou cá, porque em mim o ser está separado do estar. E os pés azuis são o alfabeto da saudade. E a saudade tem um alfabeto de cores que apontam no abismo da alma, o Princípio. Viver, para os que a sentem, à saudade, é ser sinalizado pelos impactos que essa intensidade da cor desperta na intuição última de que andamos em círculo à volta da Origem.
    Quando o mundo se afasta, a alma conhece o desejo puro e veste-se da "divina sombra". Os sonhos agitam-nos de eternidade. E a vida só faz sentido quando, estando à mesma distância do centro, passamos, pela bondade e pelo amor, para um círculo mais perto. Nesses instantes sobrevém a "alegria breve" que o Vergílio Ferreira conhecia tão bem e tu também. Apesar da escrita aparecer vestida de tristeza. Um sorriso feliz por ter lido nestes dias mais tristes os teus textos plenos do que me faz falta: beleza e sentido.

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  2. "A Filosofia é, no fundo, saudade." - Novalis

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  3. Isabel,

    Agora a montanha azul desceu aos pés de Isabel, subiu e, no ar, o alfabeto da Saudade traçou no voo do pássaro um sinal conhecido. Havemos de ir à fonte de Iabel, este outono. As folhas rodopiam em redor do mármore e parecem esperar por nós.As nuvens movem-se e parece clarear para os lados da casa das gaivotas. O azul continua azul e não empalidecem as flores amarelas da jarra branca. Há livros espalhados à espera do traço de Gabriela que, borboleta, por lá poisou nos dedos de Isabel.Cantarei uma ária para a nossa tristeza clarear.Uma "alegria breve", para "um mundo coado de neve" que na brancura canta e eleva. E pediremos num sussurro a Cristina: "Toca, Cristina , toca" a nona de Chopin...
    Um beijo

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  4. Vfs,

    Uma flor azul para ti.

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  5. A aparição! E como é linda essa música...

    Envio um beijo pelas mãos tocadas pela borboleta. Ontem estive no bosque e ouvi, claro que ouvi, a Gabriela.

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